Sonhar de olhos abertos no CCBB

 

A criança e o teatro.

Levar uma criança ao teatro é o mínimo que podemos fazer para garantir que amanhã o teatro continue a existir. E, diante de tamanha contribuição na vida dos pequenos, seria preciso escrever mais de uma página para afirmar o bem que se faz quando as crianças conhecem as artes cênicas.

O coletivo Eranos – Círculo de Arte é formado por artistas de formação interdisciplinar que produzem e pesquisam arte nas interfaces entre teatro, teatro de animação, artes visuais, literatura e audiovisual. Desde 2011, o grupo se dedica à pesquisa da linguagem teatral voltada para a primeira infância e à relação entre cena e aparatos digitais.

São eles que estão ocupando o Centro Cultural Banco do Brasil, no Rio, oferecendo um verdadeiro desbunde sensorial às crianças que estão descobrindo o mundo — e considero essa descoberta das mais bonitas.

A mostra apresenta quatro espetáculos encantadores e uma exposição brincante, onde pais e filhos podem se divertir e gastar o tempo de maneira bela e construtiva — criando memórias afetivas que ficam para sempre. Há ainda oficinas voltadas a crianças e adultos.

 

O Barquinho Amarelo

Sinopse:
O espetáculo propõe uma ponte entre gerações, resgatando brincadeiras, imagens e sonoridades das infâncias vividas no interior, ao mesmo tempo em que celebra o universo imaginativo comum a todas as crianças. Utiliza o rastreamento de movimento do elenco como motor para projeções digitais interativas, criando uma experiência de teatro visual. As crianças acompanham a jornada do Barquinho Amarelo e encontram a Galinha Cocó, o Cavalinho de Madeira e o intrépido Sapo Ló. Ao final, são convidadas a criar seus próprios barquinhos.

 

Impressões:

A tecnologia é usada de forma afiada e sensível. Os olhinhos dos pequenos mal piscam diante da imensa tela cheia de imagens coloridas — até aparecer a Galinha Popó e seu ovo azul, que acende de verdade! Dá vontade de levar Popó para casa. As crianças se conectam de forma intensa com as histórias, vibrando a cada surpresa — até um peixe que pula da tela para uma peneira! A tecnologia, nesse caso, é uma aliada: está presente na vida das crianças e, em cena, ganha vida e poesia.

 

Mergulho

Sinopse:
Destinado a crianças de 1 a 6 anos, o espetáculo narra a história de duas pessoas que vivem em universos diferentes — ele na terra e ela no mar — e que, com a ajuda da plateia, buscam se encontrar. O uso da projeção digital e do som cria uma linguagem sensorial e imagética, que amplia as possibilidades de interação entre cena e público.

Impressões:

É pura magia! As crianças se reúnem ao redor de um tapete que se transforma em mar, povoado pelos animais marinhos que elas mesmas escolhem ver. Rezo a Deus que meu Alzheimer não me faça esquecer esse espetáculo. Quando o protagonista entra na boca da baleia, surge um ser azul — e uma criança na plateia grita: “Iemanjá!” Foi um momento de esperança. Em uma só palavra, ouvi o eco de anos de luta contra o preconceito.
Lembrei de Sandra Coelho, que um dia se irritou com os “xiii” de adultos durante suas apresentações e criou uma obra onde o público infantil é parte essencial da cena. E é mesmo — sem as crianças, o espetáculo não existe. Amei!

 

O Bebê e o Boi Babau

Sinopse:
Inspirado no teatro popular brasileiro, o espetáculo apresenta o Bebê Pistache e seu Boi Estêlo, que embarcam numa jornada onde subvertem a ordem do mundo dos adultos e dos seres mágicos, trazendo novas perspectivas sobre o viver e o morrer.

Impressões:

Falar sobre a morte para a primeira infância exige coragem — assim eu pensava. Mas como canta o outro, “Mas que nada”! As crianças lidam com a morte de forma natural. Sandra tem razão: é preciso apenas respeitar essa visão. Lembro do meu sobrinho, de quatro anos, que me disse: “Você vai virar estrelinha”.
Durante o espetáculo, uma menina gritou: “O boi morreu!” — e tudo seguiu em paz. Talvez sejamos nós, adultos, que precisamos aprender a olhar a vida (e a morte) com a leveza que as crianças já têm.

 

Pô! Ema – Criação poética com crianças

Sinopse:
Uma experiência interativa que mistura teatro, literatura e audiovisual. As crianças encontram uma escritora em crise, que sente sua inspiração sumir. Descobrem, com ela, que uma ema (em projeção digital) está se alimentando de seus poemas. Juntas, ajudam a criar novos versos para alimentar a dona Ema e seus filhotes.

Impressões:

Puro encantamento. A atriz escreve em uma máquina de escrever, e o texto aparece projetado numa tela — até que a ema come as palavras! A partir daí, tudo vira festa. As crianças participam ativamente, apontam, riem, ajudam. A ema tem quase dois metros, e até os filhotinhos se comunicam. É um momento de mansidão e beleza, um encontro entre poesia e brincadeira.

 

Respeito e acolhimento

Antes de cada sessão, Sandra Coelho, idealizadora da mostra, conversa com o público. Explica como se comportar, pede respeito aos bebês e orienta sobre o tempo do espetáculo (de no máximo quarenta minutos). Há um espaço reservado para mães que precisem acalmar os filhos e a recomendação de que permaneçam próximas, especialmente quando as luzes se apagam. É um gesto de cuidado e empatia.

Conheci a Eranos em 2022, com o espetáculo Caixa Ninho, uma verdadeira joia. Naquele ano, o grupo levou quase todos os prêmios do CBTIJ – Centro Brasileiro de Teatro para a Infância e Juventude, e não podia ser diferente.

A produção local é de Eduardo Almeida, artista do teatro infantil carioca.

O CCBB se inclinou, com toda a delicadeza, para os bebês — reorganizando inclusive os pontos de luz do teatro. Um brinde ao futuro!

Viva e parabéns!

 

Integrantes do Eranos – Círculo de Arte

Sandra Coelho – Artista com incursões em teatro, artes visuais e literatura. Psicóloga há 19 anos, pesquisa a linguagem dos sonhos sob a ótica junguiana, unindo autoconhecimento e arte. Desde 2014, investiga o teatro voltado à primeira infância.

Leandro Maman – Artista multidisciplinar que atua com teatro desde 1997. Trabalha com poesia, performance, fotografia e audiovisual. Formado em Design Industrial, pesquisa as relações entre corpo e projeção digital, arte urbana e narrativas abertas.

Hedra Rockenbach – A mulher da música, do canto, a flautista de Hamelin. É através de seu saber que as crianças se lambuzam no ritmo.

 

SERVIÇO

Mostra Primeira Infância – Ocupação Teatral Eranos

10 de outubro a 2 de novembro de 2025 | Quarta a segunda, das 9h às 20h
CCBB Rio de Janeiro – Teatro III
️ Entrada gratuita | Ingressos: bb.com.br/cultura
, totens ou bilheteria
♿ Acessibilidade garantida

Centro Cultural Banco do Brasil – Rio de Janeiro
Rua Primeiro de Março, 66 – Centro, Rio de Janeiro (RJ)
(21) 3808-2020 | ✉️ ccbbrio@bb.com.br

Mais informações: bb.com.br/cultura

Redes sociais: @ccbbrj
| facebook.com/ccbb.rj
| x.com/ccbb_rj

 

 

 

Author

Dramaturga, com textos contemplados em editais do governo do estado do Rio de Janeiro, Teatro Prudential e literatura no Sesi Firjan/RJ. Autora do texto Maria Bonita e a Peleja com o Sol apresentado na Funarj e Luz e Fogo, no edital da prefeitura para o projeto Paixão de Ler. Contemplada no edital de literatura Sesi Fiesp/Avenida Paulista, onde conta a História de Maria Felipa par Crianças em 2024. Curadora e idealizadora da Exposição Radio Negro em 2022 no MIS - Museu de Imagem e Som, duas passagens pelo Teatro Municipal do Rio de Janeiro, com montagem teatral e de dança. Contemplada com o projeto "A Menina Dança" para o público infantil para o SESC e Funarte (Retomada Cultural/2024). Formadora de plateia e incentivadora cultural da cidade.

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