AC RETRÔ: Dos sonhos das crianças sessentistas e setentistas, quem se lembra?

 

Nove entre dez crianças nascidas nos anos 1960/1970 tinham um sonho de consumo: ganharem de Natal uma bicicleta. Fosse uma Monark ou Caloi, as marcas concorrentes da época. Eu tive uma Monark e acabei ganhando, ao longo tempo, mais umas três ou quatro de modelos e tamanhos diferentes, de acordo com minha crescente estatura e rendimento na escola. Eu explico. A maioria dos pais, como forma de incentivar os filhos a estudarem e a tirarem uma boa nota nas provas de português e matemática, adorava prometer o referido presente, caso passássemos de ano, como um aluno exemplar.

Entretanto, se o resultado fosse negativo, ficávamos de castigo por um longo período e ainda éramos punidos: os brinquedos ficavam trancados dentro do armário e não podíamos mais assistir aos desenhos e aos seriados que passavam na TV. Uma vez, meu pai chegou a ameaçar retirar a válvula do televisor em preto em branco só porque eu não estava me dando bem nas aulas. Conclusão: fiquei de castigo, proibido de sair à rua para brincar com os amigos e jogar bola.

Apenas uma curiosidade, os aparelhos de televisão eram imensos, acoplados a móveis que ocupavam um bom espaço na sala e, por trás deles, havia um protuberante tubo de imagem, perigoso, diziam. Uma das marcas mais conhecidas era a Colorado RQ. Só fui entender o que significava RQ (Reserva de Qualidade), quando já estava crescidinho, um pré-adolescente, ao ler em um anúncio de revista.

Era assim que acontecia nas famílias de classe média. Ou a criança estudava e passava no ano letivo ou nada de presentes no Natal! Ao comentar sobre o sonho de ganhar uma bicicleta, eu quis me referir à meninada que já tinha usufruído de outros brinquedos sobre rodas ou rodinhas, tais como o velocípede, o carro e a charrete de pedalinhos, o patinete e o par de patins. O skate já existia nesse período, mas só virou moda um pouco depois, com a chegada do Velotrol e das motocas motorizadas.

 

 

Havia também outros itens icônicos dessa geração. As meninas curtiam bastante a boneca brasileira Susi, lançada em 1966, pela fabricante Estrela, sendo uma das pioneiras no gênero fashion doll. Segundo especialistas, Susi foi inspirada nas bonecas estrangeiras Tammy (EUA) e Sindy (Inglaterra).

 

Boneca Susi com olhos Pintados lançada pela Marca Brinquedos Estrela em 1966. Foto: Blog de Ana Caldatto

 

A famosa Barbie, embora criada em 1959, que se tornou um sucesso mundial e até hoje é um símbolo da cultura pop, atraindo crianças e adultos, somente chegou ao Brasil em 1982, pela própria Estrela, ao conquistar o licenciamento da Mattel. Em razão disso, a Susi parou de ser fabricada por 12 anos, sendo relançada em 1997. As pequeninas Fofoletes, bonecas com roupinhas coloridas e variadas, que vinham dentro de caixinhas parecidas com as de fósforos, começaram a fazer história nos anos 1970 e atingiram o auge nos anos 1980.

 

Enquanto isso, os meninos, influenciados pelos seriados de heróis vindos de outros planetas, preferiam brincar com os robôs e naves espaciais feitos de latão, movidos a pilha, que se movimentavam e acendiam luzes como se soltassem raios poderosos.

 

 

Contudo, a unanimidade entre os guris era o Forte Apache. Mais uma influência dos seriados televisivos, como Rin Tin Tin, Daniel Boone e Roy Rogers, e de filmes de faroeste estrelados por John Wayne. O mais bacana Forte Apache, item raro para os colecionadores, foi o fabricado pela Indústria Casablanca, na cidade de São Caetano do Sul (SP), que se transformaria, em 1969, na Gulliver Manufatura de Brinquedos.

Para quem não sabe a origem desse nome, os filhos do espanhol Mariano Lavin Ortiz, dono da empresa, eram fascinados pelas viagens fantásticas narradas no romance de Jonathan Swift, As Aventuras de Gulliver. Assim como o protagonista de Swift saiu do seu país e foi parar em Lilliput – uma ilha habitada por homens pequeninos – em março de 1959, Mariano e seus filhos chegaram ao Brasil e também encontraram uma porção de seres pequeninos: as crianças.

 

O Forte Apache da Gulliver.

 

E como era esse Forte Apache de que tanto amávamos?  Respondo seguramente. O brinquedo de montar a gente o retirava de uma enorme caixa de papelão com a imagem do Forte ilustrada em cores. Os primeiros modelos eram de madeira, havia uma cerca, quatro casinhas que serviam de alojamentos para as miniaturas e um observatório para vigiar e alertar o ataque dos soldadinhos inimigos. Havia indiozinhos e um cavalo de plástico para cada um. O exército da cavalaria montada a gente comprava à parte. O som dos tiros e do impacto do confronto corporal era emitido de nossas bocas, numa tentativa de escrever onomatopeias no ar, como nas revistas em quadrinhos.

Como não mencionar o autorama, o pião, as bolinhas de gude, o bambolê, o time de botão, o pega varetas, o jogo educativo para montar, o quebra-cabeça e o álbum de figurinhas que a gente nunca conseguia completá-lo?

Autorama da Estrela

 

Bolas de gude

 

Cachorro Baterista e o famoso Pega-Varetas

 

Album de Figurinhas de 1976

 

Outra paixão da criançada dos anos 1970: ouvir os discos do palhaço Carequinha e suas cançõesinfantis. Os meninos brincavam também de cowboy usando os coldres da marca Passos:

 

 

Havia ainda as brincadeiras de rua com meninos e meninas, que resultavam em paqueras inocentes porque não existia a malícia das crianças de hoje em dia. Pulávamos corda e rodávamos a ciranda. Brincávamos de pique-esconde, pique-tá, pique-bandeira, pera-uva-maça-salada mista, amarelinha, cinco marias, chicotinho queimado…

 

Ah, tempos bons! Quem se lembra?

 

*todas as imagens (fotos e vídeos) respeitam os seus respectivos
direitos autorais e são utilizados aqui apenas para efeito de pesquisa e resenha jornalística.

 

 

SOBRE JORGE VENTURA

Jorge Ventura é escritor, roteirista, editor, ator, jornalista e publicitário. Tem 13 livros publicados e participa de dezenas de coletâneas nacionais e estrangeiras. É presidente da APPERJ (Associação Profissional de Poetas no Estado do Rio de Janeiro), titular do Pen Clube do Brasil, membro da UBE – RJ (União Brasileira de Escritores) e um dos integrantes do grupo Poesia Simplesmente. Recebeu diversos prêmios, nacionais e internacionais, como autor e intérprete. Tem poemas vertidos para os idiomas inglês, francês, espanhol, italiano e grego. É também sócio-proprietário da Ventura Editora, CQI Editora e da Editora Iniciatta. Jorge é colunista do ArteCult e é responsável pelo AC RETRÔ.

@jorgeventura4758

SOBRE O AC RETRÔ

Prepare-se para embarcar em uma viagem no tempo! O AC RETRÔ é um espaço dedicado à nostalgia, à memorabilia, ao colecionismo, relembrando também aquelas propagandas icônicas da TV, telenovelas, anúncios inesquecíveis das revistas e jornais, programas que marcaram época e filmes que nos transportam diretamente para tempos dourados! ️

Aqui, cada post será um convite para reviver memórias, despertar emoções e compartilhar as lembranças que moldaram gerações.

Se você sente saudade de jingles que não saíam da cabeça, comerciais que viraram clássicos, seriados que marcaram a infância ou até mesmo daquele filme que você alugava na videolocadora todo fim de semana, então o AC RETRÔ será o seu novo ponto de encontro. Afinal, recordar é mais do que viver: é reconectar-se com o que nos fez sorrir, sonhar e se emocionar. Fique ligado, porque essa viagem ao passado JÁ COMEÇOU! ✨

Author

Jorge Ventura é escritor, roteirista, editor, ator, jornalista e publicitário. Tem 13 livros publicados e participa de dezenas de coletâneas nacionais e estrangeiras. É presidente da APPERJ (Associação Profissional de Poetas no Estado do Rio de Janeiro), titular do Pen Clube do Brasil, membro da UBE – RJ (União Brasileira de Escritores) e um dos integrantes do grupo Poesia Simplesmente. Recebeu diversos prêmios, nacionais e internacionais, como autor e intérprete. Tem poemas vertidos para os idiomas inglês, francês, espanhol, italiano e grego. É também sócio-proprietário da Ventura Editora, CQI Editora e da Editora Iniciatta. Jorge é colunista do ArteCult, responsável pelo AC RETRÔ. E, agora vocês já sabem... Uma das maiores referências no Brasil sobre o universo Batman. Instagram @jorgeventura4758

23 comments

  • Querido Jorge Ventura, a AC RETRÔ estreou de forma brilhante! Estou encantada. Ler e passear pelas imagens desta nova e genial coluna foi uma gostosa viagem no tempo para uma época que marcou a infância e adolescência de muitos de nós. Imagino ser curioso e informativo para os que nasceram depois disso. Parabéns a você e a ArteCult pela ideia e execução! ✨

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    • É,realmente, uma viagem no tempo. Essa coluna preserva a memória cultural de anos passados. Grato pela leitura! Beijos!

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  • Parabéns meu amigo! Mais uma vez, nos presenteou com um excelente texto. Mesmo não sendo dessa geração, é fácil perceber o cuidado e a riqueza com que vc resgata essas memórias. Um trabalho muito bem feito. Parabéns também à ArteCult por valorizar esse tipo de conteúdo.

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  • Jorge Ventura arrasando mais uma vez! Parabéns pelo trabalho excelente. Delícias de lembranças. Bateu saudade!
    Obrigada, Jorge!

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  • Maravilha! Ótima ideia para um amante do Universo Batman. Que muitos cooperem com essas memórias. Com certeza vai ser um resgate de reliquias. Parabéns, querido! Sucesso. Bjo

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  • Que passeio sensacional em torno da infância. Jorge Ventura nos permitiu, através de suas palavras, tal qual a criança e suas brincadeiras, assimilarmos novamente o mundo a maneira infantil. Parabéns . Renata Quiroga

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  • Eu era partidária da Caloi. Tive uma, verdinha, depois de passar pelo velocíoede.
    Tive a Suzy, a Barbie, dentre outras bonecas. Fofoletes? Tinha umas 30! Pega varetas, disco do Carequinha, além daqueles coloridos da coleção “Disquinho”….
    Tinha, também, carrinho, caminhão, trem e avião. Aliás, adorava um caminhão, pois na carroceria dele passeavam os Fofoletes. Tinha soldadinhos de guerra e miniaturas dos Super Heróis.
    Até hoje…. tenho uma coleção pequena de fuscas…Rsss.
    Me identifiquei total! Valeu mesmo! Parabéns pelo conteúdo! Adoro esses temas!

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  • Ótima coluna. A viagem iniciada na escrita e com muitos pousos nas imagens, proporciona um passeio gostoso em todo o saudosismo e com sabor de quero mais. Parabéns.

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  • Que coluna incrível! Parabéns, Jorge! Mais vez surpreendendo com um ótimo conteúdo e cheio de curiosidades. Adorei!

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  • Que coluna lúdica! É bem interessante recordar os brinquedos e passatempos de uma época. Uma verdadeira viagem ao tempo. Parabéns, Jorge Ventura! Sua pesquisa é incrível.

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  • Como está sendo emocionante viajar com esse belo texto. Eu confesso que me lembrei de detalhes de todas as brincadeiras. E com muita saudade a lembrança dos amiguinhos que guardo no coração. Todas as noites aconteciam as brincadeiras, com muita alegria, cantoria, correria. Ah que saudade! A emoção bateu forte. Uma viagem inesquecível❤️Grata,Jorge Ventura!

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    • Eu lhe agradeço imensamente pelo prestígio à minha coluna, Maria Célia. A sua leitura é muito importante. Beijos!

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