Cláudia foi educada para ter um rumo na vida. Moça de família em busca de um rapaz direito, que a fizesse arder de amor. Constituir família. Nada de ficar para titia.
Reconheceu em Pedro sua alma gêmea, sentindo o coração acelerar. Foi flechada. Pedro era a pessoa certa na hora certa. O amor verdadeiro. Todos concordavam que haviam sido feitos um para o outro. Não demorou para casarem-se.
Cláudia quis vestido branco e aliança. Altar enfeitado com flor. Chuva de pétalas. Tapete vermelho e marcha nupcial. A família perguntaria “quando vem o neném?”, até o primeiro filho nascer. E, depois, “quando vem o irmãozinho?”, até a menina chegar. Filhos, os presentes de Deus. O menino no futebol. A menina no balé. Área de lazer aos domingos. Foto com Papai Noel no Natal. Viagem à Disney. O sonho completo.
O casal seguiu, por anos a fio, o roteiro traçado. Casa própria. Filhos na faculdade. Mas o tempo, aos poucos, distanciou os dois. Sentiram o amor morrer. Cláudia não queria acreditar. Pedro era o homem da sua vida. Que a trocou por outra, anos mais jovem, abraçando, feliz, o estereótipo.
Cláudia quase morreu de paixão. Como se o seu amor fosse castelo de areia que a onda do mar levou. Chorou rios. O coração sem direção, perdidas as referências que conhecia. “Não soube segurar o casamento”, disseram as tias. “O que tiver que ser, será”, conformou-se a mãe. “Dona do seu nariz”, vibraram as amigas, inspiradas em sua força de superação.
A vida arrumada, os filhos crescidos, precisou inventar saídas. E rompeu com os clichês.
Entregou-se ao vazio da casa, encaixando passatempos, sem pressa nem interrupção. Espalhou-se na cama de casal, deliciando-se no conforto de dormir sozinha. Ocupou o armário vazio com casacos de frio, próprios ao clima dos países que visitou. Fez família no mundo. Encontrou pessoas afins, semeando laços frescos. Com alguns homens, colheu felicidade mesmo onde não coube eternidade. Deixou seguir os que a machucaram, esquecendo-os entre os risos das descobertas. Por vezes, construiu sobre o movediço para deixar-se tragar. Reergueu-se, sempre, em novo chão.
Dizem a vida ser mais leve para quem tem companhia. Mas estar só não a paralisa. Conhece os perigos e enxerga além. Sonha futuros inimaginados e aposta no melhor. Se lhe prometem uma vida como a anterior, hesita. Aprendeu a negociar. Condiciona sua presença a cenários em que, mesmo cedendo, ainda possa experimentar-se.
DICA DA SEMANA:
A dica é, na verdade, um convite para vocês conhecerem o Podcast “Barman das Horas Vagas“. Realizado por Felipe Romano, Gustavo Zaparolli e Ale Stagetti, o programa difunde a cultura da coquetelaria para leigos.
Em cada episódio, um coquetel/drink é selecionado como tema e os rapazes falam do universo cultural em torno dele. Receitas, técnicas, impressões pessoais preenchem o espaço da boa conversa entre eles. O programa traz, ainda, o quadro “Beba que lá vem história”, em que um escritor é convidado a escrever um texto, tendo como mote o coquetel abordado no episódio.
No episódio 35 da quarta temporada, recente levado ao ar, a convidada sou eu! Há uma crônica minha no ar: “Caju amigo“.
Passem lá para escutá-la e aproveitem para conhecer o trabalho dos rapazes!
O “Barman das Horas Vagas”, além de estar em todas as plataformas digitais, tem os seguintes endereços:
Site – https://barmandashorasvagas.com/
Instagram – @podcastbhv
Confira as colunas do Projeto AC Verso & Prosa:
com César Manzolillo
Ótimo texto. Reinventar-se é sempre necessário para enfrentar este mundo inconstante, em que nada dura a vida inteira. Isso vale para relacionamentos, filhos, trabalho e amigos. Abs!
Leitura leve, fluida, sensível, como costumam ser os textos da autora. Acredito que tocará especialmente aqueles de meia idade, que trilharam/ trilham o mesmo caminho que Claudia.
Parabéns, Aninha!
BELO , triste, verdadeiro. Obstáculos foram feitos para serem ultrapassados e vencidos. A personagem entendeu que a felicidade não está fora dela mesma. E fluiu para a vida nova,, como sempre fluem em direção à boa literatura os textos da Ana. Parabéns, mais uma vez.