A estreia foi em 1991 com a coletânea de contos Escrita fina. De lá para cá, muitos outros livros vieram. Conheça um pouco da vida e da obra da escritora Lilian Fontes nesta entrevista exclusiva.
ArteCult: Parece que, na sua casa, o gosto pela Literatura vem de berço. Seu avô, Amando Fontes, autor de Os corumbas, é um importante escritor brasileiro. Que ensinamentos ele lhe transmitiu?
Lilian Fontes: Na minha infância, passava as férias na casa de vovô Amando em Teresópolis, e Manuel Bandeira, muito amigo, estava sempre lá. Então, eu com uns nove anos, decorava seus poemas e declamava quando ele chegava. Mais tarde, aos treze anos, quando eu li Os corumbas, fiquei surpresa ao ver que vovô falava de um universo que não era o dele. Assim como seu outro romance, Rua do Siriri, cujo tema é a vida das prostitutas em Aracaju. Isso me motivou a pensar que a literatura tinha este alcance, falar de diversos mundos. E claro, a leitura esteve sempre muito presente. Li muito desde criança.
AC: Você escreve contos e romances. Sente-se mais confortável produzindo narrativas curtas ou longas?
LF: São diferentes. O que me leva à escolha é o tema. Se quero falar de algo pontual, escolho o conto e se a vontade é incluir universos diversos, muitos personagens, aí só através da narrativa longa. O que é mais fácil? Não há facilidade, cada um requer uma forma de narrar. No caso do conto, há a exigência de concisão, de cortar palavras. No caso do romance, você pode soltar mais o “verbo”, mas mesmo assim, há o trabalho de concisão, de descrever ambientes, os sentimentos, com o mínimo de palavras possível, contando com a capacidade de apreensão do leitor.
AC: Há alguns anos, você passou a se dedicar à escrita de biografias. O que já lançou no gênero e como tem sido essa experiência?
LF: O gênero biografia não foi uma escolha minha, foi ele que me escolheu! Pelo seguinte: fui convidada pela editora Record para escrever a biografia profissional do neurocirurgião Paulo Niemeyer Filho e eu aceitei. Isso foi em 2003. Desde então, passei a ser procurada tanto por famílias que querem deixar o registro de alguém como memória, como também por editoras. Para editoras escrevi Sinhá Moreira, editora Gryphus; Mauro Viegas: a construção de uma vida, Répti editora; ABC de Rachel de Queiroz, editora José Olympio e Ivo Pitanguy, viver vale a pena, onde contribui com entrevistas e edição de texto para a Casa da Palavra. No momento, escrevo a de Regina Bilac Pinto, que foi presidente do SNEL e realizadora da primeira Bienal do Livro Rio. Como experiência, é fascinante, pois temos que penetrar no mundo do biografado, entender a época em que viveu etc. São personagens vivos!
AC: Sobre seu lado roteirista o que poderia nos dizer?
LF: Bem, a minha primeira experiência veio de um convite de Rubem Fonseca. Ele estava escrevendo o roteiro de O cobrador para Durval Valente. Na época, ele batia numa máquina de escrever Remington e pediu que eu passasse para uma IBM elétrica. Eu trabalhava com arquitetura, era autônoma, portanto tinha liberdade de horário. E então passei a ir à casa dele todas as tardes. Isso foi em 1986. Que experiência! Estar ali ao lado do autor, vendo como ele transformava a narrativa literária em audiovisual. Ele me pedia opinião, era uma ótima troca. Ao final, o filme não se realizou. Quando em 1994, lancei meu primeiro romance, Espantalhos, tive o convite de um produtor, Joaquim Vaz de Carvalho, para fazer um primeiro tratamento de um filme que queria realizar. E a partir disso vieram outros convites que me levaram a fazer cursos de roteiro. No doutorado, escolhi fazer a tese sobre a adaptação do romance Mandrake para a série televisiva da HBO. Bem, e aí este caminho me fez aprofundar ainda mais a estrada do audiovisual, ministrando oficinas aqui e em Portugal.
AC: Que autores você considera suas principais influências literárias?
LF: Que pergunta difícil! São tantos! No conto, posso ressaltar Rubem Fonseca, Julio Cortázar e Lygia Fagundes Telles. Na narrativa longa… nem sei. Dostoiévski, Rachel de Queiroz, Graciliano Ramos. Nada muito específico. Agora, a poesia me ajuda muito a encontrar a palavra certa. E aí entram Fernando Pessoa, por quem me apaixonei aos treze anos, Manuel Bandeira, Drummond, Ferreira Gullar, Armando Freitas Filho.
AC: Especificamente com relação ao ofício de escrever, que procedimentos você costuma adotar? Escreve todos os dias? Reescreve muito? Mostra para alguém durante o processo?
LF: Quando estou escrevendo um romance, tento escrever todos os dias, nem que seja uma frase, para ficar em conexão com os personagens. Mas nem sempre é possível. Meu último romance, que ainda não publiquei, tive de parar duas vezes: a primeira para escrever o ABC de Rachel de Queiroz e a segunda, o livro do Pitanguy. Mas faço anotações que me ajudam a retomar a história. Se reescrevo muito? Nossa! Muito! No caso desse último, escrevi 12 versões. E não costumo mostrar a ninguém durante o processo, porque eu mesma não sei como vai terminar, então prefiro não ter interferências, deixar que os personagens indiquem o caminho.
AC: Inspiração ou transpiração: o que vale mais na prática literária?
LF: Ah, a transpiração. Ideia é fácil, o difícil é transformá-la em uma narrativa convincente que prenda o leitor.
AC: O fantasma da página em branco: mito ou realidade? Isso acontece com você?
LF: Realidade. Em muitos momentos, a realização não chega, empaca. Mas não me aflijo, sei que é normal. “Amanhã é outro dia”, falo para mim mesma.
AC: A que projetos você se dedica atualmente? O que vem por aí nos próximos meses?
LF: Primeira coisa a dizer: eu não vivo da minha ficção, portanto, tenho de correr atrás, ministrando cursos, fazendo trabalhos de texto, revisão, o que vier para me dar rendimento. Atualmente, escrevo a biografia de Regina Bilac Pinto para a editora Gryphus. Estou esperando a publicação do meu próximo romance e já com outros projetos em prosa. Tenho publicado poesias em coletâneas de uma editora portuguesa e levei um ultimato de meu amigo e grande poeta Armando Freitas Filho, dizendo que está na hora de eu fazer um livro de poesia. Então…
AC: Entre os seguidores do canal de Literatura do Portal ArteCult, muitos são aqueles que escrevem ou que desejam escrever. Que conselho ou dica você poderia dar a eles?
LF: Leiam muito! De tudo! E observem o mundo, as pessoas, as relações, vejam filmes também. Tudo que for entrando servirá de material para a escrita.
Bem, é isso. Até a próxima!
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