Analógico Lógico: Filme vs Digital

Imaginem uma câmera em que se possa trocar seu sensor para cada situação diferente, e que este ofereça uma imensa variedade de tons e texturas, que não se precise editar nada ou muito pouco e que, quando aquele sensor se tornar obsoleto, basta trocá-lo por outro, sem a necessidade de se comprar outra câmera caríssima? Imaginaram? Parece bacana para vocês? Pois é, amiguinhas(os), o nome disso é filme.

O filme desde o advento do digital é encarado como obsoleto, coisa antiga e ultrapassada. Puro marketing para se criar uma necessidade da qual não se precisa. Enfim. Quando a coisa estourou pra valer lá fora, no começo dos anos 2000 e aqui lá pra 2007, o filme passou a ser considerado “tecnologia vencida”, mas isso nunca foi tão errado. Quer um exemplo? A sua primeira máquina digital teve quantos megapixels? Sei lá… 2Mpx? 3Mpx? 5Mpx com certeza não era! Os 12Mpx só chegaram lá para 2008, em câmeras profissionais e o primeiro celular a quebrar essa barreira, foi o Samsung Pixon 12, que eu tive, sendo um dos primeiros a possuí-lo e, para isso, tive que vender um rim de meu sobrinho. Coisa que doeu mais nele que em mim. É a vida…

Então, amiguinhas(os), no começo vocês batiam com algo em torno de estonteantes 2Mpx, em média. Acham pouco? A título de curiosidade, uma foto decente para ser postada no Instagram fica muito bem nessa resolução, sabia? Sabendo-se disso, alguém se habilitaria, hoje, a comprar uma máquina desses mesmos 2Mpx? Heim?

Fato curioso em relação ao digital é que, a chamada “corrida dos pixels”, curiosamente, vai no sentido oposto do tamanho de visualização das imagens, já perceberam? Se na era dourada do filme daria para fazer uma impressão que cobrisse a fachada de um prédio, nos dias atuais, em que se conseguiria, em tese, superar isso, as pessoas postam fotos de alguns milímetros, uma unha de polegar, como dizem os “green goes”. Vá entender…

Então, dessa forma, qual foi a tecnologia que se tornou obsoleta primeiro? Porque o filme não foi. Quem batia com ele não perdeu as fotos de família que eram guardadas em álbuns e negativos, não teve que passar as imagens do flop disc pro flop disc menor e desse para o disquete rígido e depois para o laser disc e posteriormente migrar pros pen drives, HDs externos e demais memórias flash e a cada transferência de dados, a cada “evolução” da tecnologia, suas fotos iam se perdendo no caminho até vocês se darem conta que a infância dos filhos, os seus pets queridos, sua juventude, namoro e casamento ou o primeiro emprego, ficaram perdidos em algum ponto no passado, dentro de algum HD que vocês tinham se prometido atualizar no Natal de 2007, mas que, assim como aquela dieta “ixperta” e entrar para a academia, vocês jamais o fizeram. Enquanto isso, quem bateu em filme tem tudo guardadinho. Impávido e retumbante. Bateu uma invejinha?

Outra coisa que mencionei acima foi a “barreira” dos 12Mpx. Essa, para quem desconhece, seria a resolução (tamanho) padrão de um fotograma de 35mm. Digo padrão porque isso também varia, como a densidade em que se digitaliza o filme, o próprio formato do filme (se 110, 135, 120…), o tipo de filme (normal, microfilme, etc) e por aí vai. Com escaneamento de baixa resolução você vai ter uma qualidade e valores pífios, evidentemente. Porém, um escaneamento “profissa” de um negativo ou positivo (tem essa sabia?) pode gerar fotos de altíssima resolução (tamanho, de novo). Para você ter uma ideia, tenho fotos no filme de mais de 100Mpx, para aqueles que dão valor à resolução (olha o “tamanhaí”, gente!).

“Tá bom, Vitor, já entendi que o diabo da resolução significa tamanho, mas isso não tem a ver com a qualidade?” “De formíssima algumíssima!” Esse é um grande e corriqueiro erro. Cito o seguinte exemplo, pegue seu celular de 33 câmeras traseiras e 50Mpx e compare a qualidade de imagem com uma câmera digital profissional com metade dessa reso… desse tamanho e me diga se a qualidade de imagem (DEFINIÇÃO! Aaaah…!) é melhor? “Tão” começando a entender o conceito? Acredite, tamanho não é documento. Não troque seu amorzinho pelo John Holmes. A resolução pode ser maior, mas a definição (qualidade), não. Rái definichiom, beibi!

Deixando de besteirice, outra coisa que sempre levantam a bola é em relação à “edição”. Pus entre aspas porque há um tempo eu discordava do que dizer-vos-eis agora: TODA foto é editada. Pô, mas como? Simples. A partir do momento em que se põe um filme com tais e tais características, se escolhe um filtro, seja ele físico ou não ou mesmo que se bata direto e a câmera (digital) corrija a luz, etc. Amigas(os), a captação da realidade foi, sim, modificada, seja para o seus gostos pessoais, seja devido a uma necessidade técnica, ou seja, por que não, editada.

Dessa forma é comum se ouvir o seguinte: com o digital se vê o resultado na hora. Isso é uma meia verdade. A pessoa pode ter, sim, uma pré-visualização do que foi batido, mas não da foto. Paradoxal? Nem é. As câmeras digitais geram, sim, uma visualização básica “do que foi batido”. Mas essa “foto” pode ter sido batida em .raw ou .dng ou .tif que, são arquivos de dados e não puramente de imagens, como o antiquado .jpg. Dessa forma, a câmera gera uma pré-visualização da imagem, mas que pode ter como resultado final, outra. Como, por exemplo, quando se tira uma foto PB e a câmera conserva as informações de cor nesses arquivos de dados (e não de imagem), se podendo, posteriormente, criar uma imagem colorida ou quando se usa um filtro digital, se modificar o resultado final da fotografia.

Dessa forma, não estou considerando os celulares, pois a gigantesca maioria deles cria arquivos .jpg (de imagens e não de dados). Estou falando câmeras, bem entendido. Daí irá se baixar este arquivo para o computador e começar a “editar” as fotos, coisa que leva determinado tempo dependendo dos resultados que se almeje ou da quantidade de fotos e, até mesmo, da habilidade do fotógrafo.

O filme, em contrapartida, é uma mídia pronta. Cada um tem suas características de cor, granulação, densidade, etc. Então, para quem achou que um filme era aquilo que papai comprava na banca do Juquinha ou na DePlá, colocava na máquina e batia, sinto dizer mas, vocês estão parcialmente errados. Há bem mais que esse simples ritual. Mas, voltando, o que quero dizer é, que ele é pronto. Presto! Você tira da máquina, põe ele pra revelar e em 15 minutos ele está pronto. Quando é que uma edição digital decente fica pronta em 15 minutos? E eu estou falando de UMA foto e não de trinta e seis.

Certa vez sai para fotografar com um amigo. Eu com minha Praktica MTL5 B, ele com uma Nikon D90 (excelente câmera). Não tarda e começamos a conversar sobre as diferenças entre analógico e digital e ele me fez a seguinte pergunta: entre a minha e a sua máquina, qual tem a tecnologia mais moderna? No que respondi: a minha, ora! E exemplificando, disse-lhe: a sua máquina é de 2008, de lá pra cá, os sensores digitais evoluíram muito e hoje é fácil encontrar câmeras com mais que o triplo da sua resolução (hehehe). A minha usa filme e o filme está em constante evolução há mais de 100 anos. Nunca na história se fabricou tantos filmes e em tanta variedade quanto hoje em dia, por mais incrível que isso possa parecer aos leigos. Na minha câmera, naquele dia, eu levava o (re)lançamento da Kodak, o Tmax 3200P, um filme excelente e de última geração, atualização do Tmax 3200 que havia sido extinto em 2012. Logo, curiosamente, quem tinha a tecnologia de imagem mais atual, na época, era eu, com o filme.

Então queridas(os) terráqueas(os), o que quis dizer com este textículo é que, o filme é, sim, uma tecnologia em constante aperfeiçoamento e evolução, assim como o digital também o é, embora mais recente. Com o filme, você se atualiza trocando o filme, no digital você se atualiza trocando a câmera. Logo, o digital não é, nunca foi e jamais será a “evolução do filme”, pois a evolução do filme, amiguinhas(os), é o próprio filme. Bem como o filme jamais terá a versatilidade do digital ou sua facilidade de uso. Trabalhando de maneira inversa, o filme é excelente nas altas luzes, super difícil de estourar, porém, nas baixas luzes, ainda que existam filmes excelentes, que conseguem resolver essa questão numa “nice”, os filmes prosumer sofrem um pouco nesse aspecto. Já a mídia digital é justamente o inverso, estourando fácil nas altas luzes e preservando detalhes nas sombras com maior facilidade. Dessa forma, o uso de restringe a habilidade e/ou gosto.

Logo, do mesmo jeito que a aquarela não é a evolução da tinta à óleo, que o veganismo não é a evolução do churrasco e que a impressão 3D não é a evolução da escultura em mármore, o digital também não é a evolução do filme. Assim como esse representa uma forma de expressão artística e preferência pessoal, tendo seu nicho próprio. assim como o filme. O filme está morto? Longa vida ao filme!

Uma boa semana a todos e não deixem de conhecer meu canal Analógico Lógico no YouTube. Toda semana um vídeo novo para os poucos que não curtem um recorta e cola. Pensar faz bem.

 

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Author

Vitor Oliveira é dono de uma visão poética sobre a vida e o mundo que o permeia. Fotógrafo experiente e autodidata, fotografa desde os 10 anos de idade influenciado por seu avô, o pintor paisagista Altamiro Oliveira, de quem, além da pintura clássica, o influenciou no desenho e na literatura, arte que exerce escrevendo romances ambientados no submundo de uma São Sebastião do Rio de Janeiro do final do Séc XIX e começo do Séc XX que não mais existe. Pesquisador de métodos, técnicas e equipamentos fotográficos e colecionador, Vitor Oliveira fotografa principalmente em película, por considerar que, após quase 200 anos de evolução desta forma de arte, esta ainda oferece os melhores resultados, ao depurar a técnica artística, quase que alquimicamente. Sendo um dos únicos fotógrafos de nível mundial a participar, usando filme, no maior concurso fotográfico do mundo, o Sony World Photography Awards, da World Photography Organization, Vitor Oliveira inaugura seu Canal Analógico Lógico!, no YouTube, através do qual procura compartilhar um pouco de uma aprendizagem que nunca finda. Hare Hare! Canal Analógico Lógico! : https://youtube.com/channel/UCom1NVVBUDI2AMxfk3q8CpA Video de abertura: https://youtu.be/N_cuYPi6b4M

2 comments

  • Mal posso esperar para chegar às sextas feiras para ler seus artigos sobre fotografia. São maravilhosos! Parabéns ao ArteCult por ter um colunista tão bom! Que venham às sextas-feiras !!!

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