Aleilton Fonseca: o autor de A Terra em pandemia é o convidado desta semana do AC Encontros Literários

Aleilton Fonseca (@aleilton_fonseca) é baiano de Firmino Alves. Doutor em Letras pela Universidade de São Paulo, atua como professor de Literatura Brasileira na Universidade Estadual de Feira de Santana.  Escreve poemas, contos, romances e ensaios. É membro da Academia de Letras da Bahia e do PEN Clube do Brasil.

Confira abaixo a entrevista exclusiva que preparamos pra você.

 

ArteCult: Como a Literatura entrou na sua vida?

Aleilton Fonseca: A literatura entrou muito cedo na minha vida, através da leitura juvenil, na cidade de Ilhéus (BA).  Aos 10 anos, descobri o caminho da biblioteca, esgotei a pequena estante de casa, não parei mais de ler. Aos 16, comecei a escrever poemas e pequenas narrativas em cadernos escolares. Aos 21, publiquei meu primeiro livro, já estudante de Letras, em Salvador.

 

AC: Como é sua rotina de escritor? Escreve todos os dias? Reescreve muito? Mostra para alguém durante o processo?

AF: Sou escritor, leitor e professor de literatura. Então, trabalho com literatura todo dia. Ou estou lendo, ou dando aula, ou escrevendo ou preparando um texto, uma aula, uma palestra. Escrevo com certa frequência, sempre estou com um texto em vista, seja um poema, uma narrativa, um artigo, uma resenha… Quando o ato de criação se manifesta, paro tudo e escrevo com intensidade. Reescrevo meus textos continuamente. Mostro o que escrevo a vários amigos escritores, professores e críticos. Gosto de dialogar sobre o processo e ouvir críticas e sugestões.

 

As formas do barro & outros poemas: as relações afetivas e a condição humana em pauta. Foto: Divulgação.

 

AC: No seu caso, de onde vem a inspiração?

AF: São ideias, motivações, desejos, propósitos de escrever sobre um tema, um assunto. Nem tudo se concretiza no papel. Mas todo texto surge em um momento de epifania, quando algo se revela à consciência e se materializa no processo da escrita.

 

Edição italiana de A Terra em pandemia. Foto: Divulgação.

 

AC: O fantasma da página em branco: mito ou verdade? Isso acontece com você? Em caso afirmativo, o que faz para resolver esse problema?

AF: Verdade. A página em branco é um deserto, um oceano, uma floresta. Um universo de possibilidades. Se as palavras não vêm, deixe para outra hora. Para vencê-la, é preciso antes amadurecer a ideia da escrita, adotar uma técnica, definir uma linguagem. Isso feito, a escrita flui e ocupa a página em branco, como um exercício de prazer.

 

AC: Um livro marcante. Por quê?

AF: Essa terra (1976), de Antônio Torres, que li em 1981 e me impressionou muito pelo impacto da leitura de uma ficção que tematiza a problemática social da migração do sertão baiano para São Paulo, com o drama de Nelo e a narrativa de Totonhim.

 

AC: Um escritor marcante. Por quê?

AF: Antônio Torres, porque sua obra ficcional me impressiona pelos enredos e temas, pela linguagem e pelo impacto no leitor. E também porque conheci o autor em 1997 e desde então mantemos um diálogo muito enriquecedor, que faz diferença na minha trajetória literária.

 

AC: Fale um pouco dos livros que já publicou até hoje.

AF: Publiquei o primeiro livro, Movimento de sondagem (poesia), aos 21 anos, em 1981. Em seguida, publiquei mais alguns livros de poesia, dentre os quais destaco dois: As formas do barro (2006), pelo lirismo dos temas e pelo trato da linguagem, em poemas que refletem sobre as relações afetivas e a condição humana; já A Terra em pandemia (2020) é um longo poema narrativo que traz uma visão agônica da crise pandêmica, ao traçar os rumos da covid-19 no Brasil e no mundo. Publiquei alguns livros de contos, entre os quais destaco O desterro dos mortos (2001) e As marcas da cidade (2012), nos quais trabalho temas que envolvem relações afetivas interpessoais, vivências, impasses e dramas existenciais, através de histórias que têm a ver com nosso cotidiano. Os dois romances, Nhô Guimarães (2006) e O pêndulo de Euclides (2009), são narrativas que reinterpretam o imaginário sertanejo e o universo canudense, em diálogo com a cultura e a história, através de uma escrita intertextual, fruto de minhas leituras. Os livros de ensaios registram minha experiência de estudo, destacando temas, autores e textos de meu interesse. Destaco o livro O arlequim da Pauliceia (2012), fruto de um doutorado na USP (1997), no qual interpreto as imagens paulistanas na poesia de Mário de Andrade. Tenho textos traduzidos e publicados no exterior, em países como França, Itália e Canadá.

 

O arlequim

O arlequim da Pauliceia: ensaio sobre a poesia de Mário de Andrade. Foto: Divulgação.

 

AC: Projetos em andamento: o que vem por aí nos próximos meses?

AF: Estou organizando um livro coletivo de ensaios sobre o modernismo no seu centenário; e organizo também uma reunião de textos de vários autores sobre a obra ficcional de Antônio Torres. Além disso, estou preparando um livro de haicais de motivos florais, com intenção de publicá-lo na primavera.

 

Edição brasileira de A Terra em Pandemia: longo poema narrativo. Foto: Divulgação.

 

AC: Entre os seguidores do canal de Literatura do Portal ArteCult, muitos são aqueles que escrevem ou que desejam escrever. Que conselho ou dica você poderia dar a eles?

AF: Primeiro, ler os livros seminais da literatura, em poesia e prosa. Ler bastante é como preparar o terreno da futura escrita. Exercitar a imaginação e dela tirar as sementes para o plantio. Treinar a escrita como uma aprendizagem e daí cultivar a criação literária como um ofício de prazer.

 

AC: Para encerrar, pediria que deixasse aqui uma amostra de seu trabalho como autor.

(Miniconto)

ATA DE (DES)AMOR

Era um vez… (Lúcio amou Lorena em plena rua: era outono, um sol tímido se insinuava. Ela ia passando, ele sentiu o hálito súbito da felicidade. Em sorrisos e gestos, seus olhos desataram-se no mesmo desejo. Lúcio acenou, ela já sofreava o passo; ele quis saber onde ficava uma rua qualquer. Era um truque: sorriram-se, em meio aos ruídos do trânsito. A brisa afagava os cabelos dela, tornando ainda mais lindo o seu olhar baudelaireano. Discreta, entreabertos lábios – meu amor, que olhos os teus! – ensinou-lhe o caminho e seguiram juntos. Ele propôs: tomassem um café. Depois outros atos, em cenas e palavras: jantares, cinemas, abraços, beijos, amores, casamento, um filho. Mas o viver é um campo de vasta aridez, e difícil de cultivar. Lúcio e Lorena, entre rosas e espinhos, perderam-se um do outro nas (des)atas do amor. Um dia choraram juntos a mútua e irremediável dor…) e se divorciaram.

 

 

Bem, é isso. Até a próxima!

 

César Manzolillo

Colunista do canal LITERATURA

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Author

Carioca, licenciado em Letras (Português – Literaturas) pela UFRJ, mestre e doutor em Língua Portuguesa pela mesma instituição, com pós-doutorado em Língua Portuguesa pela USP. Participante de vinte e quatro antologias literárias. Autor do livro de contos A angústia e outros presságios funestos (Prêmio Wander Piroli, UBE-RJ). Professor de oficinas de Escrita Criativa. Revisor de textos.

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