Ficção de Luiz Antonio Aguiar com alguma pitada autobiográfica, A gente era assim retrata os dramas e os comportamentos de uma família e seu entorno para procurar entender os episódios mais recentes no país
O livro A GENTE ERA ASSIM será apresentado ao público no dia 18/04, a partir das 19h, na simpática e acolhedora JANELA LIVRARIA, situada na rua Maria Angélica, 171 Loja B, Rio de Janeiro (55 21 3547-7583).
Escrito por Luiz Antonio Aguiar, escritor e mestre em Literatura Brasileira pela PUC-Rio, a obra conta a história de uma família de classe média carioca, moradora de Copacabana, nos anos 1960 e 1970, por meio da miscelânea de memórias do narrador-personagem, João Fernando.
“Precisei escrever este livro que, apesar de ser uma ficção, é também parte das minhas memórias, do que vivemos no Brasil no passado ainda recente e que tanto traz em informação para entendermos o presente e os últimos quatro anos, até 2022. Acredito que, olhando para trás, pode fazer sentido o que se passou no país. E assim alcançarmos o que almejamos e o que precisamos para ter o país fraterno, próspero, iluminado e iluminista, múltiplo com que sonhamos”, explica Luiz Antonio Aguiar.
O autor de quase duzentos títulos publicados por grandes editoras e ganhador de dois Jabutis diz ainda:
“A opção por uma produção independente é tática. As editoras são, acima de tudo, um empreendimento. São sujeitas a condicionantes, por exemplo, ao que vem sendo chamado de “leitores sensíveis”. Creio que, se o escritor tem algo que precisa escrever e acredita que tem leitores para isso, deve pensar em publicar também como independente e a seguir procurar alcançar esses leitores. É o nosso modo estrutural de ver o mundo, que não somente diz respeito a racismo, a misoginia, mas a toda uma compreensão de vida”.
No lançamento, o autor vai bater um papo sobre o livro e a Literatura com o público. Além de autógrafos, uma roda de samba comendada pelo grupo O ÚLTIMO GOLE vai acontecer. Tudo isso num cenário dotado de toda a hospitalidade do bar/bistrô da Janela Livraria.
A produção editorial é da Axel Giller. E Aguiar acrescenta:
“Não há monstros, não há vilões… Somos pura e simplesmente nós. A gente – a nossa família, que se sentava para jantar juntos, pessoas em seu pequeno mundo, os que víamos nas ruas, nossos vizinhos – era assim. A questão é saber se ainda somos e principalmente se queremos continuar a ser.”
E lembranças e memórias não são somente passado…
“Lembranças seriam como marés, se marés pudessem não ter horário certo. Eu morei anos perto da praia, aprendi a nadar no mar, não em piscina. Marés ecoam em mim” (A gente era assim, p. 46).
Veja alguns comentários sobre o livro!
“Luiz, ganhei Agenteeraassim no sábado, li no domingo, depois do almoço. Espanto puro. O personagem João Fernando é você ou sou eu? Tenho um irmão gêmeo, ainda que muito maior do que eu, e não sabia? Você nasceu em 11/02/1955, eu nasci em 01/11/1955. Gêmeos de signos diferentes, acontece. Você já tem 68 anos, eu ainda tenho 67. Sou o primogênito de 4 irmãos, todos homens – e a minha mãe sempre repetiu que só queria uma menina. Na primeira tentativa, vim eu, Gustavo Bernardo, o nome do meu avô e o único irmão de nome dobrado; na segunda, Gilson (que sempre se incomodou de nosso pai se chamar Hayrton, e não Gil); na terceira, os gêmeos Walther e Werther. Todos eles fizeram Engenharia, só eu fiz Letras. Morávamos na Aldeia Campista, na rua Almirante Cândido Brasil, que antes se chamava rua Alegre, onde morou… Nelson Rodrigues. A ‘minha’ Rosa se chamava Talita, e era a empregada lá de casa, apesar de adolescente. Não tive coragem de mexer nas gavetas dela, mas um dia ameacei deixar cair a toalha, ao sair do banho. Ela deu um risinho, não sei se de mim, de medo ou de excitação, e eu não fiz nada – só fiquei virgem até entrar na faculdade. Minha mãe, dona Zulmira, só não foi à Marcha da Família com Deus pela Liberdade, em 1964, porque meu pai, mais conhecido como Jeremias, o Bom, não deixou. Realmente, ele era o bom, minha mãe era a bruxa má, apesar de linda – ou porque era linda. Tinha até nome de bruxa: Zulmira. Briguei tanto com ela que, depois que ela morreu, após anos de demência, precisei escrever um livro para pedir perdão a ela, chamado Ofantasmadamãe. Claro, o fantasma da minha mãe garantiu que o livro saísse no início da pandemia, ou seja, que não saísse, que ninguém lesse. Passei muitas férias em São Lourenço, no hotel Brasil. Ah, sou Fluminense, como meu pai, e fui um ótimo goleiro de futebol de salão, apesar de baixinho. No futebol de campo, eu era o beque brigão que nem via a bola, mergulhava primeiro na perna dos outros – baixinho e folgado, é óbvio. Meu pai era tão bom que, engenheiro de Furnas, foi exonerado porque se recusou a demitir vários colegas pais de família. Passou o resto da vida, muitas décadas, processando Furnas – ganhou a causa poucos meses antes de morrer, depois do quinto enfarte. Em suma: eu me vi, de corpo inteiro, em Agenteeraassim. Muitíssimo obrigado.”
(Professor Doutor UERJ Gustavo Bernardo Krause, RJ)“Gostei demais do Agenteeraassim. Somos isso mesmo, uma sociedade fincada no racismo, na misoginia e no autoritarismo. Adoramos submeter, sobretudo aos negros e mulheres, mas achamos que estamos sendo generosos. Aliás, sempre nos temos em alta conta. Comungo da mesma esperança; um dia, a educação, os livros e as artes nos mudarão (acho até que já estão nos mudando), senão melhor mesmo que venha o cometa. Luiz, obrigada por ter escrito esse livro, que parece que saiu das entranhas, com muita raiva e que corta como faca amolada.
Apesar da minha experiência ser de menina/mulher, ter nascido na década seguinte e vivido até a adolescência em uma cidade pequena, os pontos de contato com a minha vida são muitos, o que significa que o livro toca em questões cruciais da construção da nossa cultura.”
(Gisele Bondim, RJ)“Sendo seu, tinha que ser belo, forte. Mas este é corajoso e de leitura ininterrupta. Como toda boa ficção, é real.”
(Professora Doutora Eliana Yunes, RJ)“A gente ainda é assim!!!! Estamos em fase de transformação, de identificar e tentar destruir preconceitos arraigados, de entender que o racismo, em suas diferentes e dissimuladas formas, ainda está dentro de nós!
O bom é que já demonstramos horror às injustiças, compreendemos que o mundo mudou e que, apesar do negacionismo e da direita raivosa, estamos entrando em novo ciclo vibratório. E depende de nós, que éramos assim, participar, ainda que hesitantes, desse novo mundo. Nossos filhos e netos vão nos ajudar nessa missão!
Li de um relance só e me encontrei nas suas páginas. Quem sabe eu era a menina da sapataria e não sabia…”
(Escritora Anna Maria Rennhack, RJ)“Li e gostei muito!
Bem, dizer que escreves bem, tua linguagem é clara e honesta e chover no molhado. Então, vou dizer que a estrutura me agradou, naquele ritmo de lembrança- puxa-lembrança, descompromissado e, ao mesmo tempo, garantindo a compreensão cronológica. Descontados fatores como sexo, cidade, algumas coisas locais, é a minha história também. O ritmo, os valores, as relações familiares e domésticas, a vizinhança, a igreja, tudo se aproxima: é verdade que éramos assim!
Há muito de autobiográfico, sem dúvida, mas há cortes e silêncios em prol da arte.”
(Prof Dra. Vera Teixeira de Aguiar – RS)
Confira o autor falando sobre o livro:
ENTREVISTA EXCLUSIVA PARA O ARTECULT
César Manzolillo: Você é autor de quase 200 títulos. Qual o segredo para produzir tanto?
LuizAntonioAguiar: Necessidade de ganhar a vida… E de manter a saúde mental. Escrever e dar aulas são meus antidepressivos hoje em dia. O mundo não é gentil. O Brasil tem um cenário horrendo de desumanidade e desumanização, acentuado pelo governo anterior. E parte do nosso povo não ajuda. Vão de glorificar o fascismo a acreditar na lorota de que juros altos não causam inflação, dívidas sobre dívidas, desemprego, fome… Enfim, tenho mais é que trabalhar! Quem sabe esteja ajudando um pouquinho a propiciar a meus netos um país, um mundo, uma vida mais generosa e hospitaleira? Deus queira!
CM: A gente era assim, seu mais recente lançamento literário, propõe um retorno aos anos 1960 e 1970. Por que decidiu revisitar essa época?
LAA: Nosso povo esteve à beira do abismo totalitário, em que já caiu não sei quantas vezes. A extrema direita capturou o conservadorismo estrutural brasileiro. Poucos conservadores são bandidos, menos ainda são fascistas. Mas a bandidagem fascista se ofereceu como alternativa para uma imensa população conservadora com medo de fantasmas. Eu quis rever meu passado – apesar de o livro não ser autobiográfico – para enxergar desde quando isso vinha, esse conservadorismo estrutural. Tenho certeza de que remonta ao escravagismo oficial – não o terceirizado, que ainda existe. Mas, o que meus olhos viram e minha mente pode hoje lembrar e compreender vem dessas décadas do século passado, quando entrei na adolescência. Quis rever o passado, confessá-lo, como forma de saber como avançar para o futuro, a ciência, o conhecimento, uma comunidade planetária fraternal, próspera e ativa contra as mudanças climáticas, que precisa superar seus atrasos.
CM: Sei que uma das suas paixões literárias é o autor Machado de Assis. Na sua opinião, o que o torna tão especial?
LAA: Muitas coisas, mas o que me impressiona é a atualidade de Machado. Ele já identificava que o racismo é estrutural na visão brasileira de mundo e no seu modo de ser, assim como a misoginia, o medo do conhecimento, e tantas outras mazelas entranhadas em nós – que podemos superar, reverter, mas somente enxergando-as, refletindo o quanto somos contaminados por elas. Machado expôs em carne viva a “normalização” de tudo isso, a incorporação desses embates em nossa maneira de ser, como se fosse um “certo sentimento íntimo” muito antes de formularem o conceito de “estrutural”. E se torna assim um dos pilares de um legado da Literatura, a exposição do conservadorismo. Seus racistas não são monstros, seus misóginos não são ogros – pelo menos não como esses que estavam no poder até meses atrás. A gente era assim. Toda gente brasileira. Talvez, ainda sejamos.
CM: Sem dar muitos spoilers, poderia nos dizer o que os leitores vão encontrar em A gente era assim?
LAA: Cenas e um contexto implícito de uma família de classe média brasileira, moradora de Copacabana, com seus preconceitos, medos, conflitos, e que vieram dar nos dias de hoje…. Eu precisei escrever esse livro. Doeu, arranquei de dentro. Paguei uma produção independente para não ter de retirar uma palavra sequer. É também minha obrigação para com uma Literatura que nos deixou um legado em Lucíola e Senhora, de José de Alencar, em Policarpo Quaresma, de Lima Barreto, em Monteiro Lobato, Graciliano e tantos outros que se aventuraram na dor, na resiliência e no estoicismo, para viver de Literatura neste país. Contra a censura e a boçalidade. Ao fazer Literatura, faço também uma homenagem aos meus irmãos de ofício de hoje. Enfim, os leitores vão encontrar alguém sendo o que é: um escritor.
Sobre Luiz Antonio Aguiar
Escritor e mestre em Literatura Brasileira pela PUC-Rio, Luiz Antonio Aguiar tem mais de 180 títulos editados, prêmios no exterior e no Brasil, inclusive dois Jabutis. Uma de suas paixões e especialidades é Machado de Assis, mas também a Literatura Pop, como o Terror, o Policial, principalmente articulada com os clássicos da Literatura, numa formulação sua, as Arqueologias Literárias, que embasa seus cursos.
Em 2000, organizou, juntamente com Marisa Sobral, a coletânea Para entender o Brasil, um retrato do país na virada do milênio, através de ensaios de celebridades da época. Publicou, em 2008, o Almanaque Machado de Assis, obra de referência nas ações de popularização do escritor. Em 1999, lançou Machado e Juca e Cavaleiro das palavras, colocando o escritor como protagonista de ambas as novelas – premiadas em várias instâncias. Em 2021, lançou O caso Édipo, pela Ventania Editorial, um spin-off da Trilogia Tebana, transformada em thriller. Já era um ensaio de produção independente.
Além disso, publicou tutoriais de leitura de Machado de Assis, sempre mirando popularizar o autor e a leitura dos clássicos. É roteirista de histórias em quadrinhos, trabalhou 12 anos nos estúdios Disney e em parceria com os mais conhecidos desenhistas do gênero, com histórias de terror, fantasia futurista, eróticos, faroeste e lutas marciais, futebol e humor. Teve inclusive revistas próprias. Foi premiado por seu trabalho em muitas graphic novels, adaptando clássicos da Literatura Brasileira para HQs.
Depois de um período dando aulas em instituições universitárias, aventura-se, já há dois anos, com a oficina Literatura do Encantamento (@literatura_do_encantamento, no Instagram), com os Exercícios de Criação Literária e Oficinas de Leitura.
“Sempre buscando caminhos para fazer o que eu me sinto imbuído a fazer em Literatura!”
Luiz Antonio Aguiar foi um dos convidados da primeira temporada do nosso programa AC ENCONTROS LITERÁRIOS. Confira abaixo a live que realizamos com ele em 10/01/2022.
E não deixe também de ver a entrevista escrita que fizemos com ele na mesma época.
SERVIÇO
Lançamento do livro A gente era assim, de Luiz Antonio Aguiar:
- Data: 18/04/2023 (3ª feira)
- Local: JANELA LIVRARIA – Rua Maria Angélica, 171 – Loja B, Jardim Botânico, Rio de Janeiro
- Horário: 19h às 22h
- Contato para entrevistas: Patricia Sobral: (11) 99761-3105
- Preço: R$ 50,00
- Para aquisição: literaturadoencantamento@gmail.com