REPRESÁLIA: Pré-estreia expõe início de trajetória de sucesso de filme

Pré-estreia expõe início de trajetória de sucesso de filme.

 

 

Recebi uma incumbência: acompanhar a pré-estreia de um filme. Para cinéfilo que sou, um cinéfilo contido por excesso de trabalho, ter a chance a ir em uma pré-estreia é sempre uma emoção a parte. Recebo a sinopse do filme, lista de atores e materiais promocionais. Empolgo-me. Claro, evitando expor a empolgação. Aprendi com o tempo a ser fã enrustido, meio ambíguo, pouco expondo a empolgação.

Quando cheguei no Barra Point, local onde seria a apresentação, ainda montavam tudo. Cheguei cedo. Erro meu. Mas erro gostoso. Tive acesso aos bastidores dos bastidores. Fiquei de longe vendo.

Espaço organizado. A beleza da pré-estreia se apresentava. Atores, diretor, roteirista, pessoal de imprensa, fotos, muitas fotos, mais um público que se somava ao grupo. Minha empolgação cinéfila se apresentava visível.

Foi aí que consegui me apresentar ao pessoal como advindo pelo ArteCult. Fui bem recebido. Passei a coletar fotos. Consegui conversar com pessoas envolvidas com o projeto, em especial o seu roteirista, João Faria, visivelmente emocionado com o filho que se apresentava. Conversamos em off sobre o processo, algo que irei destilar a outra coluna, para o deleite de vocês.

Depois, conversei com o ator principal da obra, Marcus Tardin, uma gentileza em pessoa, preocupado em apresentar uma obra fidedigna de seu talento. Marcus já é conhecido do grande público, tanto pelo inquestionável talento quanto pelo seu carisma. Receptivo, apresentei as perguntas. Disse que podia respondê-las quando quisesse. Eu primeiro iria me dedicar a escrever essa minha impressão da obra.

Iniciado o filme, típicas questões de pré-estreia se apresentam, qualidade do som, tamanho de tela, nada que desabonasse o filme. Os próprios autores foram bem claros, tínhamos em mãos uma média metragem. Aproveitaram para expor os próximos passos, como possibilidade de festivais ou ressignificação em uma série. Detalhes que aumentaram ainda mais a minha curiosidade. Há séries que não deveriam passar de filmes. Há filmes que não deveriam ser tão restritivos: seria fundamental expor ainda mais aquela órbita semântica de personagens e gama temática.

Ao assistir Represália, dá para se ver como há espaço para muito mais. O que tínhamos ali é uma joia. Não se pode chamar de bruta, porque não seria condigno. Estava lapidada para conter no espaço onde se encontrava. Há nele uma pitada de Casa de Papel, Tropa de Elite. Um olhar mais apurado, consegue ver deleites particulares. Há ali uma pitada de Macbeth, Rei Lear, ou mesmo a reconstrução/desconstrução heroica de um Beowulf, ao perceber como a violência pode se tornar justificável.

Na descrição do filme, há um trecho que me chamou muita a atenção:

“Toda culpa exige um espelho.

Toda máscara um castigo.

Em Represália, o inimigo é o reflexo.”

Ao se propor esse olhar virado para dentro, esse reflexo, que leva à reflexão da existência dos personagens, pensa-se em Cronos, papel de Marcus Tardin, que busca vingança. De um homem pacato, amoroso, feliz por um noivado que acaba não se concretizando pela morte violenta de sua noiva, há o nascimento abrupto de um homem com sede de sangue, ardiloso, vil, capaz de mudar as regras de acordos com os próprios comparsas só para poder atender sua sede pérfida e dantesca. A cena de  Cronos (Tardin) com a arma empunhada para o rosto do Deputado Eduardo Medeiros,  interpretado por Mathias José, outro nome que imprime ainda mais força à obra, é puro frenesi. A catarse é fenomenal. Não há um ator fora do timing. Fantástico. Inclusive, a cena em flashback do Deputado em uma festa privada com direito às ânsias de felicidade instrumentalizadas pelo poder é um deleite a parte. Mathias José rouba a cena. Hipocrisia e poder estão ali validados em todas as atuações e peculiaridades.

Aos companheiros que buscam fugir das obviedades artísticas que tanto inundam salas e streamings por aí, Represália é obra autoral e independente que precisa ser reverenciada. Agradecimentos em especial ao diretor Rodolfo Medeiros, que capitaneou o projeto e ainda faz uma aparição especial.

Vale a pena.

 

ENTREVISTA

 

Tivemos a oportunidade de conversar com Marcus Tardin sobre o longa. Confira abaixo a entrevista exclusiva!

1- Seu personagem carrega o nome de uma divindade ligada ao tempo e à culpa. Como você trabalhou essa dimensão simbólica na construção da psicologia do personagem? Houve algum exercício específico para incorporar essa ideia de “peso do tempo” nas falas, gestos ou silêncios?

– Não foquei na dimensão simbólica, mitológica, embora ela estivesse presente; mas nos conflitos profundos de um homem que perde o sentido de viver. Questões humanas que expõe o vazio, dor insuportável, ausência de propósito, realidade muito distante da minha, mas que me trouxe a densidade proposta pela narrativa, o peso natural da desestruturação interna. Um nível de avaria emocional que devasta a condição psíquica, destruindo valores primários como empatia, compaixão, reduzindo o ser a condição primitiva, animalesca. O peso do tempo, a culpa, impotência, foi deteriorando a razão, construindo obsessão absoluta. Busquei na preparação conteúdos ligados a mente humana, disfunções emocionais, psíquicas, estudei cada nuance do roteiro e na hora do ação deixei fluir o que tinha nutrido, buscando expressar de forma intuitiva, viva, toda complexidade que o personagem exigia.

 

 

2- “Represália” mistura elementos de tragédia grega com um contexto brasileiro contemporâneo. Como foi equilibrar essa dualidade na interpretação — evitando cair no exagero teatral, mas mantendo a aura ritualística que o filme propõe?

– A mitologia grega tem na essência conflitos do homem com seu “eu”, a existência e a relação com forças invisíveis; questões que nos inquietam desde sempre, que iremos levar até o fim dos nossos dias. Ainda vivemos os mesmos embates, dilemas, dores, contradições. A contemporaneidade só reafirma essas questões em outros contextos, e a arte vem lançar luz sobre essas sombras. Ao interiorizar essa persona densa, sombria, senti que os silêncios, a erupção interna desse “vulcão” deveria ser domada, um exercício presente em toda filmagem. Conter emoções em ebulição deixando transbordar no olhar, no corpo, na energia em cada plano foi o objetivo; o que desconhecemos sobre nós, o divino, a existência, naturalmente traz atmosfera sagrada, ritualística, somos seres indecifráveis e isso é mágico.

 

3- Grande parte da trama se passa em um espaço fechado, sob cerco, com personagens revelando segredos e feridas. Que desafios isso trouxe para você como ator em termos de energia, ritmo e interação com os outros reféns e sequestradores? Alguma cena foi particularmente intensa ou transformadora para você?

– Ao vivermos em situações extremas nos transformamos, enxergamos a vida por outras perspectivas, e a arte tem essa magia, de nos proporcionar como atores vivências inesperadas. Meu principal desafio foi manter a pulsação dessa “persona” mesmo quando vinha o “corta”, me mantendo concentrado mesmo fora do set, sem “levar o personagem pra casa”, mas atento aos movimentos internos dele, como um fluxo contínuo de ação. Durante os primeiros dez dias de filmagens (Itaipava/serra do Rio), ficamos confinados na casa que era locação, na proposta de manter o foco no processo; busquei ao máximo estar atento ao “não esvaziamento” da construção até ali, para entrega se manter potente. Claro que me distanciava emocionalmente na troca com colegas fora do ação, mas sem deixar de olhar para o que estava pulsando na construção artística. A cena mais intensa foi o “embate final” entre meu personagem e sua vítima, trazer a verdade sobre decidir executar alguém é muito profundo; expurgar a dor com alívio da execução é complexo, mesmo na arte, pois o caminho é sempre viver de verdade, não tem como passar por uma experiência dessas e não sair mexido, transformado e eu fui. Olhar pra nossa “espécie” de outra forma, percebendo a redenção na morte foi muito forte. Acredito que seja a grande benção do nosso ofício, nos permitirmos viver a humanidade em condições extremas, inimagináveis, reveladoras, mesmo que a razão não compreenda.

 

Confira aqui algumas imagens da pré estréia

MAIS SOBRE O FILME

“Represália” é um projeto independente, rodado em formato de cooperativa na pandemia, protagonizado pelo ator Marcus Tardin, que também assina a co-produção e chega com o propósito de circular por festivais e mostras pelo país no ano de 2026.

Aborda questões urgentes como deterioração da moral, abuso de poder, colapso psicológico que leva a erupção social, esse é o tema central da obra que tem como propósito debater a destruição dos valores humanos e o mito moderno da redenção. Tendo o ator  Marcus Tardin como protagonista _ (Thiago/Cronos), um homem cego no seu objetivo, disposto a tudo por uma vingança, evidenciamos a falência de questões fundamentais que sustentam a linha tênue entre sanidade x loucura. O filme tem no elenco nomes como Douglas Sampaio, Natália Ferrari, Mathias José, Krisley Castro e outros. O roteiro é de João Faria e a direção de Rodolfo Medeiros.

 

SINOPSE

Durante um almoço beneficente que reúne a elite política e social de uma cidade, um grupo
de criminosos mascarados invade o evento e transforma o local em um campo de guerra
moral.
À frente da ação está Cronos, um líder meticuloso que parece conhecer os segredos mais
sombrios dos reféns — entre eles, o deputado Eduardo Medeiros, homem de imagem
pública exemplar, mas de passado turvo.
À medida que o cerco se intensifica, os reféns e os sequestradores revelam suas feridas e
ambições. O que começa como um crime se transforma num ritual de vingança e exposição,
em que culpa, poder e tempo se misturam.
Represália é uma fábula sombria sobre o colapso da moral pública, a decadência das
imagens e o mito moderno da redenção.

Toda culpa exige um espelho.
Toda máscara um castigo.
Em Represália, o inimigo é o reflexo

 

FICHA TÉCNICA

  • Direção: Rodolfo Medeiros
  • Roteiro: João Faria
  • Elenco: Marcus Tardin, Douglas Sampaio, Mathias José, Krisley Castro, Matheus Borges e grande elenco.

 

REDES SOCIAIS

@represalia.ofilme

@mtproducoesrj

@marcustardin

 

 

 

Author

Professor e escritor. Lançou em 2013 seu primeiro romance, A Árvore que Chora Milagres, pela editora Multifoco. Participou do grupo literário Bagatelas, responsável por uma revolução na internet na primeira década do século XXI, e das oficinas literárias de Antônio Torres na UERJ, com quem aprendeu a arte de “rabiscar papel”. Criou junto com amigos da faculdade o Trema Literatura. Tem como prática cotidiana escrever uma página e ler dez. Pai de 3 filhos, convicto carioca suburbano bibliófilo residente em Jacarepaguá. Um subúrbio de samba, blues e Heavy Metal. Foi primeiro do desenho e agora é das palavras, com as quais gosta de pintar histórias.

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