LÍNGUAS: O mais recente livro do fenômeno literário italiano Domenico Starnone

 

Estou muito longe de ser uma especialista, mas sei que, quando se fala da literatura italiana contemporânea, o primeiro nome que costuma surgir é o de Elena Ferrante. Até onde eu sei, a fama é justa. Eu, particularmente, nunca tive grande interesse nos livros dela e, portanto, não os li. Aliás, para ser totalmente sincera, mais de uma vez flertei com a ideia de ler A Vida Mentirosa dos Adultos, mas até hoje isso não se concretizou.

O outro nome relevante é o de Domenico Starnone. Esse eu já queria ler faz tempo. Sinopses, resumos e comentários sobre o livro Laços já haviam me seduzido levemente (ainda lerei!). No entanto, até realmente ter contato com sua literatura, eu não tinha lá muita certeza se a fama do autor se relacionava ao seu talento como escritor ou a todo o mistério/polêmica envolvendo a identidade oculta da própria Elena Ferrante — uma vez que há um boato de que Starnone e Ferrante seriam um casal ou, até mesmo, a mesma pessoa. Enfim… polêmicas à parte, cá estou para falar de Línguas, de Domenico Starnone.

Ao ler Línguas, lembrei-me de uma frase atribuída a Massimo d’Azeglio, político italiano do final do século XIX:

“Fizemos a Itália, agora temos que fazer os italianos.”

Em meio ao conturbado processo de unificação da Itália, a frase refletia a ausência de uma unidade nacional em tempos de nacionalismo. Esse, no entanto, não é um livro de História. Aqui, o autor nos apresenta um rapaz e suas histórias de infância, sua relação com a avó — que não dominava o italiano em sua norma culta, por assim dizer — e memórias distorcidas pelo tempo. Livro curtinho, ambientado na região de Nápoles, que explora a diversidade linguística do que a gente chama de italiano. A existência de tantas variações linguísticas na Itália remonta ao seu processo de formação como Estado moderno. E, nesse livro, Starnone nos apresenta uma narrativa que atesta a ideia de que a língua é um signo de poder, de diferenciação, de autoridade.

O autor, muito claramente, quer nos colocar naquele ambiente; ele nos convida a mergulhar nas distinções linguísticas e, sobretudo, fonéticas do(s) italiano(s). Sem didatismos em excesso. Trata-se apenas de um convite (que eu julguei irrecusável). Este é um livro sobre Nápoles, sobre a Itália, sobre os italianos. No entanto, me pareceu impossível não estabelecer paralelos com a situação de imigrantes que são lidos pelos locais como menos capazes ou menos inteligentes por não terem o domínio da língua do país onde estão, ou apenas pelo sotaque estrangeiro muito evidente. Contudo, em Línguas, há algo ainda mais profundo, porque ali todos os personagens são nativos, marcados pela questão dos dialetos — que se apresentam como marcas de distinção de classe.

Sobre o livro:

  • Título: “Línguas”
  • Autor: Domenico Starnone
  • Editora: Todavia /TAG Livros
  • Ano: 2024
  • Páginas: 144

 

TAIS BRITO

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Author

Eu me chamo Tais Brito, sou professora de história e tenho um doutorado nessa mesma área. Sendo uma pessoa inquieta e extremamente curiosa, os livros me permitem ir a todos os lugares e conhecer todo o tipo de coisas. Nas horas vagas, eu gosto de falar sobre esporte, viagens e, claro, literatura.

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