– Eu não acredito que você vai assim!
– Não tem nada demais querer amor, paixão. Já me basta esse ano inteiro no caritó.
– Vermelho da cabeça aos pés? Todo mundo vai achar que você está encalhada.
– Dona da minha narrativa. Não escondo que quero viver emoções.
– Sei.
– Vai dizer que você quer paz? Esse branquinho não me engana, não, Bruna. Aposto que sua calcinha é vermelha. Ou amarela, porque você vive dura.
– Pelo menos não fico alardeando pobreza nem carência.
– Melhor não deixar dúvida pra anjo nem orixá nenhum. Tudo bem às claras.
– Tanta desgraça no mundo, o santo vai priorizar sua vida amorosa. Até parece!
– Cada um com sua missão. Meu caso é vida amorosa. Meu anjo da guarda tem que focar nisso.
– Só você, Mariana.
– Vamos logo, já fecharam as ruas. Fica difícil chegar.
– Vou só pegar as sementes de romã pra pôr na sua carteira. Você acha meu vermelhinho bobagem mas coloca as sementes na carteira pra ver se atrai um dinheirinho.
– Eu não disse que era bobagem. Eu disse que era muita bandeira.
– E daí? De repente alguém na praia me acha bonita. Aposto que, de vermelho, vou me destacar na multidão. Todos de branco,,,
– Que praia? A Luísa mora longe da praia.
– Oito blocos só.
– Oito blocos! De salto alto, bêbadas e cansadas da noite. Ida e volta. Estou fora de praia, hein?!
– Mas você é chata! A gente precisa pular as sete ondas!
– Pula outro dia.
– Que outro dia? Tem que ser na virada.
– Bêbada? Você vai levar um caixote! Vai entrar o ano sendo arrastada.
– Quem disse que estarei bêbada?
– Mariana, passo Reveillon com você há três anos. Há três anos, você entra o ano bêbada, cantando e se pendurando nas pessoas.
– Eu não sei porque passo o Reveillon com você, sabia? Eu vou à praia. Eu vou pular as sete ondas.
– O táxi chegou. Aperta o botão do elevador, vai. Estou carregando o pernil.
– Pernil é bom. Não cisca pra trás.
– Pernil cisca?
– Não, não cisca. Aves ciscam.
– Não vai me dizer que foi por isso que você escolheu levar pernil.
– Claro! Luísa fará chester. No Reveillon, não pode nada que cisque pra trás.
– Meu Deus!
– O que foi agora?
– A gente podia ter levado uns sanduíches de queijo. Daria menos trabalho.
– Ano novo à base de sanduíche? Por isso que você vive dura, sabia? Porque você pensa pequeno e atrai mesquinharia.
– Abre a porta do táxi, por favor.
– Boa tarde, meu senhor. O endereço está aí no aplicativo. Obrigada.
– No ano que vem, se for pra ter essa trabalheira e fazer essa mandinga toda, acho que nem vou. Estou ficando cansada de passar fora de casa. Nunca tem condução pra volta. Tenho que esperar o dia amanhecer.
– Passar em casa? Sozinha? Ninguém fica sozinho no Reveillon, Bruna!
– Claro que sim! Muita gente fica sozinho no dia 31, eu, hein?!
– Quem passa a virada sozinha, fica o ano sozinha.
– Lá vem você com suas crendices. Você acha que meus cinco irmãos passariam um ano inteiro sem me atazanarem?
– A gente nunca sabe…
– Eu sei! Você acha que nenhum familiar, nenhum amigo, nenhum colega de trabalho me procuraria ou ajudaria, se eu precisasse?
– Ai, que conversa horrorosa. Vibra pensamentos bons. O novo está chegando.
– Você fala umas coisas…
– Deixa eu ter esperança, Bruna.
– Eu deixo você ser assim se você parar de querer que eu faça tudo do seu jeito.
– Está bem.
– Eu não quero pular onda.
– Não pula.
– Eu quero comer chester.
– Come. Fazer o quê?
– Enquanto você vai à praia, vou assistir à tevê.
– Está bem.
– Vai passar Entrevista com o Vampiro à meia-noite.
– Ai, Bruna, pelo amor de Deus! Assiste a uma comédia romântica! É ano novo!