OS MISERÁVEIS: A realidade do subúrbio francês, contada com a essência da obra de Victor Hugo

 

Mesmo que o título do filme nos remeta à obra publicada em 1862 e escrita por Victor Hugo, essa história não tem nada a ver com o clássico da literatura francesa, embora há várias referências presentes no filme. Mas o foco do diretor Ladj Ly não está em reinventar a história de Hugo, contada já diversas vezes em todas as mídias existentes (cinema, teatro e TV), ao invés disso ele pega alguns temas que foram abordados no livro e que ainda continuam sendo bem atuais, misturando com uma realidade existente na França que muitos desconhecem ou ignoram, uma situação de conflito iminente.

Com o ritmo devagar do primeiro ato, o diretor apresenta aos poucos os personagens e todos os elementos que na hora são mostrados de forma aleatória e desnexos entre si, o que faz o público se questionar sobre o que o filme quer de fato relatar, ou seja, se é sobre a situação precária dos moradores de Montfermeil (que também foi o local onde Victor Hugo escreveu “Les Misérables”) ou sobre a briga entre as duas facções que lá vivem. E mesmo com essa apresentação um pouco bagunçada, com várias temáticas interessantes apresentadas, mas pouco desenvolvidas, e outras esquecidas,  quando chega o momento de conectá-las, o diretor finalmente revela a principal abordagem do filme, ao mostrar o modo abusivo e violento do esquadrão anticrime, que sempre age com estrema violência, mesmo que em várias situações isso seja totalmente desnecessário.

Embora é mostrada essa agressão vinda de homens que se intitulam a si próprios como “homens da lei”, o roteiro sabe ser razoável ao mostrar que não são todos os policiais que se comportam dessa maneira, revelando tambem que existem de fato pessoas que realmente querem proteger e defender os civis dentro de sua jurisdição e de seu código de moral, como é o caso de Stéfane (Damien Bonnard). Ele mesmo nunca precisou tomar medida extremas e antiéticas  para manter a ordem do lugar, mas mesmo assim, acaba sendo visto como mais um policial que se importa apenas consigo mesmo, já que a o esquadrão anticrime já tem uma má reputação por causa das ações de Chris (Alexis Manenti), que ganha cada vez mais o desprezo e antipatia dos cidadãos a cada atitude desprezível e sem remorso que demonstra, simplesmente porque ele pode, ou porque quer. E isso somente quando ele faz sua ronda diária, quando sua vida profissional esta em risco devido a uma de suas atitudes imprudente, ele se torna mais agressivo, pensando somente no seu bem estar, esquecendo de seus deveres como policial. Gwada (Djibril Didier Zonga), no início, parece ter a mesma iniciativa de Chris, mas depois nota-se que ele está bem entre o limite do certo e do errado dentro do poder de seu cargo, se arrependendo de seus atos abusivos, mas que quando tem que pagar pelos seus erros, decide culpar a vitima em vez de assumir seus erros.

Quando chega o terceiro ato, depois do roteiro ter aparentemente resolvido toda essa situação de forma privilegiada para a força anti crime, o diretor finaliza a história mostrando o tamanho das consequências de suas atitudes ao abusar do poder, fazendo a cena lembrar bastante à revolução francesa, tanto nas atitudes quanto nos motivos dos cidadãos estarem fartos de tanta exploração e injustiças sobre aqueles que juraram protege-los.

Ainda não sendo uma adaptação direta de “Les Misérables” de Victor Hugo, “Os Miseráveis” tem muito da essência dessa obra, abordando questões de nossa atualidade, em uma realidade pouco conhecida, tudo isso sem precisar contar novamente essa história muito conhecida de forma moderna.

NOTA: 9,5

BRUNO MARTUCI

 


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Colaborador de CINEMA & SÉRIES dos sites ARTECULT.com, The Geeks, Bagulhos Sinistros, entre outros.

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