Nascida em Osaka e radicada há 23 anos em Berlim, Shiota iniciou sua carreira artística em 1994, tomando a pintura como principal suporte. Todavia, logo descobriu que o espaço bidimensional era limitado para seu processo criativo e expandiu para as outras linguagens. Linhas da Vida reúne cerca de 70 obras que datam desde o início de sua produção artística aos dias atuais.
“Há certos motivos que acompanham Chiharu Shiota por toda sua carreira e surgem paralelamente em sua produção, a exemplo de objetos pessoais como chaves, vestuário, cartas, mobiliário e, ainda, elementos ícones da transitoriedade, como barcos”, explica a curadora. “Fotografias, vídeos, desenhos, gravuras e objetos foram selecionados meticulosamente para uma imersão no universo de Chiharu Shiota”, completa.
Organizada em cinco núcleos, a exposição é um convite de Shiota para que o visitante faça reflexões sobre a vida, seu propósito, conexões e memória. “Quero unir as pessoas no Brasil, não importando sua origem, status social, formação educacional, nacionalidade ou qualquer outro fator divisor. Como humanos, devemos vir juntos e questionar o nosso propósito na vida e por que aqui estamos”, afirma a artista.
Já no térreo, o público vai se deparar com a grande instalação Além da Memória (2019), obra inédita, que poderá ser vista a partir de todos os andares. A inspiração vem da diversidade do povo brasileiro e de um diálogo com a arquitetura monumental e histórica do CCBB-SP. Suspensa, com 13m de altura e em forma de uma espécie de nuvem, a instalação é composta por mais de mil folhas de papel em branco. É um convite para que o público idealize sua própria história e resguarde sua memória.
Os destinos da vida são questões recorrentes no processo de criação de Shiota e nas obras que ocupam o subsolo do CCBB-SP. Ela tece as linhas de sua vida e convida o público a fazer o mesmo. Essa é a ideia presente em Linha Vermelha (2018), obra que lança luz à produção manual da artista, uma de suas principais características. Em outro momento, dois barcos escuros surgem em meio a emaranhados de cordas vermelhas como alusão aos caminhos da vida. Trata-se de Dois barcos, um destino (2019), uma metáfora da artista sobre as formas de avançar, viajar, sem necessariamente saber qual é o ponto final, tal qual o percurso da vida. “Os barcos simbolizam os portadores de nossos sonhos e esperanças, levando-nos através de uma jornada de incerteza e admiração”, diz Arruda.
Chiharu divaga sobre a ideia de uma conexão universal de todos os seres. Transforma sua história em uma linguagem artística de caráter singular, sublime e tomada de elementos triviais. É disto que nasce o conjunto de esculturas e edições organizados em Conectada com o universo (2016 – 2019), núcleo exibido no primeiro andar do CCBB-SP. As gravuras aqui expostas têm como ponto de partida um ser conectado ao universo por um fio, espécie de cordão umbilical simbolizando o início da vida antes mesmo do nascimento. Em outras obras, a artista sugere que este mesmo ser se vê imerso ou submerso em um buraco ou invólucro sem perspectiva de saída e, assim, sua conexão com o mundo externo passa a ser realizada por vias imaginárias ou mesmo espirituais.A presença do hermetismo não é ao acaso. Em dado instante de sua trajetória, Shiota tomou uma decisão existencial e parou de pintar – na época, seu principal suporte – porque não sentia que sua vida e sua criação artística estavam conectadas, entrelaçadas. Sonhou que se via dentro de uma pintura e foi assim que concebeu a icônica performance Se transformando em pintura (1994), cujo registro é exibido no segundo andar.
A tinta usada por Shiota nesta performance era tóxica e a artista sentiu imediatamente sua pele queimar e o pigmento só desapareceu de sua pele depois de alguns meses. Passados cerca de 20 anos, a artista voltou a utilizar a tela, porém não como um suporte pictórico convencional, mas, sim, como suporte de sua assinatura pessoal, sobre a qual aplica a trama de lã originariamente utilizada em suas instalações.
Ainda no segundo andar, a artista exibe A chave na mão (2015), instalação que esteve na 56ª Bienal de Veneza, na qual Chiharu representou seu país no pavilhão do Japão. A obra é composta por dois barcos que lembram, segundo a artista, duas mãos receptoras prestes a agarrar ou deixar de lado uma oportunidade, postos em um emaranhado de 180 mil chaves.
“O montante foi coletado por Shiota em uma campanha internacional, ato que a comoveu porque as pessoas normalmente dão suas próprias chaves aos outros em quem confiam. E para artista, as chaves estão associadas a memórias pessoais que nos acompanham em nossas vidas cotidianas”, conta Tereza de Arruda. A lã vermelha usada para montar a trama que emaranha os barcos simboliza os vasos sanguíneos do corpo e conecta a multidão dos proprietários das chaves.
No último andar do CCBB-SP, um núcleo de trabalhos pautados no Corpo, tema que aparece desde os primórdios na criação de Shiota. São obras em que a artista investiga questões ligadas à identidade, memória, corpo, fragilidade e doenças.
“O trabalho de Shiota evolui a partir de uma dinâmica orgânica de fazer e criar. Nota-se aqui que dentro de uma mesma temática há uma abrangência de obras distintas, como filmes resultantes de performances intimistas, tendo a artista como única protagonista em um relato pessoal, objetos compostos de roupas, que na perspectiva de Shiota existem como uma segunda pele humana a carregar em si os traços e vestígios da experiência humana e memória aí vivenciada, ou ainda objetos de vidro representando órgãos do corpo humano sãos ou dilacerados. Estes gestos e objetos artísticos referem-se à vida humana de forma geral”, finaliza a curadora.
Simultaneamente à retrospectiva no CCBB-SP, Chiharu Shiota expõe na Japan House São Paulo a mostra Internal Line, composta por um site specific que representa a memória como tema central.
Sobre a artista
Nascida em Osaka, em 1972, atualmente vive em Berlim. A inspiração de Chiharu Shiota muitas vezes brota de uma emoção ou experiência pessoal, que ela então expande para questões humanas universais, como a vida, a morte e as relações entre os indivíduos. A artista redefine os conceitos de memória e consciência, reunindo objetos corriqueiros, como sapatos, chaves, camas, cadeiras e vestidos, e inserindo-os em enormes estruturas feitas de fios. Explora em suas instalações a sensação de uma “presença na ausência”, mas também apresenta emoções intangíveis em suas esculturas, em seus desenhos, vídeos de performances, nas telas e fotografias. Em 2008, recebeu o Prêmio de Incentivo aos Novos Artistas, do Ministério de Educação, Cultura, Esportes, Ciência e Tecnologia do Japão. Seus trabalhos têm sido expostos em mostras individuais em instituições de todo o mundo, como: Museu de Arte Mori, Tóquio (2019); Gropius Bau, Berlim (2019); Galeria de Arte do Sul da Austrália (2018); Parque de Esculturas de Yorkshire, Reino Unido (2018); Usina de Arte, Xangai (2017); K21 Kunstsammlung Nordrhein-Westfalen, Düsseldorf (2015); Galeria Arthur M. Sackler da Smithsonian Institution, Washington DC (2014); Museu de Arte de Kochi (2013); Museu Nacional de Arte, Osaka (2008), entre outros. Também participou de várias exposições internacionais, como o Festival Internacional de Arte de Oku-Noto (2017); a Bienal de Sydney (2016); a Trienal de Arte de Echigo-Tsumari (2009) e a Trienal de Yokohama (2001). Em 2015, Shiota foi escolhida para representar o Japão na 56a Bienal de Veneza.
Sobre a curadora
Tereza de Arruda é mestre em História da Arte, formada pela Universidade Livre de Berlim. Vive desde 1989 entre São Paulo e Berlim. Como resultado de um acompanhamento contínuo da produção de Chiharu Shiota nos últimos anos, foi curadora de diversas exposições da artista, entre elas a sua primeira mostra retrospectiva realizada na Alemanha, Under the Skin, na Kunsthalle Rostock (2017), acompanhada da monografia publicada pela editora Hatje Cantz; a mostra coletiva In your Heart/In your City, com a participação de Chiharu Shiota, Takafumi Hara, Tatsumi Orimoto e Yukihiro Taguchi, no Køs Museum of Art in Public Spaces, na Dinamarca (2016), assim como a primeira mostra individual de Chiharu Shiota na América Latina, realizada no Sesc Pinheiros, em São Paulo (2015). Foi curadora da mostra 50 Anos de realismo — do fotorrealismo à realidade virtual, realizada no CCBB São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro (2018/2019), além da mostra Índia — Lado a lado, no CCBB Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília (2011/2012). Como curadora independente, colabora internacionalmente com diversas instituições e museus na realização de mostras coletivas ou monográficas, como Ilya e Emilia Kabakov: Two Times, no Kunsthalle Rostock (2018) ou Sigmar Polke — The Editions, no Me Collectors Room Berlin (2017) e no Museu de Arte Assis Chateaubriand de São Paulo (MASP) (2011). Desde 2016 é curadora associada da Kunsthalle Rostock. Em 2018, tornou-se conselheira do programa de residência da Fundação Reinbeckhallen em Berlim. É curadora convidada e conselheira da Bienal de Havana desde 1997 e cocuradora da Bienal Internacional de Curitiba desde 2009. (www.p-arte.com)
Serviço:
Linhas da Vida, exposição de Chiharu Shiota
Período expositivo: até 27 de janeiro de 2020
Entrada gratuitaCentro Cultural Banco do Brasil São Paulo – CCBB SP
Rua Álvares Penteado, 112 — Centro. São Paulo -SP
(Acesso ao calçadão pela estação São Bento do Metrô)
(11) 3113-3651/3652 | Todos os dias, das 9h às 21h, exceto às terças.
ccbbsp@bb.com.br | bb.com.br/cultura | twitter.com/ccbb_sp |
facebook.com/ccbbsp | instagram.com/ccbbsp
Acesso e facilidades para pessoas com deficiência | Ar-condicionado | Cafeteria e Restaurante | Loja
Estacionamento conveniado: Edifício Zarvos – Rua da Consolação, 228.
Traslado gratuito até o CCBB. No trajeto de volta, a van tem parada na estação República do Metrô.
Valor: R$ 14 pelo período de 6 horas.
É necessário carimbar o ticket na bilheteria do CCBB.
Instalação Internal Line, Chiraru Shiota
Japan House São Paulo (Avenida Paulista, 52)
Até 02 de fevereiro 2020
Térreo
Entrada Gratuita