SÓ RESTARÁ O QUE VOCÊ ESCREVER (E PUBLICAR)

Livros Antigos. Artista : JuDosi

SÓ RESTARÁ O QUE VOCÊ ESCREVER (E PUBLICAR)

 

A vida é breve, e mais breve ainda, se pensarmos na rapidez com que o tempo passa, o que pode ser cruel, mas os seres humanos são mais insensíveis ainda. Se não escrevermos na pedra, nada ficará. Os monumentos erigidos ao longo da História refletem o caminho traçado pelos povos.

Só restará o que for escrito. De toda uma vida, só fica o que escrevemos e guardamos. Diários, cartas, anotações, registros, atas, documentos, testamentos, mensagens, bilhetes, tudo o que existir em forma legível poderá ser lido e saberão, muito depois, o que foi dito ali.

Temos necessidade de escrever, senão para os outros, para nós mesmos, de gravar as ideias, porque elas devem ser passadas adiante. Até para nos lembrarmos do que pensamos em determinado momento que depois esquecemos.

Gurdjieff disse (e escreveu) que somos apenas o que lembramos. Se não nos lembramos, não somos nada. Seu maior ensinamento pode ser resumido numa frase: “Lembre-se de si mesmo”. Através do autoconhecimento, saberemos mais o que nos dizem. E tudo o que nos é dito faz parte desse mosaico que é a vida humana.

Se não escrevermos (e publicarmos) o que pensamos, ou não registrarmos de alguma forma o que passou por nossa mente, estaremos fadados ao esquecimento imediato após a morte. Esta leva todas as coisas que vivemos, dissemos e pensamos, um dia.

Meus pais deixaram muitas coisas escritas. Além de conversar, tinham o hábito de escrever, hábito esse que também adquiri, e mantenho, de dizer, em um bom texto, o que foi vivido.

Ler é outra forma de induzir a escrita. Há textos que nos “fazem escrever”. Se desde os antigos gregos não houvesse a escrita – a mais bela das invenções – viveríamos na ignorância do que eles pensaram. O hábito da leitura serve justamente para nos trazer o que foi pensado, que não está distante do que poderemos pensar por nós mesmos, mas aquelas ideias são as pedras para podermos construir o que quisermos.

Não nascemos prontos, dizia minha mãe, nós nos tornamos, mas, primeiro, temos que ter noção do que queremos ser, e não dá para querer ser algo que desconhecemos. Por outro lado, Khalil Gibran disse que “a educação irriga as sementes que já temos”. Se nascemos com sementes que podem germinar, então, já temos tudo o que precisamos para fazer o que queremos. Mas é preciso que cresça e se transforme naquilo que será. A semente não é a árvore, mas é o que a árvore poderá ser, se ela crescer. Enquanto crescemos, não sabemos no que nós nos transformaremos, porque nossa semente está oculta. Só depois, poderemos conhecer a árvore pelo fruto.

Então, escreva. Tudo o que escrever (e publicar) é o que restará.

Niterói, Outubro de 2025

Thereza Christina Rocque da Motta

 

 

 

 

 

 

 

Colunista ArteCult e editora da Ibis Libris Editora (@ibislibris)

 

 

Author

Thereza Christina Rocque da Motta (São Paulo, SP, 1957) é poeta, editora e tradutora. Foi Jurada de Tradução do Prêmio Jabuti, em 2018. Recebeu a Medalha Chiquinha Gonzaga da Câmara dos Vereadores, em agosto de 2021. Coordena a Ponte de Versos desde 2000, evento incluído no Calendário Oficial de Cidade do Rio de Janeiro, em 2024. Fundou a Ibis Libris no Rio de Janeiro, em 2000. Publicou Joio & trigo (1982), Capitu (2014), Lições de sábado (crônicas, 2015), Minha mão contém palavras que não escrevo (2017), O amor é um tempo selvagem, Lições de sábado Vol. 2 e A vida dos livros Vol. 2 (2018), Poesia Reunida 40 anos (1980-2020), Sheherazade: Novas lendas das 1001 noites e três já conhecidas (2022), entre outros. Traduziu, entre outros, Marley & Eu, de John Grogan (2006), A Dança dos Sonhos, de Michael Jackson (2011), 154 Sonetos, de William Shakespeare (2009), Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll e O Corvo, de Edgar Allan Poe (2020), Mais mortais que os homens, org. Graeme Davis (2021) e A última casa da Rua Needless, de Catriona Ward (2023), vencedor do British Fantasy Award, como Melhor Romance de Terror de 2022.

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