
Na semana passada, o projeto Vozes Negras homenageou Dolores Duran e Alaíde Costa. Não sou fã do estilo musical, mas que é bom, disso não tenho dúvidas. Foi uma delícia ouvir as artistas que cantavam com tanta maestria a dor de cotovelo das divas.
Desta vez quero dar ênfase ao cenário, que era repleto de classe e autenticidade histórica. No palco, uma boate foi recriada com cadeiras, mesas, piano, cortinas vermelhas e uma bola de espelhos. Tudo tão convincente que me transportei facilmente do presente ao passado. A cenógrafa não precisou recorrer a muitos objetos de cena — menos é mais. Lindíssimo!
Também destaco a dramaturgia, que brinca ao deixar claro quem já não está neste plano, arrancando risos tímidos da plateia. Mas o grande destaque foi a presença de Johnny Alf. Não sei se essa escolha partiu do historiador, dos dramaturgos ou talvez da direção musical; só sei que a homenagem foi mais que necessária. Esse nome foi invisibilizado quando falamos da Bossa Nova. O personagem surge no palco ao lado da cantora Alaíde Costa, sua amiga. Wladimir Pinheiro interpretou Johnny e também assinou a direção musical, com excelência. Ao final, seu texto caiu como uma luva: quando, aplaudido, disse não precisar das palmas, logo compreendeu o gesto de reparação do público e afirmou: “Sim, podem aplaudir!”. E como devemos aplaudir! Afinal, ao falar de Bossa Nova, nomes como Nara Leão, Tom Jobim, Carlos Lyra e Vinícius de Moraes dominam, como se Johnny não tivesse feito parte desse núcleo.
Se a Bossa Nova tem um marco importante em 1958, com João Gilberto gravando Chega de Saudade, de Tom e Vinícius, já em 1955 Johnny Alf e João Donato apresentavam esse estilo musical na Boate Hotel Plaza.
O que dizer de Alaíde, que também é pouco lembrada na história da Bossa Nova? Ainda mais sabendo que foi convidada por João Gilberto para frequentar as reuniões. Vale destacar que ela já era conhecida e respeitada antes de se juntar ao grupo, mas enfrentou preconceito racial por ser negra e acabou sendo excluída do núcleo principal do movimento.
Mesmo eu não sendo tão fã dessas canções sentidas, a verdade é que Dindi permanece guardada em mim, na voz melódica da artista.
Analu Pimenta e Maria Vitória mais uma vez brilharam em suas atuações.
Fico a refletir: atualmente, qualquer comportamento racista em uma plateia é prontamente reprimido por artistas no palco. Mas naquela época não era assim. Elas se calavam. São mulheres que merecem todo o respeito do mundo.
A mediadora e apresentadora Lu Vieira subiu ao palco com sua voz doce e sorriso encantador. Ela apresentou as atrizes e cantou com uma delas, com Dolores Duran, reforçando o motivo de sua presença no espetáculo. Impecável. Em um dos momentos, trajando um figurino de garçonete, mostrou-se completamente à vontade, como se o palco fosse sua casa: leve e natural. Ora surgia com bandeja, ora fumando, ora servindo um pastel, sempre com uma postura refinada e ilimitada em termos de expressão artística.
A plateia, em alguns momentos, cantou junto, acompanhando as canções em coro suave, mostrando que as homenageadas seguem vivas dentro de nós. Bravo!
Nesta semana teremos Elza e Alcione. Eita! Deixa a gira girar, fazer a nossa kizomba, do jeito que sabemos!
Sinopse
O terceiro espetáculo da série musical Vozes Negras – A Força do Canto Feminino exaltará o Samba-Canção e a Bossa Nova, homenageando duas de suas maiores estrelas Dolores Duran e Alaíde Costa. Duas mulheres negras, de origem pobre, fizeram história na música brasileira. Desde cedo aprenderam que para vencer na vida, precisam batalhar e lutar contra as adversidades do sistema. No meio de muito revés, Dolores Duran e Alaíde Costa nunca deixaram de sonhar e cantar. No repertório musical, grandes sucessos de Dolores e Alaíde.
FICHA TÉCNICA
- Idealização e Direção Geral: Gustavo Gasparani
- Dramaturgia e Roteiro Musical: Gustavo Gasparani e Rodrigo França
- Direção Musical e Arranjos: Cláudia Elizeu e Wladimir Pinheiro
- Pesquisa Histórica e Musical: Rodrigo Faour
- Consultoria de Representações Raciais e de Gênero: Deborah Medeiros
- Coreografia: Junior Scapin
- Cenário: Mina Quental
- Figurino: Wanderley Gomes
- Desenho de Luz: Ana Luzia de Simoni
- Desenho de Som: Gabriel D’Angelo e Joyce Santiago
- Visagismo: Mary Santos
- Diretores Assistentes: Marluce Medeiros, Menelick de Carvalho e Sueli Guerra
- Produção de Elenco: Elenco Negro Casting por Mônica Nega e Gabriel Bortolini
- Direção de Produção: Bianca Caruso
- Direção Artística e Produção Geral: Aniela Jordan
- Direção de Negócios e Marketing: Luiz Calainho
SERVIÇO
- Temporada de 04/09 a 12/10/2025. De Qui. à Sáb: às 20h00. Dom.: às 19h00
- Teatro Adolpho Bloch
Rua do Russel , 804 -Glória, Rio de Janeiro – RJ - Os ingressos podem ser comprados : https://www.ingresso.com/espetaculos/vozes-negras

Paty Lopes (@arteriaingressos). Foto: Divulgação.

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