art. RESTAURANTE : um PF com toque de chef – e muito carinho. Confira a entrevista com o chef Márcio Cabral

Como contei no artigo anterior, antes de chegar a Sampa, vindo do Rio de Janeiro, fiz um desvio na rota pra passar no município paulista de Mogi das Cruzes,  localizado na Região Metropolitana de São Paulo e Alto Tietê para conhecer o art. RESTAURANTE (@art.restaura). Três das principais estradas do Estado de São Paulo dão acesso a Mogi das Cruzes. A principal delas é a Rodovia Ayrton Senna (SP-70), que passa pelo município, onde há um trevo de ligação com a Mogi-Dutra (SP-88). Outra opção para quem vem de São Paulo, Vale do Paraíba ou Rio de Janeiro é a Rodovia Presidente Dutra (BR-116), que passa pela cidade vizinha de Arujá e tem acesso direto também pela Mogi-Dutra. Outra opção é a Rodovia Rio-Santos (SP-55). Neste caso, o acesso à cidade é feito em Bertioga, por meio da Rodovia Mogi-Bertioga (SP-98).

Chegamos, e à primeira vista temos como cenário uma aconchegante casa de interior, na cor verde, que nos abraça e convida a entrar. Eu soube, pelo próprio Márcio Cabral, que ele e o Lourenço colocaram, literalmente, a mão na massa e, desse esforço, o resultado não poderia ser outro, né? Um lugar bastante agradável, com cheirinho de comida boa…

O Márcio foi o campeão da edição 26 do JOGO DE PANELAS, que aconteceu em Florianópolis, com o tema “Commedia Dell´Arte“. Na época, como entrada ele serviu um jardim de agrião sobre uma fatia de pão, acompanhado de flores comestíveis e pérolas de aceto balsâmico; como prato principal, ele fez uma polenta com frango; e, como sobremesa, um pudim com calda de frutas vermelhas.

Logo na entrada do restaurante, a gente se depara, lá no alto de um armário, com o troféu que ele ganhou.

O ambiente interno é muito bonito, com diversos itens que remetem ao teatro e a arte em geral. Cores de paletas tranquilas trazem uma sensação de abraço. A gente se sente em casa…

Vale lembrar que o Márcio, depois de sua vitória no JOGO DE PANELAS, se aventurou também pelo MASTERCHEF, na sua 8ª edição. E olha que ele foi bem. Aos poucos, quando se viu, estava entre o top 10, mas por uma reviravolta inesperada, acabou saindo da disputa. Mas é fato que ter participado de um reality tão significativo no segmento já lhe serviu como grande trampolim para voos maiores.

Mas por que estou falando tanto? Acho que vou deixar ele mesmo contar…

 

ENTREVISTA COM MÁRCIO CABRAL

Você era um homem de teatro, não? Conte um pouco da sua história antes de se aventurar pelo mundo da gastronomia.

Teatro, gastronomia. Eu sempre fui uma pessoa da arte. Meu maior desenvolvimento na arte foi no teatro. Aí eu me formei em arte dramática, cursos paralelos, depois me formei em artes cênicas, tenho pós em dramaturgia, dei aula na Universidade Federal de Santa Catarina de direção de arte, direção. E eu acho que o teatro tem muito a ver com o restaurante assim. Todo dia é um evento novo, a gente sempre tá… é uma arte viva, né? Quando a gente cozinha é uma arte viva, aquilo vai ser servido de imediato. Uma grande diferença é que o produto da arte culinária é a comida que a gente come, né? O teatro a gente pensa. A gente sente, mas o próprio teatro, num período, fez com que eu cozinhasse, assim. Durante uma época, eu me formei pelo Indac, a coordenação do Antunes Filho, era uma escola particular, eu ganhei uma bolsa integral, tal, era um momento meio difícil na minha vida, e eu fazia bolos pra vender, eu vendia bolos no ônibus, na rua, pra conseguir cursar e me dedicar completamente. Então, pra mim, todo dia é como se fosse um espetáculo. E o restaurante também tem um pouco a ver com o teatro, porque envolve várias coisas, são várias artes envolvidas em uma só. E a gastronomia, de certa maneira, é desde o ambiente, que é o cenário. Desde o produto, a comida, a aparência dela, a direção de arte, o sabor, o conteúdo dela. E então foi um processo que me levou, sem eu perceber. Eu acho que as coisas que mais têm a ver a gastronomia e o teatro é a comunhão de um grupo em função da arte.

Qual suas lembranças com a cozinha? Alguém serviu de inspiração?

Cozinha na minha casa era sinônimo de festa, né? Eu me lembro que toda vez que reuni todo mundo era festa, comemoração. Está na palavra, né? Comemoração. E eu acho que esse ato de se alimentar pra ele pode ser uma comemoração diária. Principalmente num mundo com tanta desigualdade, com tanta gente sem condições de comer, você ter a oportunidade de ir num lugar, se alimentar bem,  uma comida gostosa, com visual legal, é uma dádiva, é um presente. Mas várias pessoas me inspiraram na cozinha. Eu venho de uma família que tem uma coisa muito importante. Uma ligação forte com o interior, fogão a lenha desde criança. Havia uma tia que tinha um sítio que a gente passava temporadas lá, sempre em volta do fogão a lenha. Acho que a grande inspiração de infância vem das mulheres da minha família, não tem exatamente uma pessoa. Depois de um tempo, mais à frente, eu me inspirei muito no Anthony Bourdain. Me identifico muito com o despachado que ele é, com a boca suja que ele tinha e com esse segundo movimento da vida dele, que era de desconstruir uma glamorização na comida. Mesmo falecido, onde quer que ele esteja, no céu, no inferno, ou queimando sua barriga num fogão…

Como foi sua experiência nos programas JOGO DE PANELAS e MASTERCHEF? Em que eles contribuíram para a formação do profissional que você se tornou hoje?

Cozinhar é como pilotar avião, são horas de voo, né? Quanto mais tempo de cozinha, mais a pessoa sabe. Então, eu sempre cozinhei, quem me levou muito para a cozinha foram meus filhos, eu sempre cozinhei para os meus filhos. Três filhos, e aí eu tinha que cozinhar para esses marmanjos e eu gostava de fazer isso. Então, toda festinha que tinha, era eu quem cozinhava. E todo mundo falava para mim: ah, você tem que participar do Masterchef, do Jogo de Panelas. E a gente sabe que o Jogo de Panelas é um reality gringo, né? Antes de o programa  Mais Você da Rede Globo comprar os direitos do formato, eu via ele, eu achava muito interessante essa coisa do não profissional e sim do amador, no sentido literal da palavra, de receber as pessoas e cozinhar, né?  E aí, num momento ímpar da vida, eu vi o anúncio que ia rolar em Florianópolis, onde eu morava. Fiz a inscrição, rolou  e foi fundamental. As conversas que eu tive ali e o incentivo da Ana Maria Braga, as palavras do chef Jaime Barcelos que se emocionou quando experimentou meu prato, foram os momentos mais gratificantes da minha vida. E aí pandemia, naquele processo de pandemia acabou rolando também o MasterChef, numa edição bem sui generis, né? Tinha pessoas diversas, ex-participantes, a maioria, pessoal que já conhecia, e o reality foi fundamental também pro meu auto reconhecimento, pra eu me reconhecer enquanto chef de cozinha. E um gatilho para eu me arriscar nessa área. Eu já pensava, sempre pensei, eu e o Lourenço, meu marido e sócio, a gente sempre pensava, principalmente porque a arte é um ganho sazonal, sempre pensava em ter um restaurante. Então o Masterchef deu uma chancelada para que eu me assumisse enquanto cozinheiro.

Como surgiu a ideia do art. restaurante? Qual o conceito que você quer trazer?

Aí eu já fui emendando a ideia de montar o art. A gente veio para São Paulo, passamos a pandemia em São Paulo, eu vim para fazer outra pós, para continuar na área acadêmica, mas aí rolou o MasterChef. De início, era uma brincadeira: primeiro, eu vou entrar no MasterChef, ganhar o MasterChef, pegar essa grana e montar um restaurante.  Embora não tivesse ganhado o programa, eu me senti um vencedor, e aí ninguém pode falar  que você é um perdedor. A gente olhou um para o outro e falou: é isso aí, vamos montar um restaurante, vamos montar devagar, vamos fazer uma coisa caseira. Seguir os passos do que realmente foi a história de um bistrô – uma família que abria a sua sala no momento pós-guerra, servindo o que tinha no mercado, com prato do dia. A gente só não quis dar esse nome, porque há uma glamourização em torno da palavra “bistrô” , que  perdeu toda a essência da simplicidade. Então, o art. veio daí, da ideia de fazer esse restaurante com comida afetiva, um confort food, um espaço aconchegante, um espaço doméstico e um espaço que você se sinta bem. E aí, estamos aqui.

O cardápio do restaurante é fixo? Como foi o processo de desenvolvimento?

O cardápio é baseado nessa questão que eu falei do bistrô, quer dizer, qual é o prato sazonal. Hoje em dia, nós trabalhamos com cardápio na segunda, terça, quarta, quinta, sexta e sábado. Isso era uma coisa antiga da minha infância, que havia nos botecos. Em São Paulo, eu posso falar porque eu cresci em São Paulo,  a gente tinha o dia do virado à paulista, tinha o dia do peixe, tinha o dia do…  O prato do dia, durante a semana, nunca era o mesmo. Mas isso era antigamente. Então a gente se baseou nesse revival, nessa tradição também da comida de boteco, sabe? É muito louco, porque hoje a gente fala comida de boteco e a gente pensa no torresmo, no torresminho. E o boteco em São Paulo servia almoço, o prato feito. Então a gente faz um P.F. como a gente chama, com um toque de chef,  lembrando que antes de mais nada, para ser chef,  você tem que ser cozinheiro. Chef é uma posição na cozinha, não exatamente um fazer. Então a gente sempre trabalha com proteínas ou opção vegetariana. Temos um cardápios de segunda,  terça é outro, quarta é outro, quinta é outro, sexta é outro e sábado um outro ainda e a gente, de vez em quando, vai mudando alguns pratos, mas eles são fixos durante a semana. Isso também faz com que você tenha que vir vários dias, durante a semana, para comer tudo.

Quais os planos para o restaurante? Alguma novidade a vista?

Nosso plano principal é abrir para o jantar. O plano do futuro do art. é abrir para o jantar. Então, o jantar vai ter uma pegada diferente, aí vai ser sim, um cardápio fixo. Mas a gente sempre vai trabalhar soft opening, né? Work in progress, sempre mudando, assim. Porque essa é uma característica do art., é a característica de comer na casa da mãe, comer na casa do pai. O que tem para comer é o prato do dia. E, à noite, a gente vai fazer uma pegada um pouco diferente. Fechar cada vez mais, ter um time cada vez mais completo na cozinha. Hoje, nós trabalhamos em nove pessoas, começamos em duas pessoas. O Tomé, meu filho mais velho, deu uma força louca, a gente abriu. Hoje está o Thiago. Um outro filho aqui também trampando com a gente . Mas são um ano e meio assim, de uma grande batalha, servindo cada vez melhor.

Afinal, quem é Márcio Cabral?

Essa daí é uma pergunta profunda, eu ainda não respondi até hoje, depois de anos de terapia. Eu ainda não sei. Eu posso dizer que o Márcio é um multitarefas, curioso pra caramba.

O restaurante estava (muito) cheio, o que é sempre um bom indicativo. Esse dia estava bem especial, porque além de conhecer o restaurante, ainda tive o prazer de rever o amigo Willian Simon (@williansimonoficial), que participou da edição 21 do Jogo de Panelas e da primeira edição do reality A Grande Conquista, que saiu lá da sua barbearia (@chaplinbarbearia), que fica em São Paulo, na Avenida Zelina, 456, só pra estar com a gente.

Era uma quinta feira e, segundo o cardápio afixado na parede, teríamos polenta à bolonhesa, parmeggiana de filé mignon/frango/berinjela, creme brulée de cumaru, brigadeirão meio-amargo e sorvete-mousse de chocolate. Como ele mesmo disse, cada dia da semana é um prato diferente. Vamos experimentar tudo então, né?

Pra começar, Márcio nos mandou uma saladinha. Simples, mas muito saborosa. No ponto certo pra preparar as papilas gustativas pra festa que ia começar…

Eu pedi a polenta à bolonhesa. Chegou à mesa um prato lindo e, no sabor, perfeitamente temperado. O Jacquin não poderia, de forma alguma, reclamar do “tômpero”. Ah, vale dizer que eu comeria em quantidades absurdas!

Minha filha partiu para a parmegianna de filé mignon. Ao experimentar, deduzi que as demais versões, de frango e berinjela, estariam no mesmo nível de excelência. Disse, no artigo anterior, que não era um crítico gastronômico e que me absteria, por enquanto, de emitir opiniões, limitando-me a registrar apenas minhas aventuras gastronômicas. Mas o art. RESTAURANTE me fez “queimar a língua”, na medida em que irei recomendar, fortemente, a experiência. Vale a pena! E muito!

Gentilmente, o Márcio mandou pra nossa mesa as três sobremesas do dia, para que pudéssemos experimentar. E eu acho que as imagens, por vezes, dizem muito mais do que as palavras…

Foi um dia pra lá de especial! Comida boa, encontro com amigos. Foi uma grata experiência, daquelas que a gente sempre espera repetir. Essa será, com toda a certeza, uma parada obrigatória toda vez que for pra São Paulo ou estiver passando por perto.

O art. RESTAURANTE há de ter vida longa! Afinal, ainda tenho que experimentar todos os outros pratos do cardápio…

E pra você que curtiu, que achou interessante e pensa em vir para ter uma deliciosa experiência gastronômica, segue abaixo o endereço. E saiba, de antemão: você irá se apaixonar…

art.RESTAURANTE – Rua Júlio Prestes, 192 – Centro, Mogi das Cruzes – SP, 08780-110

 

 

 

DEL SCHIMMELPFENG

@del.schimmelpfeng

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Author

Del Schimmelpfeng é Analista Judiciário do TJERJ, mas desde que se lembra - e coloca tempo nisso! - ama cozinhar! Apesar de ter feito as faculdades de arquitetura e direito, é se misturando aos pratos, panelas e temperos que se sente inteiro, completo, pleno. É autodidata, nunca fez curso de culinária, tampouco se imaginou um profissional da área. Considera-se apenas um curioso, que procura o conhecimento em tudo e que tenta, de todo jeito, viver da melhor forma possível - apesar de todas as dificuldades. Afinal, não haveria graça se elas não existissem... Participou da seletiva da segunda edição do Masterchef e da décima nona edição do reality "Jogo de Panelas", apresentado por Ana Maria Braga no programa "Mais Você" da Rede Globo, na qual sagrou-se campeão. Possui, ainda, textos publicados em livros de conto e poesia. Blog: http://delschimmelpfeng.blogspot.com Instagram: @del.schimmelpfeng

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *