Sem tem espetáculo melhor, me avisem!

DA JANELA. Foto: Renato Mangolin.

 

Como não se bastassem as emoções das medalhas desse dia, entro no teatro do Sesc Tijuca e digo para mim mesma: que domingo de ouro!

Impossível não mencionar as primeiras medalhas olímpicas que os atletas brasileiros nos trouxeram de Paris, sem falar das disputas das nossas ginastas que simplesmente foram para todas as finais, nos enchendo de orgulho. Para mim, tanto o esporte quanto a cultura são armas poderosíssimas no desenvolvimento do cidadão, e que infelizmente não são valorizadas como deveriam ser. Tanto os artistas quanto os atletas do Brasil merecem nossos aplausos por resistirem bravamente em seus ofícios, diante do péssimo incentivo governamental!

“Da Janela” é uma montagem lindíssima, delicada, democrática, inclusiva e divertida, que segue em temporada no Rio de Janeiro. Produtores e idealizadores trazem aos projetos temas que os levam a serem contemplados em editais, e muitas vezes, por abordarem esses temas, acreditam que isso seja suficiente para uma montagem, mas não é.

Não basta ter um projeto vencedor, é preciso fazer bem feito, trabalhar duro e agradar o público-alvo. E, nesse caso, vi o teatro cheio, isso já me responde, dizendo para mim que o tiro foi bem dado, foi direto no peito, nos levando ao chão, um nocaute gostoso, que ao cairmos, agradecemos pelo golpe.

O idealizador Marcos dos Anjos é minucioso; quando entramos na antessala do Teatro I, abafadores infantis estão disponíveis para os espectadores que necessitam do aparelho, profissionais contratados ficam à disposição para receber cadeirantes e existem avisos nas poltronas do teatro, informando aos espectadores possíveis ruídos em alguns lugares. Mas isso é o suficiente para um bom espetáculo? Também não!

Marcos dos Anjos também assume a direção artística e trouxe uma obra sedutora, em TODOS os sentidos.

 

Sinopse

De sua janela, a menina Malu vivencia e narra o nascimento da amizade entre Nina e Cadu que, de suas janelas, conseguem criar laços e afinidades ao descobrirem, de forma divertida, como podemos “falar” sem usar as palavras.

 

Crítica

Que delícia é assistir à personagem da atriz Elizândra Souto, ela me lembrou a boneca Emília, falante, simpática, com movimentos bem executados, com uma doçura sem medida. Uma das coisas que mais me chamou a atenção foi a voz da artista, um bálsamo aos meus ouvidos. Tenho notado muitos artistas no palco que me incomodam com vozes que parecem não encaixar, isso não é bom, é preciso atentar a isso. Uma ficha técnica não pode ser montada por conhecidos, principalmente um elenco, mas por artistas qualificados. A criação dessa personagem é uma delícia. Confesso que já assisti à atriz em outras obras, mas dessa vez ela me deu uma rasteira, e claro que adorei, ver um bom trabalho é o que queremos!

O artista Vinícius Teixeira é caricato, mas não o mais do mesmo, ele tem um diferencial. Quando ele chega ao palco, é notável a identidade artística dele. O personagem Cadu faz toda a diferença, com a linguagem infantil perfeita. O menino encanta, um personagem criado com graça.

Mariana Siciliano é a atriz que dá vida à personagem Nina, uma graça, muito doce e cheia de surpresas. A atriz é deficiente e, ao lado dos colegas, completa o trio com beleza. Visualmente ela é sinônimo de uma beleza delicada também.

Thamires Ferreira é intérprete de libras, e dessa vez ela completa as cenas com uma personagem divertidíssima. Sempre trabalhei com a profissional, de um tempo para cá percebo um diferencial nela. Thamires faz suas interpretações em libras também através dos seus movimentos corporais, atuando hoje ao lado de grandes feras do cenário musical. No teatro, eu não esperava tamanha façanha. Toda vez que sua personagem (uma senhora) chega ao palco e fala seu texto, sempre se comunicando também com as mãos, faz a plateia rir, crianças e adultos, isso é fantástico. Não sei se inicialmente a personagem era para ser mais ranzinza, mas mesmo tentando ser, ela não consegue, por ser engraçada além do que se espera, faz nascer afeto.

Às vezes, a personagem sentava, eu não entendia, porque sempre que ela se levanta eu não encontrava o banco. Detalhe: existe uma estrutura com pernas embaixo da saia da tal senhora. Fantástica a ideia!

Os figurinos da Teresa Abreu cumprem sua função. O cenário, assinado por Cachalote Mattos, é bem utilizado, são grandes estruturas de ferro que se movimentam através da base que comporta rodas. Essas estruturas são muito bem utilizadas e trazem dinamismo ao espetáculo. A iluminação da Ana Luiza Molinari de Simoni está leve e auxilia muito a personagem Malu em suas cenas. A direção musical também entendeu o público-alvo, não trazendo músicas que poderiam deixar qualquer criança atípica incomodada. Mesmo diante do conflito, manteve a delicadeza necessária. O visagismo do Leo Thuler está de parabéns, uma graça, que conquista todos os que também vão em busca de uma estética visual dos personagens.

DA JANELA. Foto: Renato Mangolin.

 

Vamos falar da estrutura textual da obra “Da Janela”? Marcos dos Anjos foi genial. Um texto com a linguagem certa, porque nem sempre temos texto infantil para o público infantil. Percebo que os textos estão cada vez mais maduros e, quando falamos para crianças, precisamos nos conectar ao mundo delas. E esse pecado Marcos não cometeu. O espetáculo é somente para crianças atípicas? Não, muito pelo contrário disso, é muito importante a presença de crianças típicas nessa obra. É muito emocionante a personagem Malu ensinando libras para os pequenos na plateia. E quando você olha aquela chuva de mãozinhas dos pequenos espectadores se movimentando, o nó na garganta é certo, porque é o início de um novo tempo, portas que estão se abrindo para a inclusão. A Malu também interage com o público ensinando as crianças a se autodescreverem. É sobre isso, é sobre o novo, é sobre outras linguagens, é sobre unir mundos. O conflito do texto chega quando a Malu, sem querer, deixa seu binóculo cair e se entristece por ver o binóculo construído pelo avô quebrado. Nesse momento, Cadu e Nina resolvem construir outro binóculo. Duas crianças, dois personagens que se comunicam sem que as palavras cheguem. Nina não ouve e também não fala, mas eles se entendem do jeito deles. E assim, mensagens como a amizade também nascem nessas linhas dramatúrgicas, tudo abordado com serenidade. Penso ser esse um dos melhores espetáculos infantis que assisti até agora, no ano de 2024, digo mais, se não for o melhor…

Ah! O personagem Cadu, tentando falar com Nina ao descobrir a nova vizinha, é sem sombra de dúvidas um dos pontos altos desse espetáculo!

Levem as crianças ao teatro, apoiar essa obra é incentivar a inclusão!

 

DA JANELA. Elenco (Elizândra Souza, Mariana Siciliano e Vinicius Teixeira) com Marcos dos Anjos. Foto: Renato Mangolin.

Ficha Técnica:

  • Idealização, direção artística e dramaturgia: Marco dos Anjos
  • Coordenação Artística: Felipe Valle
  • Assistente de Direção: Rohan Baruck
  • Elenco: Elizândra Souza, Mariana Siciliano e Vinicius Teixeira
  • Comunicação em LIBRAS: Thamires Ferreira
  • Consultoria em Acessibilidade: Vanessa Bruna
  • Consultoria em LIBRAS: Christofer Allex
  • Direção de Produção: Bárbara Galvão e Felipe Valle
  • Coordenação de Produção: Bárbara Galvão, Carolina Bellardi e Fernanda Pascoal (Pagu Produções Culturais)
  • Produção Executiva: Fernando Queiroz
  • Trilha sonora e direção musical: Ananda K
  • Direção de movimento e preparação corporal: Ricardo Gadelha
  • Cenografia: Cachalote Mattos
  • Figurinos: Teresa Abreu
  • Iluminação: Ana Luzia Molinari de Simoni
  • Adereços: Leandro Fazolla
  • Visagismo: Leo Thurler
  • Oficina de preparação corporal: Fernanda Dias
  • Modelista: Francisca Sabóia
  • Aderecista de figurinos: Nayara Pereira
  • Cenotécnico: Marco Antonio Rodrigues
  • Identidade visual e design Gráfico: Fabrício Sacramento
  • Programação Visual e Gestão de mídias sociais: Daniel Barboza
  • Assessoria de Comunicação: Clímax Conteúdo
  • Fotografia: Renato Mangolin
  • Registro e edição de vídeos: Flash Filmes
  • Gestão de projeto e prestação de contas: Felipe Valle e Mariana Sobreira (Fomenta Soluções Culturais)
  • Supervisão de projetos incentivados: Juliana Trimer
  • Analista de Projetos incentivados: Thiago Monte
  • Assistente de Gestão: Bayron Alencar
  • Contabilidade: Máximos Contabilidade
  • Correalização: Fomenta Soluções Culturais
  • Coordenação de Projeto: Trupe Produções Artísticas
  • Realização: Trupe do Experimento.

*Todas as sessões são acessíveis a pessoas com deficiência, incluindo tradução em LIBRAS e narração das cenas.

 

SERVIÇO

“DA JANELA”

De 20/07/2024 até 25/08/2024

Dias

  • Sábado16h
  • Domingo16h

Duração

50 minutos

Valor

Infantil R$2 (associado do Sesc) / R$5 (meia) / R$ 10 (inteira) / Adulto R$7,50 (associado do Sesc) / R$15 (meia) / R$30 (inteira)

Região

Rio de Janeiro / Rio de Janeiro

Teatro / Espaço

Sesc Tijuca
R. Barão de Mesquita,539 – Tijuca,68

Estacionamento:  No Local

Cafeteria : Sim

Telefone: (21) 4020-2101

Classificação indicativa:  Classificação Livre para todas idades

 

Paty Lopes (@arteriaingressos). Foto: Divulgação.

 

Facebook: @PortalAtuando

 

 

 

 

Author

Dramaturga, com textos contemplados em editais do governo do estado do Rio de Janeiro, Teatro Prudential e literatura no Sesi Firjan/RJ. Autora do texto Maria Bonita e a Peleja com o Sol apresentado na Funarj e Luz e Fogo, no edital da prefeitura para o projeto Paixão de Ler. Contemplada no edital de literatura Sesi Fiesp/Avenida Paulista, onde conta a História de Maria Felipa par Crianças em 2024. Curadora e idealizadora da Exposição Radio Negro em 2022 no MIS - Museu de Imagem e Som, duas passagens pelo Teatro Municipal do Rio de Janeiro, com montagem teatral e de dança. Contemplada com o projeto "A Menina Dança" para o público infantil para o SESC e Funarte (Retomada Cultural/2024). Formadora de plateia e incentivadora cultural da cidade.

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