Em Outras urbanas, o escritor Jorge Ventura, no auge de sua maturidade poética, trata da relação do homem consigo mesmo e com a sociedade que o cerca nas grandes cidades. Os poemas jogam luz sobre o que há de mais prazeroso, alucinante e, ao mesmo tempo, caótico e decadente nos centros urbanos.
A característica primordial desta obra está na junção do signo verbal ao icônico (desenhos, fotos, imagens, alternância do preto e branco no fundo da página e/ou na mancha do texto), num belo projeto editorial da Ventura Editora, com execução/montagem do designer Gustavo Gama e desenhos de Val Mello, fazendo o leitor transitar entre o poético e a realidade.
O lançamento de Outras urbanas vai acontecer no dia 10 de julho (segunda-feira), no Bar/ Restaurante Ernesto, Rua da Lapa, 41 – Centro/RJ, das 18h às 21h30, durante o evento Te Encontro na APPERJ.
CONVITE À REFLEXÃO
por César Manzolillo
“Quando as estrelas começarem a cair, me diz, me diz pra onde é que a gente vai fugir?” – Renato Russo
Penso que qualquer manifestação artística deve ser realizada da forma mais livre possível, sem amarras ou regras rígidas. Apesar disso, no que diz respeito a coletâneas literárias (reunião de contos ou de poemas, por exemplo), julgo que a proposta se torna mais satisfatória quando o autor, mais do que uma junção pura e simples (muitas vezes aleatória) de textos, decide pôr sua capacidade criativa a serviço de um projeto. Em outras palavras, os textos que compõem a publicação dialogam entre si, formando um conjunto coeso e harmônico.
Essa é claramente a opção de Jorge Ventura, que agora nos traz este belo Outras urbanas. Aqui, os poemas apresentam temática urbana, e as máculas da cidade recebem um olhar poético. Ventura é autor de múltiplos recursos, dono de uma sólida obra poética, enriquecida agora com este título que você tem nas mãos. (…)
(…) Com este livro, Jorge Ventura oferece ao leitor, além do deleite estético, a possibilidade de reflexão, algo fundamental na vida de qualquer ser humano. Assim, sugiro que você avance logo algumas páginas e comece a leitura, deixando-se impregnar pelo talento impermisto contido neste necessário Outras urbanas.
OUTRAS URBANAS /OUTRAS VISÕES
por Adriano Espínola
Quando Baudelaire cruza com uma majestosa mulher, em uma rua agitada de Paris, certo de que nunca mais tornará a vê-la, ou quando avista uma esplêndida carniça em uma esquina ou, ainda, quando nos fala da perda da sua aura de poeta sublime no lamaçal da rua, está, com essas peças, sugerindo um novo espaço do acontecimento poético: o espaço da grande cidade. Diferentemente do locus romântico, que instava o poeta a refugiar-se na natureza e a cantá-la, certo de que ali poderia fundir e aplacar a sua subjetividade atormentada, o seu Eu nostálgico em busca do absoluto, o autor de As flores do mal (1857) vai surpreender na cidade uma nova e insuspeitada beleza, “metade transitória, metade eterna”. A beleza da própria modernidade. (…)
Jorge Ventura é um desses poetas que faz avançar, já no século 21, essa incontornável linha temática da poesia moderna, como podemos atestar neste seu novo livro, Outras urbanas. O próprio título parece-nos sugerir a consciência dessa retomada, como se dissesse que agora surgem “outras (poesias) urbanas”, a partir da significação verbal-poética associada à representação gráfico-visual, perfazendo, ao longo do volume, uma “via de mão dupla”. (…)
Mas aqui o desafio maior está mesmo em expressar poeticamente a dura realidade humana e social da cidade – da cidade do Rio de Janeiro, onde nasceu e vive o poeta –, com seus problemas, medos, violências, injustiças e ameaças que cercam o dia a dia dos habitantes da outrora “cidade maravilhosa”. E isso o autor o faz de forma precisa, ao denunciar o processo de desumanização dos espaços e de seus viventes, nas quatro partes do livro (“Gente”, “Bichos”, “Ruas” e “Caos”), mas também, aqui e ali, pontuando-o com a voz lírico-existencial (“sou criança/no azul pátrio/das manhãs/marginais”) e amorosa (“a musa, a música, o bom vinho/à noite, todo sonho é bem-vindo” (…)
Considerando a unidade temática voltada para a cidade e o ousado projeto gráfico-visual, podemos afirmar que, com Outras urbanas, Jorge Ventura logra realizar, na contemporaneidade, um dos mais criativos e instigantes livros de poesia, dando continuidade à estética dissonante dos poetas modernos, inaugurada por Charles Baudelaire.
O ArteCult aproveitou o lançamento de Outras urbanas para conversar com o autor sobre o livro e outros temas também:
ArteCult: Na sua opinião, que lugar a poesia ocupa nos dias de hoje?
Jorge Ventura: Tenho a premissa de que a poesia é capaz de transformar realidades adversas. Historicamente, ela sempre cumpriu sua função para além da literatura. Encontramos poesia no dia a dia, no transbordar de inúmeras emoções, desde a declaração de amor, o encantamento da natureza, passando pelo medo, a angústia, a fome, a miséria, o abandono das grandes cidades, a solidão humana até a denúncia, a crítica social e o posicionamento ideológico. Porém, nesse período de pós-pandemia, acredito eu, a poesia vem sendo a certificação de nossa sobrevivência à dor maior coletiva e, com efeito, o brado de nossa louvação à vida.
AC: Além de poeta, você também é editor e ativista cultural. Como consegue se dividir entre tantas atividades?
JV: Há quem me chame de multifacetado ou de workaholic, mas me considero um profissional sedento por realizações. Reconheço minha vocação e, principalmente, minha determinação quando assumo múltiplas funções ligadas à arte e à cultura. Não me vejo, entretanto, como uma pessoa especial, apenas responsável e obstinada a fazer o melhor de mim. É preciso muita disciplina, garra e senso de organização – costumo brincar – para acompanhar meu ritmo.
AC: Outras urbanas, sua obra mais recente, será lançada no dia 10 de julho. Poderia nos falar um pouco sobre o livro?
JV: Esta obra estava prevista para ser lançada em 2020, antes do início da pandemia no Brasil. Houve, por certo, ajustes de lá para cá, principalmente em razão das vítimas da covid-19. Dois poemas foram inseridos e se referem, literalmente, a esse período triste e conturbado. A construção do livro, no entanto, levou alguns anos para ser amadurecida e textos foram revisitados e atualizados. Prefiro não me restringir a temas, mas contextualizar cada obra que publico. Não se trata apenas de um conjunto de poemas dedicados às urbes. O que define a unidade temática de Outras urbanas é a relação do homem consigo mesmo e com a sociedade que o cerca nas grandes cidades. Meu sujeito poético é um habitante amargurado e reflexivo, que tenta jogar luz sobre o que há de mais prazeroso, alucinante e, ao mesmo tempo, caótico e decadente nos centros urbanos.
AC: A sua visão distópica com relação às grandes cidades, apresentada em Outras urbanas, revela um poeta preocupado com o futuro da humanidade?
JV: Certamente. E isso é o que vem me angustiando a cada dia. A humanidade é a responsável por isso tudo. Falaram tanto que, após a pandemia, as pessoas iriam ficar “melhores”. Ledo engano. Ao contrário, minha opinião é que elas, em sua maioria, pioraram. Atualmente, vejo mais deslealdade, ambição, inveja, ingratidão e muita soberba em torno da fogueira das vaidades. Como diria Álvaro de Campos, (…) “Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo. (…) Arre, estou farto de semideuses!” Posso estar e quero estar enganado, mas, se esse cenário não mudar, nosso fim está próximo.
AC: Planos futuros: o que vem por aí nos próximos meses?
JV: A princípio, devo me dedicar à realização de mais lançamentos do livro em diversas cidades e capitais pelo Brasil afora. Mas acredito que, até o final deste ano, eu comece a pôr em prática outro projeto editorial, com previsão de lançamento para meados de 2024. Dessa vez, a unidade temática não será “amarga” como em Outras urbanas, e retomarei meus versos mais oníricos e surrealistas.
Confira a live que realizamos com o autor no último dia 04/07 :
SERVIÇO
Lançamento de Outras urbanas
- Onde: Bar/Restaurante Ernesto. Rua da Lapa, 41 – Centro/RJ
- Quando: dia 10 de julho (segunda-feira), das 18h às 21h30
Sobre Jorge Ventura
Jorge Ventura é escritor, roteirista, editor, ator, jornalista e publicitário. Tem pós-graduação em Marketing e Didática do Ensino Superior. Possui dez livros publicados e participação em dezenas de coletâneas e antologias nacionais e estrangeiras. É presidente da APPERJ (Associação Profissional de Poetas no Estado do Rio de Janeiro), vice-presidente da ABLAP (Academia Brasileira de Letras e Artes pela Paz), titular do Pen Clube do Brasil, membro diretor da UBE–RJ (União Brasileira de Escritores) e um dos integrantes do grupo Poesia Simplesmente. Recebeu diversos prêmios, em nível nacional e internacional, como autor e intérprete. Tem poemas vertidos para o inglês, o francês, o espanhol, o italiano e o grego. É sócio-proprietário da Ventura Editora e da Editora Iniciatta.
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