VIAGENS GASTRONÔMICAS: conhecendo LUMIAR e SÃO PEDRO DA SERRA

Anda, vem jantar, vem comer, vem beber
Farrear até chegar a Lumiar
E depois deitar no sereno
Só pra poder dormir e sonhar
E passar a noite caçando sapo
Contando caso de como deve ser Lumiar
Acordar, Lumiar
Sem chorar, sem falar
Sem querer acordar em Lumiar
Acho que todo mundo, em algum momento, já ouviu essa música do Beto Guedes, né? E eu sempre tive curiosidade pra conhecer essa região. Mas nunca havia surgido uma possibilidade real, seja por falta de tempo, ou por falta de planejamento. O fato é que, mesmo com tanto tempo de Rio de Janeiro, só estive uma vez em Nova Friburgo, do qual LUMIAR é o 5° distrito e fica localizado na Zona Sudeste do município, na região serrana estado do Rio de Janeiro, situando-se a 28 km da sede do município e 150 quilômetros da capital do estado.
A localidade  foi fundada lá pelos idos de 1828 por famílias de origem Suíça, que se deslocaram para o leste da então Fazenda do Morro Queimado, logo após a fundação da atual cidade de Nova Friburgo e  se instalaram no Alto do Macaé, às margens do Rio Macaé. Com altitude média de 650 metros acima do nível do mar, é cercada de montanhas e apresenta temperaturas que variam anualmente entre 10 e 36 graus, possuindo temperatura média de 26 graus.
Surgiu, então, a oportunidade. De férias, procurando um lugar pra passar – e comemorar – o dia da mães em família, retirei do baú a vontade que tinha de ir conhecer Lumiar. E aí, pensei: será que, além de curtir o lugar, ainda encontro um tema pra um artigo do ARTECULT?
Pois é, despretensiosamente, comecei a pesquisar sobre o que fazer – e comer –  ali pela área e, depois de algum tempo, tive a certeza: é pra lá que eu vou…
Afinal, quando a gente ouve a canção, é possível perceber que é uma música que nos remete à simplicidade da vida no campo, longe do stress da cidade grande e das preocupações cotidianas, num espaço de paz, tranquilidade, conexão com a natureza e – por que não? – com os sentidos, como o paladar.
Feito esse pequeno introito, malas prontas, lá fomos nós desbravar a região. Que é, realmente, belíssima, diga-se de passagem.
 Já na pousada, assim que cheguei, já fui logo experimentando uma cerveja produzida nas proximidades. E ali estava disponível a Genebra, uma cerveja de trigo, forte, clara e de alta fermentação, com notas de caramelo, doce de banana e cereais maltado, feita pela BARÃO BIER (@baraobier), uma cervejaria artesanal fundada em 2014, cujo nome foi dado em homenagem ao primeiro Barão de Nova Friburgo, Antonio Clemente Pinto, figura de grande representatividade para a região. Segundo informação obtida no site, é a primeira cervejaria artesanal legalizada em Nova Friburgo.
Nas minhas pesquisas, eu havia visto que, bem ali próximo de LUMIAR, poucos quilômetros separando um do outro, encontraria SÃO PEDRO DA SERRA, sétimo distrito do município de Nova Friburgo, que recebeu esse nome  em homenagem a Dom Pedro I, que havia autorizado a posse de terras devolutas na região. Segundo consta no site https://altosdaserramar.com.br/historico-cultural/:

As vilas de Lumiar e São Pedro da Serra disputaram a condição de sede do distrito de Lumiar, o mais antigo de Nova Friburgo, criado em 1889, o que implicou na alternância do cartório por sete vezes, ora em um, ora em outro lugarejo, por conta das disputas políticas entre as famílias de maior poder local. Em 1931, Lumiar se torna sede do distrito e, em 1987, é criado o 7º distrito de Nova Friburgo, São Pedro da Serra, em terras desmembradas de Lumiar.

Ambas as vilas permaneceram em relativo isolamento até meados do século XX. A produção agrícola era escoada por tropas de mulas que levavam café, carne de porco, feijão, farinha de mandioca, batata, milho, cabrito, etc, inicialmente, em picadas abertas na mata, por onde traziam remédios, açúcar, arroz, entre outros víveres. Somente em 1959, por iniciativa de um grupo de moradores, foi aberta a primeira estrada de terra ligando Lumiar a Mury.

A partir dos anos 1970, a região começou a receber hippies, praticantes do montanhismo e seguidores de filosofias alternativas, que foram os primeiros a se integrarem e a interagirem com as famílias locais. Em 1977, Beto Guedes lança a música “Lumiar”, um grande sucesso entre os jovens da época, que contribuiu para tornar a vila conhecida nacionalmente, aumentando o fluxo de visitantes. O asfaltamento da RJ 142, em 1982, ligando Mury a Lumiar e, em 2006, a Casimiro de Abreu (Estrada Serramar), trouxe levas sucessivas de turistas e veranistas, além de famílias provenientes dos grandes centros urbanos que passaram a residir na região.

Muitos descendentes desses primeiros imigrantes europeus ainda praticam em suas propriedades, lavouras onde o manejo se dá nos moldes dos antigos colonos, como nas roças de aipim, inhame, banana, na horta e nos canteiros de ervas, tradições e saberes que são preservados e remetem aos modos de vida de seus antepassados.

A utilização cotidiana destes produtos na culinária e o uso das ervas medicinais, fazem parte do incrível legado cultural dos moradores deste lugar. As comunidades expressam suas tradições nas festas de santos, juninas e de agricultores, como também em sua musicalidade e poesia nas rodas de viola, encontros de sanfoneiros e nos muitos forrós promovidos na região, além dos músicos e artistas que aqui fizeram sua morada.

Administrativamente, verifiquei que há uma subprefeitura que cuida dos dois distritos (@subprefeituralumiaresaopedro).

Não listarei os locais de visita na ordem em que fui, pois não ficaria assim, tão didático, na medida em que pulei de um lado para o outro. Vou iniciar o artigo falando sobre o que vi – e experimentei – em LUMIAR.

O centro do Distrito é muito agradável. Tem uma praça e, logo ali perto, um lago com peixes. O clima, quando estive lá, estava perfeito – tempo aberto, sol à pino, porém sem o calor infernal que anda fazendo no Rio de Janeiro. Tirei fotos em dois momentos – de dia e de noite – para que vocês pudessem ter um pouco de noção da paisagem que descrevo.

O primeiro prato que queria comer nessa viagem seria algum que tivesse truta. Afinal, Nova Friburgo é o município com maior produção de trutas do estado, com 36 toneladas do peixe por ano, segundo a Fundação Instituto de Pesca do Estado do Rio de Janeiro (Fiperj) e a maior parte dessa produção está concentrada em Lumiar, na localidade de Macaé de Cima, além de Salinas e Três Picos. Além das características geográficas de montanhas, a temperatura e as características físico-química da água na região são adequadas à criação, com um fornecimento abundante do recurso hídrico, o que confere a Nova Friburgo boas condições zootécnicas para a criação de trutas.

Escolhi o restaurante ARMAZÉM DA SERRA (@restaurantearmazemdaserra), um casarão localizado bem na praça principal, no coração de LUMIAR.

Antes dos pratos, pra acompanhar a cerveja, pedi uma porção de bolinho de batata baroa com gorgonzola, servido com um molho feito na região – que, apesar de não ser ardido, era uma delícia!

Eu pedi o que eles chamavam de “truta suíça”, que vinha com uma batata rostie e molho de gorgonzola.

É óbvio que eu tive que pedir uma versão com filé mignon, pra atender aos apelos da minha “chata pra comer” de estimação – ou seja, minha filha…

Experimentei um chopp da LUMIARINA (@lumiarina), cervejaria artesanal de LUMIAR, que é a  realização do sonho de dois amigos que decidiram transformar o lazer em negócio.

Caminhando pelo entorno do lago encontrei um veículo estacionado, com diversos produtos em exposição. O cartaz dizia TORRESMO DA SERRA (Tel.: (22) 99267-1866) e oferecia banha de porco, carne de lata, queijo, linguiça, ovos caipiras, cocada, mel e… (óbvio!) Torresmo, em sua versão extremamente crocante e saborosa e, também, em forma de farofa. Conversando com o Augusto, que me contou sua história de vida, descobri que ele não possui rede social. Claro que puxei a orelha e o instruí a providenciar, com urgência, sua inserção no mundo digital. Os produtos são de excelente qualidade, o torresmo é perfeito, e merece ser conhecido pelas pessoas. Ele me prometeu que iria agilizar o processo para ter seu Instagram próprio e perfil nas demais redes. Por isso, deixei aqui apenas o telefone dele como contato. Vale a pena conhecer!

 
Pra não ficar só no torresmo, comprei a linguiça também e, assim que cheguei, já fui logo preparando para experimentar. Como todo bom produto artesanal, ficou divina!
Logo ali próximo do lago de LUMIAR, encontrei a CACHAÇARIA ANDARILHO DA SERRA (@cachacariaandarilhodaserra). Caramba, esse sim é realmente um paraíso para quem aprecia a “marvada”. Dando uma olhada rápida pelos rótulos, acho que ele tem de tudo – e não só em exposição, mas para a venda também. E, além das cachaças, ele também comercializa queijos, vinhos, doces, café e mais uma infinidade de outras coisas.
Logo ali, no balcão, havia alguns rótulos para degustação. Não perdi tempo e experimentei todos eles, entabulando uma conversa com o proprietário, que me contou sua história de colecionador – e, principalmente, apreciador de uma cachaça de qualidade – bem como de todo o processo que o levou a abrir um estabelecimento nesse segmento e com tamanha diversidade de produtos.
Comprei ali um café, que foi moído na hora e espalhou aroma por todo o canto e um ketchup de morango picante da mesma marca (@conservas_misturafina) que eu havia experimentado lá no início desse artigo…
Há apenas 5km de distância dali, de LUMIAR, a gente já está em SÃO PEDRO DA SERRA. Portanto, é de se imaginar que se locomover entre uma e outra acabe se tornando algo rotineiro durante a estadia. E se era assim tão pertinho, por que não ir ali conhecer a gastronomia local?
Em SÃO PEDRO DA SERRA parei o carro na praça João Heringer e fui caminhando. Bem próximo, encontrei um pequeno centro comercial e passei a explorar as várias opções existentes.
 A primeira parada foi na CERVEJARIA CELACANTO (@cervejariacelacanto), que produz cervejas artesanais inspiradas em filmes e seriados antigos. É lógico que, como nerd que sou, já me chamou a atenção as pequenas estatuetas do Nacional Kid que estavam sobre o balcão.
E o pitoresco cardápio, feito com matéria prima importada, trazia opções como: Pilsen Loch Ness, Weissbier Abissal, Witbier Maremoto, IPA Náutilus, Black Holer Stout, Saison Inca Venuziana e Belgian Tripel Medusa. Vale ressaltar que todas as receitas produzidas obedecem as normas do BJCP (Beer Judge Certification Program), órgão americano que regula todos os estilos de cervejas fabricados no mundo. Afinal, o proprietário Antonio Pereira da Costa iniciou a carreira de cervejeiro há cerca de 6 anos, com formação do curso da Escola Superior de Cerveja e Malte de Blumenau/SC, especializando-se nos estilos belga, alemão e inglês.
Tomei algumas cervejas do cardápio e, por pura sorte, naquele dia ele estava testando um novo petisco, para ver se haveria aprovação para entrar no cardápio. Era um bolinho feito com o malte utilizado na produção da cerveja, recheado com queijo e bacon, que ele batizou de “bolinho cervejeiro”. Perfeito! Muito saboroso e, certamente, está aprovadíssimo!
 Do lado esquerdo, encontrei o MANIA DE COMER (@maniadecomersps), do simpático casal Aguinar e Décio. Um cardápio bem variado, com sopas, caldos e cremes – perfeito pro clima que, geralmente, faz na serra! – além de pizzas e outras gostosuras.
Pedi ali uma caldo de abóbora com gorgonzola e duas pizzas feitas com massa de aipim – uma marguerita e uma quatro queijos – tudo feito pelas habilidosas mãos da Aguinar, que já possuía experiência em restaurantes e resolveu encarar, junto com Décio, a aventura de abrir um ponto na serra. E, a julgar pelo sabor do que experimentei, a aposta foi certeira!
Já do lado direito, encontrei algo que me remeteu a uma das viagens que fiz. Eu comi o Pastel de Belém in loco, mas foi bem legal encontrá-lo por aqui também. Falo do PASTÉIS QUASE DE BELÉM (@pasteisquasedebelem). E quer saber? Esses também são uma delícia!
Entre um café – de qualidade, passado ali na hora – e outro, o Daniel Campos me contou um pouco de sua trajetória até chegar na receita que ele serve. E, quentinho, posso assegurar que vale a pena experimentar esse Pastel quase de Belém…
Mas o artigo não estaria completo se eu não fosse conhecer o estabelecimento pioneiro na famosa pizza de massa de aipim, que está no mesmo local há 30 anos. Não à toa, Nova Friburgo é uma das maiores produtoras de aipim do Estado do Rio de Janeiro.
Um pouco diferente das tradicionais, a massa utilizando-se de aipim e um pouco de farinha especial para dar o ponto, confere mais leveza à pizza. E ela assim, de aipim, se espalhou por toda a região, sendo até raro encontrá-la em seu formato padrão.
Seguindo, a pé, uma pouquinho adiante – sim, é quase tudo na mesma rua! – encontramos a famosa PIZZARIA GIRASSOL (@pizzariagirassol).
A noite estava com um clima bastante agradável, assim como o ambiente. O local é amplo e fui bem atendido. Pedi uma pizza, metade de quatro queijos e metade gorgonzola com alho poró, e uma cervejinha bem gelada  para acompanhar.
 
A pizza é bem queijuda e a massa bem leve. Estava muito saborosa e endossa toda a fama que tem. Certamente, voltando a SÃO PEDRO DA SERRA, esse é um local que vai valer a pena ver (e comer) de novo…
Foram só dois dias explorando a região. Entre um e outro, fizemos um passeio com a AVENTURA TOUR (@passeio.lumiar), guiados pelo simpático Jonathan (@jonathansacudidos), que nos levou para conhecer algumas cachoeiras sensacionais. Foi um passeio muito legal! O tempo, ensolarado, contribuiu para que tudo fosse perfeito, abrindo o apetite para todas as aventuras gastronômicas que se seguiriam… Recomendo.
Deixo com vocês o encontro dos rios Macaé e Bonito, considerado um dos cartões postais do município de Nova Friburgo, para inspirar e despertar em todos a vontade de conhecer esse lindo pedaço de serra…

E com esse belo visual, me despeço de todos. Espero que tenham curtido mais essa aventura gastronômica. É sempre muito legal compartilhar com vocês essas experiências, trazendo um pouquinho do que encontro – e experimento por todos os cantos. E isso é o mais legal de tudo: ir aos lugares, procurando aquilo que é mais significativo, aquilo que representa determinado local. Pode ser um pequeno estabelecimento ou algo maior, não importa. O que vale é o que conseguimos extrair daquele momento especial. Não concordam?

Estender o sol na varanda até queimar
Só pra não ter mais nada a perder
Pra perder o medo
Mudar de céu, mudar de ar
Clarear de vez Lumiar

 

Até nossa próxima descoberta…

 

DEL SCHIMMELPFENG

@del.schimmelpfeng

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Author

Del Schimmelpfeng é Analista Judiciário do TJERJ, mas desde que se lembra - e coloca tempo nisso! - ama cozinhar! Apesar de ter feito as faculdades de arquitetura e direito, é se misturando aos pratos, panelas e temperos que se sente inteiro, completo, pleno. É autodidata, nunca fez curso de culinária, tampouco se imaginou um profissional da área. Considera-se apenas um curioso, que procura o conhecimento em tudo e que tenta, de todo jeito, viver da melhor forma possível - apesar de todas as dificuldades. Afinal, não haveria graça se elas não existissem... Participou da seletiva da segunda edição do Masterchef e da décima nona edição do reality "Jogo de Panelas", apresentado por Ana Maria Braga no programa "Mais Você" da Rede Globo, na qual sagrou-se campeão. Possui, ainda, textos publicados em livros de conto e poesia. Blog: http://delschimmelpfeng.blogspot.com Instagram: @del.schimmelpfeng

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