CONTO DE QUINTA: Meu avô, o escritor

 

MEU AVÔ, O ESCRITOR

Seguramente, este amor que nutro hoje pela Literatura se deve a meu avô Carlos, um advogado criminalista que gostava mesmo de inventar histórias. Tenho várias lembranças dele trabalhando no escritório da casa do Humaitá junto com sua inseparável Olivetti portátil. Quando não estava no escritório, podia ser visto no jardim observando as plantas, as flores e os insetos ou apenas contemplando o céu. Era a hora de se abastecer de inspiração, justificava ele, antes de se acomodar embaixo da mangueira ou de se sentar ao lado do viveiro para ler o jornal. Na sala de estar ouvindo música clássica, nos quartos meditando e olhando a paisagem ou mesmo na cozinha impregnando-se de cheiros e sabores, vivia espalhando metáforas, metonímias, sinestesias e hipérboles pelo ambiente. E sempre que estava para concluir um texto, dirigia-se ao terraço com as folhas datilografadas na mão. Então, tal qual bandeira desfraldada, estas eram sacudidas ao sabor do vento por alguns instantes. Se alguém presenciava a cena e se surpreendia com esse inusitado comportamento, ele logo explicava num tom meio professoral:

— Trata-se de uma manobra crucial, meus caros, é só neste momento que os clichês se desprendem do texto…

 

 

CÉSAR MANZOLILLO

 

 

 

 

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Author

Carioca, licenciado em Letras (Português – Literaturas) pela UFRJ, mestre e doutor em Língua Portuguesa pela mesma instituição, com pós-doutorado em Língua Portuguesa pela USP. Participante de vinte e quatro antologias literárias. Autor do livro de contos A angústia e outros presságios funestos (Prêmio Wander Piroli, UBE-RJ). Professor de oficinas de Escrita Criativa. Revisor de textos.

One comment

  • Que comportamento curioso do seu avô. Coisa de artista mesmo. A arte se expressa muitas vezes por vias inusitadas. Parabéns pelo texto e parabéns ao seu avô, que o inspirou a escrever.

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