Miguel Sanches Neto: o autor de O último endereço de Eça de Queiroz é o convidado desta semana do AC Encontros Literários

 

Miguel Sanches Neto (@sanchesnetomiguel) nasceu em Bela Vista do Paraíso (PR). É autor de romances, crítica, poesia, crônicas e contos. Atua também como professor universitário e crítico literário e já publicou artigos, ensaios e livros sobre autores brasileiros como Manoel de Barros, Dalton Trevisan e Cecília Meireles.

Confira abaixo a entrevista exclusiva que preparamos pra você.

 

ArteCult: Como a Literatura entrou na sua vida?

Miguel Sanches Neto: Foi minha vida que entrou na literatura. Vindo de uma família de agricultores pouco ou não alfabetizados, não convivi com livros em casa. Até o dia em que, sem querer, entrei na biblioteca da escola e comecei a ler os livros de literatura, definindo assim a minha carreira nas letras, seja como professor de literatura, seja como escritor. Meu primeiro romance, Chove sobre minha infância, é a história de como nasce um escritor em camadas não letradas. É um romance de autoficção, em que me coloco como personagem.

 

AC: Como é sua rotina de escritor? Escreve todos os dias? Reescreve muito? Mostra para alguém durante o processo?

MSN: Escrevo todos os dias, pois tenho um diário pessoal que alimento com o que me acontece, mas quando estou escrevendo romances tento criar um ritmo que mantenha o livro aceso em minha imaginação, para que a história não encrue. Geralmente, escrevo nas madrugadas, finais de semana, feriados e férias, pois, durante os dias da semana, trabalho de 8 a 12 horas na universidade. Sempre fui um escritor que se fez apesar das muitas obrigações profissionais. Depois de escrito, reescrevo diversas vezes, em voz alta algumas delas, para esticar os arames da linguagem. Só depois destas limpezas é que encaminho geralmente a um ou outro amigo e para minha agente e meus editores.

 

O último endereço de Eça de Queiroz: romance recém-lançado. Foto: Reprodução internet.

 

AC: No seu caso, de onde vem a inspiração?

MSN: Não há inspiração. É uma espécie de iluminação. Algo se abre, e, por meio dessa abertura, vejo uma parcela da realidade. Também uso muito as experiências guardadas na memória, que são convocadas para narrativas imaginárias. O que conduz o escritor são coisas pequenas, metáforas da realidade, traumas, encantamentos, um olhar crítico. Eu sigo o caminho dessas sinalizações e vou construindo um mosaico que no final tem que formar um todo.

 

AC: O fantasma da página em branco: mito ou verdade? Isso acontece com você? Em caso afirmativo, o que faz para resolver esse problema?

MSN: Não sofro com a página em branco. Só escrevo quando tenho a história já bem imaginada. Durante o processo de escrita de um romance, há momentos de maior velocidade e momentos de respiro, mas eu sei que a história está lá, me aguardando.

 

Chove sobre minha infância: romance de autoficção sobre o nascimento de um escritor. Foto: Reprodução internet.

 

AC: Um livro marcante. Por quê?

MSN: Recordações do escrivão Isaías Caminha, do Lima Barreto, porque, com esse livro sobre a discriminação sofrida pelos negros no Brasil, a linguagem literária desce pela primeira vez ao nível da fala dos pobres.

 

AC: Um escritor marcante. Por quê? 

MSN: Dalton Trevisan, contista conhecido como o vampiro de Curitiba, que foi meu mestre durante os anos de formação, em conversas que fazíamos semanalmente. Ele foi minha universidade de escrita literária. A partir dessas experiências, escrevi Chá das cinco com o vampiro.

 

Chá das cinco com o vampiro: experiências literárias com o escritor Dalton Trevisan viram livro. Foto: Reprodução internet.

 

AC: Na sua opinião, que características um bom conto deve apresentar?

MSN: Deve ser maior do que a história que ele conta, soando na memória do leitor, e deve ser como uma bola de aço, uma esfera perfeita.

 

AC: Sei que você também escreve para crianças. Como se relaciona com esse público?

MSN: Escrevi vários livros para crianças, curiosamente no período em que meus filhos eram pequenos. Hoje, eles cresceram e eu não tenho escrito muita coisa nova. Talvez volte a ser autor de histórias infantis quando vierem os netos.

 

AC: Entre os seguidores do canal de Literatura do portal ArteCult, muitos são aqueles que escrevem ou que desejam escrever. Que conselho ou dica você poderia dar a eles?

MSN: Não tenha pressa para publicar, é importante conviver longamente com um livro antes de entregá-lo ao público. E só escreva se você realmente se sentir sufocado por uma história, como se estivesse engasgado, com um osso de galinha.

 

Bem, é isso. Até a próxima!

 

O projeto AC Encontros Literários venceu o troféu APPERJ (Associação Profissional de Poetas no Estado do Rio de Janeiro) 2021 na categoria Encontros Literários on-line.

 

César Manzolillo

Colunista do canal LITERATURA

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AC Encontros Literários

AC Encontros Literários tem curadoria e apresentação (lives) de César Manzolillo (@cesarmanzolillo).

Author

Carioca, licenciado em Letras (Português – Literaturas) pela UFRJ, mestre e doutor em Língua Portuguesa pela mesma instituição, com pós-doutorado em Língua Portuguesa pela USP. Participante de 32 coletâneas literárias. Autor do livro de contos "A angústia e outros presságios funestos" (Prêmio Wander Piroli, UBE-RJ). Professor de oficinas de Escrita Criativa. Revisor de textos. Toda quinta-feira, no ArteCult, publica um conto em sua coluna "CONTO DE QUINTA", que integra o projeto "AC VERSO & PROSA" junto com Ana Lúcia Gosling (crônicas) e Tanussi Cardoso (poemas).

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