Sobre o poder do Romance
Desde a morte de minha avó, passei a escrever um livro novo. No enterro dela, todos os contornos do livro me surgiram. Pensei o título, coloquei o primeiro capítulo como uma carta de despedida a ela e publiquei no Facebook. Na rede social, conservei meu nome. Mas ali estava a essência da obra que queria escrever.
Porém, minha lentidão somada aos afazeres de uma vida típica de professor de Ensino Fundamental e Médio me tomam tempo e não consigo terminar de escrever a obra. Ao mesmo tempo, calhei para um caminho de ficção científica que sempre foi alvo de meu desejo, mas que me toma de assalto por nunca ter versado por esse caminho. Há mais pausa aqui.
Tenho paixão pelo livro. Seu título, eu já o tinha em mãos há algum tempo, faltava a história para preenchê-lo. Somei a um personagem que eu havia criado anos antes para um conto. O conto não mais vai existir. Não mesmo, tinha sido um bom exercício escrevê-lo. Como tudo que eu escrevi até hoje, foi um bom exercício. O nome desse personagem: Miécimo – algo como um décimo de mim. No conto, escrevi sobre um homem que demonizava o próprio nome. No Romance, ele é refém dessa incapacitação que lhe vem de destino, de alma. Sei à minha vó o nome de Olganiana, que se assemelha ao seu nome original. Como disse, pensar as etapas, o escrever, mesmo em sua lentidão, tem sido algo por demais gostoso. Causa alguma dor não o vê-lo pronto, só que tem sido necessário esse período de certo silêncio e audição.
Há nele um capítulo que escrevo sempre depois que escuto uma música do George Michael, “My mother had a brother”, dele me veio a inspiração, por lembrar uma situação da família. A música é linda, aconselho a ouvirem, se tem algo que mais admiro em George Michael é sua capacidade de composição. Em todos os álbuns há uma poesia que explode o desejo de viver. É algo que amo sentir. E não há maior dominação à vida do que explorar as finitudes promovidas pela Morte. Inclusive, como o próprio George Michael me faz falta. Por ser meu carro do ano de 2010, ele ainda tem um aparelho de CD. É entrar no carro que ele começa a tocar. Minha esposa passou a amá-lo tanto quanto eu. Em viagem, é ele quem domina. Quando não ele, Dream Theater, mas aí o assunto é para outra crônica.
Penso que deveria ser mais afeito ao conto. O próprio Saramago afirmava que não vê como romance o que catalogamos de Romance em sua obra. Eu gosto do nome, do modelo, do que entendo como Romance. Há certo devaneio e endeusamento. Vou apenas continuar a escrevê-lo. Espero que minha falecida avó assim o ame.
MÁRCIO CALIXTO
Professor e Escritor
Coluna de Márcio Calixto
Adorei o texto!