Oi. Como se sente?
Foi após ler o artigo da Ana Gosling (leia-o aqui) que resolvemos escrever sobre o deserto na visão da espiritualidade.
Gratidão, Ana.
Na senda espiritual de todo ser humano, aparecem momentos em que tudo parece um abismo e as respostas se esvaem. Há uma aridez, uma secura espiritual e tudo parece estar perdido. Surgem o desânimo, a vontade de ficar parado, de não mais caminhar. Caminha-se pelo deserto interior.
Lemos sobre uma narrativa de um pesquisador que passou pelo Egito e encontrou um beduíno (árabe nômade do deserto). E ao ser interrogado sobre as razões de viver naquele lugar deserto, sem nada a oferecer, o beduíno responde que, futuramente, daria a resposta.
No dia seguinte, quando o sol começava a esquentar a areia, o pesquisador foi novamente procurar pelo nômade no mesmo lugar. Queria trocar ideias, talvez falar sobre a temperatura, a solidão, o frio da noite, o futuro da família, a aridez da terra e, afinal, descobrir seu segredo. Mas já era tarde demais! O nômade havia levantado acampamento e partido deserto adentro sem deixar explicações.
Saint-Exupéry escreveu em seu best seller ‘O Pequeno Príncipe’:
“O que torna belo o deserto é que ele esconde um poço em algum lugar”
Talvez esteja aí o segredo que o beduíno não quis contar à primeira vista. Com experiência acumulada, ele sabe que as grandes e valorosas descobertas exigem esforço e dedicação.
A experiência do deserto é fecunda e, embora dolorosa, somos confrontados conosco mesmos, com nossas “feras” interiores, quando estamos defronte daquelas situações que nos afastam, dividem-nos.
O deserto é o momento de libertação das amarras que criamos para nós mesmos. É preciso libertar-se do excedente, essas situações interiores que nos prendem; faz-se necessário deixá-las, se queremos caminhar. Portanto, o deserto é lugar do confronto e do amadurecimento.
Fazer a experiência do deserto implica deixar o medo para trás…
O deserto torna-se o lugar da sede, da amargura, da fome, do descontentamento, da falta de estrutura, do desânimo, do desejo de retornar ao que era antes, à segurança.
É o lugar da tomada de consciência: quem quer tornar-se livre passa pela insegurança e a sequidão para desvencilhar-se das amarras de si mesmo.
É um lugar que, apesar da secura, existe uma fonte que jorra água.
Nesse sentido, o deserto representa a busca das esperanças perdidas.
É difícil imaginarmos quais as razões para um ser humano viver e insistir em tão dura travessia deserto afora, mas o que nos parece mais claro é que o seu segredo para perseverar provém da convicção de que o deserto esconde, para seu alívio, refrigério e consolação, um oásis em algum lugar.
Debaixo de sol ardente e sobre a areia quente das dúvidas, inseguranças e ameaças da vida social, caminhemos sem parar, sem deixar-nos vencer.
No deserto não pode parar-se sem concluir a jornada, mesmo quando os pés afundam na areia e o corpo pesa. Viajar é preciso. Encontraremos o oásis, mataremos a sede e venceremos o deserto.
É essa certeza que guia o nômade, apesar de toda rudeza do ambiente!
O exemplo pode ser seguido por você, que hoje enfrenta a aridez espiritual.
Caminhar é preciso! Certamente, existe um poço com águas cristalinas esperando por você em algum lugar neste deserto. De fato, a jornada é difícil e longa, mas quem dela não desiste, quando menos espera, encontra o oásis que procura.
É preciso seguir em frente, confiar em Deus e continuar dando os passos que pode a cada dia. Confiança é fundamental para quem caminha.
Com certeza, você não vai morrer de sede. Logo, descobrirá a beleza que o deserto esconde, será saciado e ficará feliz. Coragem!
Saulo de Tarso realizou um profundo processo de autoeducação no deserto: autoconhecimento, auto avaliação, meditação, disciplinas morais, privações, lutas internas, convívio fraternal, trabalho, mudança de paradigmas. Para o Apóstolo dos Gentios, o deserto foi uma experiência de formação para seu novo caráter que, a partir de então, passa a ter Jesus e o Evangelho como padrão de conduta.
E nossa experiência desértica? Não precisaremos exatamente do deserto físico, material, mas da experiência do encontro conosco mesmos, de ouvir-se na solidão no deserto de nós mesmos.
Encontramo-nos nesse deserto de nós mesmos em variadas e diferentes ocasiões: nos testemunhos das doenças prolongadas, com árduos tratamentos; nas experiências íntimas e dolorosas das decepções, abandono e traições; nas decisões solitárias das escolhas da consciência iluminada na direção do Bem; na vivência da saudade da presença dos entes queridos que nos antecederam na grande viagem; na solidão das tarefas iluminativas e reparadoras; nas aspirações sublimes de plenitude.
Ao estar no deserto intimo, enfim, podemos revoltar-nos ou redimir-nos, entregar-nos aos seus perigos e as suas consequências ou fortalecer-nos no enfrentamento positivo dos desafios da Vida. Uma verdade, porém, é incontestável: temos que entrar no deserto de nós mesmos, com coragem e decisão, para nele encontrarmos as lições que nos conduzirão aos caminhos seguros nos labirintos da existência, ao auto encontro da harmonia conosco, com o próximo, com Deus e com a Natureza.
Não desanime. O oásis existe!
MUITA PAZ!
Lindo texto! É, sob outro viés, o desenvolvimento de ideias irmãs. Reflexão necessária, acolhida no coração. Gratidão!
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