
Com Ana Lúcia Gosling

Colagem fotos de Xavier Mountoun Photographie, Eye for Ebony e Manish Jadhav, em Unsplash
Você, filho; eu, mãe aprendiz. Canoa montada em alto mar. Aperto-o contra o peito, você suspira a paz dos protegidos. Confia. Sinto medo de adormecer e derrubá-lo, de não conseguir nutrí-lo, de arriscar minha vida, num simples atravessar fora da faixa. Você depende de mim. Eu não saberia mais viver sem você. E espero o sinal fechar.
Sou suas certezas. O choro, pedindo; o olhar, confirmando. Partimos do zero. Ensino-o tudo: a apoiar-se, andar, falar, ter calma, reprimir o tapa e verbalizar a dor. Garanto a casa ser morada verdadeira, mesmo quando a vida fere. É tempo de acreditar no que digo, sugar do fantástico a essência real, os valores importantes. Você crê, e não desminto, eu conhecer todas as saídas. A cura com beijo, o fim da dor com uma bala, a vida serenar num acalanto.
Põe os pés no chão e corre na direção do mundo. Meu superpoder morre, um pouco, a cada manhã. Já não controlo o modo de ser tratado. Sei não haver existência sem sofrimento. Mas ainda o protejo das quinas salientes, presto atenção aos ambientes, às pessoas entrando e saindo das nossas vidas, aos filmes e desenhos consumidos, ao computador, às portas secretas escancaradas fora dos limites do lar.
Outras verdades entram. Você as incorpora. Se é amado ou compreendido, se enxergam, atrás do olhar, sua alma, não sei. Você se arrisca. E a mim sobra menos, muito pouco para quem controlava tudo, quando minha vista cobria os seus horizontes. Hoje, você observa de outras margens: sou eu no horizonte, longe, apoio na tempestade, não mais oráculo. Impotente frente aos seus mistérios.
Espero, na minha ausência, haver quem possa ajudá-lo. Mas não conte com isso. A vida derruba mesmo se fugirmos dos enfrentamentos. Na falta do meu amor, desejo haver alguém para amá-lo. Mas saiba: o sentimento é colhido após o semeio.

Foto: Manuel Schinner, em Unsplash
Nos dias sombrios, seja minha lembrança a boia para uma melhor versão da história. O amor não tem fim. A vida é milagre que não se desperdiça. O bem encontra compensação. Minha inocência nasce da pureza trazida por você, lá no início. Agora, é você quem me leva pela mão. Evite flertar com os abismos, andar em estradas íngrimes: nossos corações dividem o mesmo compasso. Seu orgulho é nosso. Seu fracasso é meu.
Eu deveria ler sinais e chegar à porta com remédio, coberta, solução. Sem esperar-me, você chega com as compras. Pequena, cada vez menor, abraço você. Seu cheiro é lar, paredes do meu abrigo. Meu amor ainda o alimenta. Você não percebe mas nunca o tirei dos meus braços.


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com César Manzolillo













