– Você vai assim?
– Onde?
– Você não disse que iria me apresentar a uns amigos?
– Ah, sim, mas é aqui mesmo.
– Aqui? Clara, você não avisou, não tenho nada pra servir.
– Calma. A gente pede uma pizza pelo app. Os amigos estão aqui, ó.
– No app?
– Num app de relacionamento. Não de pizza.
– Ah, Clara, você sabe que não gosto disso.
– Disso o quê? Homem interessante? Homem gato?
– Homem fake. Perfis inventados. Escolher pelo cardápio, só a pizza mesmo.
– Às vezes, você parece minha avó. Não, minha bisavó. È assim que todo mundo namora agora.
– Eu não gosto.
– Super normal.
– Não gosto.
– Senta. Olha este cara aqui. Botafoguense, gosta de fotografar paisagens.
– Botafoguense? O que isso tem a ver?
– Flamenguista vai te levar pra Maracanã lotado. Você tem horror de ajuntamento.
– Seu critério é esse?
– Não, claro que não. Mas o que a pessoa põe no perfil aponta coisas importantes. Se ele se deu ao trabalho de dizer que é botafoguense, está sinalizando que gosta de futebol. E já que você terá que assistir ao jogo com ele…
– De onde você conhece esse cara?
– Ele curtiu meu perfil. Demos “match”. Mas a conversa não rendeu. Uma pena, parece boa pessoa.
– Ah, entendi. Você está me repassando pretendentes.
– Estou te ensinando a selecionar, a ler as entrelinhas. Quando você criar seu perfil, já saberá.
– Eu não vou criar perfil nesse troço aí.
– Vai sim, “vó”.
– Acho deprimente.
– Se você não criar, eu crio pra você. E aí vou escrever o que eu quiser. Vou colocar aquela sua foto de biquíni… Melhor você participar disso.
– Eu quero uma pessoa real.
– Mas é pra ser real. Umas duas semanas de conversa, sentiu que não é gente doida, marca num local público e aí conhece o cara.
– Local público… Nem parece paquera. Parece um encontro policial.
– Não deixa de ser. Toda paquera é investigativa.
– Cheia de riscos?
– Não seja dramática!
– Muita gente… eu devia me preocupar se uso ou não decote mas, não, preciso me preocupar com a segurança.
– Eu me preocupo ao sair de casa, você não? Celular só na bolsa, ruas só iluminadas. Já é instinto.
– Para o romance, deveríamos estar desarmadas.
– Me diz uma coisa: você conhece um cara numa balada, num bar, na praia? Como você sabe que não corre perigo? Por que é diferente de conhecer pelo aplicativo?
– Ao vivo, a gente sente a vibração, olha no olho. Já sabe se há química. O cheiro…cheiro é uma coisa que me pega, sabe?
– Isso tudo é no primeiro encontro.
– Eu não gosto disso. É como se pusesse uma placa: “Hei, estou disponível aqui”.
– Ai, está bem, Bianca. Então não faz, não sai, não namora. Com esse mau humor todo, vai ser difícil dar “match”.
– Eu só queria que você me apresentasse um dos seus amigos.
– Não funciona assim.
– Você não tem nenhum amigo solteiro?
– Tenho.
– Então!
– Mas aí você começa em desvantagem. Ele já sabendo que você quer conhecê-lo, que está procurando companhia.
– Oi?
– Sabe como é… é bom esconder o interesse. Senão a pessoa faz jogo duro, charme, banca o superior.
– Quer dizer, você acha melhor eu abrir uma conta, escolher melhores fotos, fazer um photoshop no sorriso… No app, vão achar que estou ali por acaso? Passeando? Na vida real, não, vão saber que é interesse.
– Bianca, põe uma coisa na sua cabeça: a vida real é muito mais complicada.