Às quartas – Luzes de Natal

Foto: Alisa Anton em Unsplash

 

Assim como as decorações de rua para a Copa do Mundo, parecem ter diminuído as varandas iluminadas para o Natal de 2022 pela cidade. Mas pode ser uma impressão.  Quando atravesso a cidade, tenho a sensação de que, antes, os caminhos eram mais iluminados nesta época do ano. Será que a memória me trai?

Sorrio internamente, lembrando-me de uma história que dividi, há uns anos, numa rede social. Por vários motivos, a ornamentação da árvore de Natal fora adiada diversas vezes naquele ano. Acabamos por fazê-la no próprio dia 24 de dezembro. Enquanto estávamos separando os enfeites e os pisca-piscas, achei, no meio de tudo, as luzes da varanda. Comecei um diálogo com meu filho.

– Ih, as luzes da varanda! Vamos colocá-las também?

– Hum, vamos deixar pro próximo ano? Já é hoje o Natal, mãe.

– É, estou com preguiça. Aliás, filho, você percebeu que não há luzes nas varandas? Não vi nenhuma. As pessoas não puseram luzes nas varandas dos prédios!

– Claro que puseram, mãe. Você que não viu.

– Nem parece Natal. Que Natal chocho! Não tem clima mesmo. A cidade desse jeito, o estado, o país…

Os servidores do Estado estavam sem salário há meses. Precisavam pegar doações de cesta básica naquele ano. Eu emendei:

– Se um servidor está nessa situação, imagina quem ganha salário mínimo, o desempregado.

–  Olha o prédio ali. Puseram luz.

– Ou será que foi por causa da conta de luz? Lembra que a conta subiu demais?

– Mãe, tem luz nas varandas! Você está pensando essas coisas e não percebeu. Pode ter menos luz, mas tem.

– Não vi nenhuma.

Foto: Rithika Gopalakrishnan em Unsplash

Deixamos a história pra lá e finalizamos a decoração de Natal. Segui nos preparativos, adiantando-me para o almoço do dia 25 de dezembro.

À noite, fui levar meu filho para a ceia de Natal com sua família paterna. No carro, passaram-se poucos minutos até que ele começasse:

– 1…2…3,4…

– Que é isso, filho?

– 5…6…7 ali na frente.

Sorri com o coração. Entendi que ele contava as luzes espalhadas por onde passávamos. Casas, prédios, árvores na rua. Acesas, como em outros Natais.

– Você está contando as luzinhas, seu implicante?

– E você disse que não tinha visto, hein?!

Perto da hora de saltar, ele me disse:

– Mãe, já contei 52 luzinhas até aqui. Posso parar?

Rimos juntos. Aquela brincadeirinha me divertiu e me ensinou. Meu filho me apontara o que eu não tinha sido capaz de ver. Se há mais ou menos varandas iluminadas, não importa.  Desde então, busco manter-me mais atenta, para não perder a capacidade de enxergar as luzes existentes no caminho.  Caso isso aconteça, desejo que, sempre, a meu lado haja alguém para apontar-me onde elas estão.

Desejo o mesmo a vocês também.  Feliz Natal, amigos!

ANA LÚCIA GOSLING

Ana Lucia Gosling (@analugosling)

 

 

 

 

 

 

 

 

Author

Ana Lúcia Gosling se formou em Letras (Português-Literatura) em 1993, pela PUC/RJ. Fixou-se em outra carreira. A identidade literária, contudo, está cravada no coração e o olhar interpretativo, esgarçado pra sempre. Ama oficinas e experimenta aquelas em que o debate lhe acresça não só à escrita mas à alma. Some-se a isso sua necessidade de falar, sangrar e escorrer pelos textos que lê e escreve e isso nos traz aqui. Escreve ficção em seu blog pessoal (anagosling.com) desde março de 2010 e partilha impressões pessoais num blog na Obvious Magazine (http://obviousmag.org/puro_achismo) desde junho de 2015. Seu texto “Não estamos preparados para sermos pais dos nossos pais” já foi lido por mais de 415 mil pessoas e continua a ser compartilhado nas redes sociais. Aqui o foco é falar de Literatura mas sabe-se que os processos de escrita, as poesias e os contos não são coisa de livro mas na vida em si. Vamos falando de “tudo” que aguçar o olhar, então? Toda quarta-feira, aqui no ArteCult, há texto novo da autora. Redes Sociais: Instagram: @analugosling Facebook: https://www.facebook.com/analugosling/ Twitter: https://twitter.com/gosling_ana

One comment

  • Que seu caminho continue iluminado e irradiando luz por onde passa. Feliz Natal minha amiga querida.

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