Estupro “culposo” não existe : O Artecult ouviu alguns psicólogos e advogados sobre o caso Mariana Ferrer que está provocando muita indignação nas redes sociais

 

Em Setembro desse ano o empresário André de Camargo Aranha foi inocentado pela justiça no caso de estupro da promotora de eventos Mariana Ferrer. O resultado gerou revolta entre mulheres e ativistas levando a hashtag #JustiçaPorMariFerrer aos trending topics do Twitter. André foi identificado pela polícia como autor do estupro que ocorreu em uma festa no fim de 2018 em Florianópolis, ainda assim a justiça o inocentou. Para o Ministério Público Aranha cometeu um estupro mas que se enquadraria em crime culposo, pois “não teria a intenção de estuprar”. Essa tese não tem qualquer precedente na justiça brasileira e também contradiz a tese inicial do próprio Ministério Público que considerava o empresário culpado por estupro de vulnerável, na época ela tinha 21 anos e era virgem.

Agora, o caso veio novamente à tona depois que um vídeo do julgamento foi divulgado nas redes sociais onde são mostrados ataques a blogueira . O vídeo está provocando muita indignação e imagens como essa da nossa capa estão sendo publicadas em todas as timelines, como um verdadeiro movimento contra este tipo de cultura machista.

Para saber mais sobre o caso, veja este link do Intercept Brasil. Importante destacar que o termo “estupro culposo” não existe na senteça, mas está “…permite a punição por crime culposo”, por isso utilizaram o termo entre aspas na narração do vídeo, como se o que aconteceu fosse um estupro culposo, ou seja, sem intenção/dolo, o que não existe:

O CNJ abriu investigação sobre conduta de juiz que inocentou empresário em SC. O promotor que pediu absolvição alega que não houve provas de dolo, ou seja, intenção de cometer estupro. No julgamento, o advogado de defesa, Cláudio Gastão da Rosa Filho, exibe fotos sensuais feitas por Mariana Ferrer quando era modelo profissional, definindo-as como “ginecológicas”; ele afirma ainda que “jamais teria uma filha” do “nível” de Mariana e, ao vê-la chorar, diz: “- Não adianta vir com esse teu choro dissimulado, falso e essa lábia de crocodilo.”.

Imagens do julgamento que estão provocando indignação ,clique aqui para ver a matéria do G1 – Santa Catarina.

 

O ArteCult então procurou alguns psicólogos e advogados para comentarem o caso.

Veja abaixo os depoimentos:

 

“O processo é um 7 a 1 do patriarcado, deixando a vítima, mulher, sem nenhuma chance.
1. A tese de defesa de que o estuprador se equivocou em se assegurar se houve ou não vontade da vítima ,(ou capacidade de oferecer resistência) é estapafúrdia nos casos de estupro de vulnerável (mulher alcoolizada).
2. A tese foi estranhamente abraçada por quem deveria acusar o estuprador, o Promotor Camaçari, que pediu a absolvição porque o erro só admitiria punição se estupro tivesse modalidade culposa.
3. O juiz não acolheu essa tese. Absolveu por falta de provas.
4. O advogado do estuprador abandona qualquer tese de defesa pra mergulhando no machismo tentar transformar a vítima em culpada, humilhando e agredindo a mulher.
5. O Juiz, totalmente subserviente, nada faz para conter as agressões absurdas do advogado.
6. O defensor público, patrono da menina, conivente com sua omissão, nada faz para conter a agressão do advogado do estuprador, a ponto de a propria vítima ter que se defender sozinha.
7. É o patriarcado que ainda penetra forte no imaginário masculino e aconluia esses 4 homens contra a mulher, que ficou isolada sendo vilipendiada e duplamente violentada.” 
(IVAN SIMÕES GARCIA, Advogado e Parecerista. Professor da UERJ, UFRJ,PUC-Rio. Doutor em Direito do Trabalho PUC-SP e em Filosofia UFRJ. Mestre em Constitucional PUC-Rio – Rio de Janeiro,RJ – Instagram @ivangarcia_adv )

 

“A situação da Mariana já começa sendo absurda quando uma mulher vítima de estupro tem seu processo colocado inteiramente nas mãos de homens. Esse é o primeiro ponto que chama atenção: nenhuma mulher atuando na demanda, seja na qualidade de magistrada ou de Ministério Público. Os homens em questão também entendem pouco ou nada sobre violência de gênero para combatê-la e, como se pôde perceber, também nunca tiveram interesse em entender, mas estão ali, decidindo sobre a vida de uma mulher que pediu socorro à Justiça por ter sido vítima de estupro e acabou sofrendo violência moral dentro do próprio tribunal. Esse é apenas o início dos inúmeros absurdos ocorridos no processo da Mariana Ferrer, que foi vítima duas vezes, dentro e fora do tribunal! Eu mesma já passei por situação constrangedora em audiência por ser a única mulher na sala.”
(LUDIMILA CINDRA, advogada do escritório Cardoso Cindra advocacia atuante em Direito de Família, estudiosa em machismo e violência de gênero – Rio de Janeiro,RJ – Instagram @DireitoNaMesa )

 

“É preciso que se dissemine sobre o conhecimento acerca dos danos psicológicos causados às vítimas de estupro. Ao passar por um abuso sexual , haverá danos e traumas, de curto e longo prazos, podendo desencadear  transtornos de estresse pós-traumático, de ansiedade, depressivos e alimentares, distúrbios  de humor e sexual. Alterações comportamentos, no sono, evitativos e suicidas.  A tentativa de julgar a vítima, a partir de características que nada tem a ver com o processo, é preocupante devido a estado mental e emocional. O estupro não é um ato sexual, é um ataque físico, sexual e psíquicológico, podendo trazer doenças sexualmente transmissíveis, e correndo o risco de uma gravidez indesejada. Para o homem que comete o estupro é a questão do poder , ou seja, é sentir-se no direito de obter algo. Para entender o comportamento de quem comete o estupro, é um ato pensado e  calculado.
Desmerecer a vítima em uma audiência não só trará danos mentais como emocionais, é preciso haver limites ou rever os julgamentos em casos de estupro. Através de profissionais que estão fazendo o acompanhamento das vitimas, pode-se avaliar os danos. Expor a vitima e reviver o trauma, certamente causará mais danos. Se o objetivo é punir prender o culpado, de alguma forma, nesse caso, a vitima está sendo “punida” , julgada, exposta. A pergunta se que se faz aqui é quem é a vitima.”
(Dra. Beatriz Moura psicóloga TCC (21) 97992-5789 – CRP/RJ 05-54129 – Rio de Janeiro,RJ – Instagram @byamourapsi )

 

” Na verdade a questão do estupro culposo pega uma nação, pega um mundo, né, de surpresa por conta de uma transferência de um ato violento… é danoso, de um formato do piores comportamentos do humano. Fazendo que a comoção precise acontecer para demonstrar que todos nós somos responsáveis, né? A questão não é somente com a Mari e sim com todas nós mulheres, inclusive a que criamos filhos porque também temos responsabilidade que oferecemos aos nossos meninos. Eu tenho um filho e particularmente coloco ele com a noção,  é… de que não é não, de que uma mente não tão consciente não delibera a ponto de saber exatamente o que está fazendo, mesmo se ela esteja NUA, não existe como a gente não protestar, contestar, falar,de se pá, uma palavra tudo contra isso. Isso fere não só uma vida, mas muitas vidas, o efeito psicológico disso vai contra as atitudes que a gente tenta de igualar o universo feminino no ambiente social, e isso fala sobre a deliberada corrupção do nosso sistema, frente a tantas, acredito que, circunstâncias ruins , é.. é corrupto,isso tudo é muito… é um efeito amoral na nossa população mundial. Isso só interrompe um processo de desenvolvimento humano e faz a gente involuir, cada vez mais conquistar um lugar de igualdade , um respeito, acho que um sentido humano, de verdades, de liberdade, de escolha. Isso é involuntivo, tudo isso é involuntivo, é uma vergonha, é descabivel e inaceitável. ” (Drª Vanessa Jaccoud  Psico-Oncologista, Psicóloga clínica, residente no ambulatório de Psicossomática da Santa Casa de SP e membro da WPATH – Rio de Janeiro,RJ – Instagram @dravanessajaccoud – (21)97353-2922) 

 

“Analisando o vídeo da audiência e lendo a sentença do polêmico caso de “estupro culposo”, percebi que em nenhum momento o juiz absolve o estuprador alegando estupro culposo . Apesar da maioria estar indignada, publicando #estuproculposonaoexiste , deveriam ver o vídeo primeiro. Por um lado foi bom que viralizou e as pessoas podem ver o que é uma audiência de estupro , o que a mulher passa pra conseguir justiça .
Ele usou o termo “estupro culposo”, que estava em uma passagem citada para explicar como se configura estupro de vulnerável, é necessário que a vítima, por qualquer motivo, não tenha condições físicas ou psicológicas de oferecer resistência à investida do agente criminoso”. O termo faz parte do livro Direito Penal , de Cleber Masson, em que o autor citado pelo juiz teria escrito “como não foi prevista a modalidade culposa do estupro de vulnerável, o fato é atípico”.
Conclusão , o juiz foi machista assim como o promotor, que pediu a absolvição do réu por falta de provas , que existem mas eles não estão considerando ela .
O laudo do corpo de delito , confirma , entorpecentes no sangue dela ( o que a faz vulnerável) , semem do estuprador( prova que ele penetrou ela ) e rompimento do hímem . A defesa dele alega que ele não sabia que ela estava drograda pq não aparentava ,então não seria estupro , ele diz que ela consentiu. É imoral ? É !
Sobre o que aconteceu ali naquele interrogatório é corriqueiro , infelizmente . E começa na delegacia . O sistema todo precisa ser revisto , na delegacia da mulher , no IML , no julgamento , deveria sim ser uma equipe composta de mulheres preparadas para amparar estas mulheres que já sofrem o bastante .
A Mari Fer , sofreu abusos piscologicos horríveis nesta audiência , mas é normal , pq o advogado de defesa precisa desiquilibrar , desmontar, tirar a credibilidade , fazer ela se questionar se realmente ela foi estuprada , desqualificar ela .
É horrível , o juiz ali podia e deveria ter dado limites , pq o advogado de defesa caluniou e a difamou diversas vezes , cabe processo sim aí , mas o juiz não podia expulsar o advogado por isso .
É revoltante e é assim que é uma audiência de estupro e agressão contra a mulher , podre , machista , cruel , desumana .
O código penal , o sistema judiciário , tudo , favorece sempre aos homens.
Vamos nos revoltar com esta sentença ? Claro!
Mas se revoltar com o que de fato tem de se revoltar , eles alegarem que não existe provas , tendo sim . Mas não teve nada de criação de estupro culposo , o juiz realmente acredita que ela não foi estuprada ? Pq para os homens a culpa sempre é da mulher , por isso deveria ser uma mulher a julgar, não homens . Aliás , e a promotoria que mais parecia da equipe da defesa .
Já passou da hora de sermos respeitadas. Precisamos ter mais segurança e amparo na hora de denunciar um estuprador sem sofrer humilhação . Essa audiência foi um filme de terror.”
(JACQUELINE BOTREL – Advogada, Pós graduada em Direito Público e especialista em Trabalhista. Montes Claros, MG – Instagram @JacBotrel)

 

“Mais uma vez escancara-se à fragilidade do sistema jurídico brasileiro e suas entranhas conservadoras e patriarcais. As cenas protagonizada pelos atores que compõem a estrutura jurisdicional brasileira promoveram uma deplorável situação de humilhação e omissão dentro de audiência processual que afronta as diretrizes mínimas destinadas a qualquer parte. Mariana Ferrer torna-se uma figura de protesto e que reverbera um grito que hoje eco atrás de tratamento igualitário e respeito à mulher. Tais anseios ultrapassam os limites do tribunal e refletem um pensamento que a própria sociedade brasileira ainda carrega. Tempos de mudanças urgem e o progresso demanda luta!”
(DENIEDSON FILHO, Advogado – Jacobina, BA – Instagram @deniedsonfilho.adv)

 

“Estrupo Culposo Não Existe. Esse veredicto é a institucionalização do Estupro no país. Um país de machistas, misóginos sentados nas cadeiras de poder. Onde o dolor passa pela conta bancária do estuprador e bandido. Eles a ridicularizaram. Uma ação reversa por parte desses que estão na Justiça para defender os direitos físicos e moral de todos os cidadãos. No Brasil impera a cultura do estupro, invertendo-se os papeis e culpando a vitima. Por isso, muitas mulheres se calam, para não serem ridicularizadas pela justiça. Quem põe fotos sensuais na internet, na visão desse interrogador, poderá ser estuprada sem problemas. O presidente abriu precedente em 2003 ao dizer que a deputada Maria do Rosário não merecia ser estuprada instituindo assim o ” estupro por merecimento ” por ele. Esta sugestão fez seguidores. Todo apoio a Mariana Ferrer.

Atitudes como essas abrem caminhos, dão voz para seguidores. A indignação é de todas nós. Não podemos aceitar que o inquisidor achincalhe uma mulher em cima da sua dor. Não é possível tolerar que condenem alguém por ter postado fotos sensuais na internet, nomeando-a de indigna, relativizando e achando normal que um estupro possa ocorrer. E sem punição ao criminoso. Todo o nosso apoio a Mariana Ferrer. Todo nosso desapoio ao machismo e à cultura do estupro.

Estupro culposo é estupro sem culpa, sem intenção de estuprar. Penetra sem querer penetrar, fere sem querer ferir, invade sem querer invadir, traumatiza sem querer traumatizar, destrói sem querer destruir. Entendi tudo. O juiz não condena porque tem intenção de promover novos estupros.

#NaoAceitaremosEsseVeredicto”
(SILVIA COSTA – Psicóloga – Rio de Janeiro,RJ – Instagram @sillviacostapsicologia)

 

“Li a sentença, e realmente ela foi técnica, e não usa o termo “estupro culposo” apesar de existir o conceito na senteça.
O chocante, nesse caso, foi a conduta do promotor na audiência. Foi triste de se ver. O papel do promotor ali era para tentar a condenação, se via que não tinha condições, podia, ao menos, conversar com a vítima e com o assistente, privadamente, para expor a situação e evitar aquele show de horror.
Acho que a condução da audiência é que foi triste.”
(PAULO PAES – Bacharel de Direito e vocalista da banda Dinossauros Nacionais – Instagram @pcirio e @dinossaurosnacionais)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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