O SER-MÃO DA BISPA DE WASHINGTON

O SER-MÃO DA BISPA DE WASHINGTON

*Luis Turiba

              – 1 –

– nós não precisamos deles!

disse ele.

– nós ainda estamos aqui, respondemos

em nossas orações mais profícuas

 

             – 2 –

misericórdia, Senhor!

o ser-mão da bispa Mariann

surge em cena como flecha enviada por Oxóssi

para o novo morador da Casa Branca,

aquele do topete fios de ovos com ouro

que nos espiava com olhar de rapina

em sua fala de superioridade racial.

perdoai-vos, Senhor!

ele só se conecta com as big techs

nenhum remorso, traço humano inumano

sustenta seu gado texano

nesse novo far west,

onde indígenas navajos & siouxs

foram dizimados pela supremacia do cow-boy macho & branco

migrantes mórmons judeus sul-africanos e eslovenos.

ah! a voz da bispa ousada de fala mansa

corajosa desbravadora calma & zen,

nos gestos nas essências, nas certezas dos

humildes, tributo ao guerreiro de Nazaré,

o menino Jesus, imigrante renascido

naquela “sinagoga” de Washington.

 

                      – 3 –

o tempo fechou, raios, relâmpagos,

nevou, temperaturas glaciais.

a nova e tenebrosa Noite dos Cristais

o foco da sua pregação, porém, iluminou o povaréu fugidío;

os latinos & os chinos, lúmpens perseguidos,

gays, lésbicas, torturados por preconceitos,

sem direitos a nada no mundo.

fim dos empregos, dos sonhos, das senhas.

a tribo da LGBTQUIA+ massacrada

aleluia, axé, namastê, shalon, amém,

– mr President,  olhai por nós!

 

         – 4 –

a bispa pediu clemência na cara do rei de ouros,

para os sem-dólares e os sem green-cards.

pra quê vestir a verdade de mais ou menos?

por que pedir desculpas pelo dito?

invisíveis somos invencíveis!

 

                 – 5 –

o ser-mão ecoa concerto de violino, seus hinos,

seus desafinos na busca da Mãe – o seu destino,

american culture sobreviverá.

blues jazz sapateados

um dueto de Simon and Garfunkel

louvando a América ao Som do Silêncio

em plena primavera do Central Park.

novo filme de Woody Allen

fora do circuito de Hollywood.

 

                  – 6 –

o ser-mão se ilumina na catedral

de Washington,

como um incêndio na floresta seca das montanhas

sem pais nem mães.

 

                – 7 –

 há um reacender do american way inapagável

 naqueles cadernões dos senões.

mesmo assim, um rebolado de Elvis Presley

entre as mesas

os protestos de jovens soldados

contra a guerra do Vietnam,

uma dança nocauteante de Cassius Clay

no ringue das desilusões;

um canto de Nat King Cole numa canção

de Cole Porter sustentando amores impossíveis,

uma cesta mágica de Magic Jonhson

num jogo que não terá fim.

a gaita folk de Bob Dylan and

a song of Joan Baez, se autossustentam.

as vozes das rainhas negras

Billie Holiday, Ella Fitzgerald

Diana Ross, Aretha Franklin

Nina Simone, Donna Summer

Tina Turner, Rihanna e Madonna

louvam a liberdade

nos cânticos da bispa Mariann.

 

Revisão: Rose Araujo

Texto de LUIS TURIBA

Luis Turiba em Brasilia. Foto de Rose Araujo.

*Luís Turiba é jornalista aposentado, poeta com 3 livros editados pela 7 Letras do RJ, e outros 8 livros no campo da poesia independente e/ou marginal.É editor da revista anual de invenções poéticas Bric a Brac, criada em Brasília, em 1985. A Bric a Brac 8, última edição, saiu em 2022, uma celebração ao centenário da Semana de Arte Moderna de 1922 e ainda pode ser encontrada nas melhores livrarias de Ramos.

@luisturiba

 

 

 

 

 

Author

Pernambucano, carioca, brasiliense, planetário. Rubro-negro e mangueirense. Pai de cinco filhos, avô de cinco netos. O brasileiro Luiz Artur Toribio, conhecido no universo poético como Luís Turiba, inventou e editou a partir de 1985 - ano da eleição de Tancredo Neves/José Sarney para presidente e vice da Abertura Democrática - o primeiro número (1) da revista de invenção poética Bric-a-Brac. Ao longo dos anos 80 e 90 foram confeccionadas seis edições com uma média de 100 páginas e tiragem nunca inferior a mil exemplares, que saíam anualmente com poemas textuais e gráficos; ensaios fotográficos e entrevistas que se fizeram históricas com Augusto de Campos, o bibliófilo e acadêmico José Mindlin; o cantor e compositor Paulinho da Viola; o poeta pantaneiro Manoel de Barros – entrevista feita com trocas de cartas ao longo de seis meses e resultou em 15 páginas na revista -, além da psiquiatra Nilse da Silveira, do babalorixá franco-baiano Pierre Verger; e uma visita-entrevista a Caetano Veloso com a presença de Augusto de Campos. A Bric-a-Brac era editada coletivamente por Luis Turiba, João Borges, Lúcia Leão e o extraordinário designer Luis Eduardo Resende, o Resa, com seu traço inconfundível. A última Bric foi editada em Belo Horizonte em 2022, uma celebração ao centenário da Semana de Arte de 22 com um artigo histórico de Augusto de Campos comentando as relações do grupo Noigandres com os modernistas Mário e Oswald de Andrade. Mas afinal, quem é Luís Turiba? Jornalista e poeta, cronista da vida do brasileiro comum, Turiba é pernambucano do Recife, “cidade pequena, porém descente”, terra de Manuel Bandeira, João Cabral de Mello Neto, Capiba, Luiz Gonzaga e Chico Science. Aos 23 anos, iniciou sua carreira de Repórter no jornal O Globo e depois na editora Bloch/Manchete. A convite, mudou para Brasília, onde foi trabalhar na sucursal do jornal Gazeta Mercantil, editor de Matérias Primas, onde teve a oportunidade de cobrir e conhecer obras e projetos do chamado “Brasil Grande”, como a Transamazônica e o garimpo de Serra Pelada, e outras na região amazônica. Em Brasília, como repórter, ganhou alguns prêmios, entre os quais destacam-se dois Prêmios Essos: um no Jornal de Brasília, contando detalhes de um encontro do seu estagiário Renato Manfredini (no Jornal da Feira do Ministério da Agricultura), o Renato Russo da banda Legião Urbana, com o então todo-poderoso ministro da Agricultura Delfim Neto. O outro Esso foi no Correio Braziliense, com uma cobertura coletiva sobre as áreas públicas brasilienses que estavam sendo legalizadas para a construção de condomínios residenciais para residências de altos funcionários e militares que serviram à ditadura militar. Teve experiências no Jornalismo Político, na Assessoria de Imprensa da Câmara dos Deputados, durante a Assembleia Constituinte que formulou a Constituição de 1988. Na ocasião, assistiu do plenário da Câmara dos Deputados, a famoso discurso do jovem líder indígena Ailton Krenak, que falou vestindo um terno branco e pintando o rosto com pasta preta de jenipapo. Cobriu toda a campanha das Diretas Já e a eleição de Tancredo Neves pelo Colégio Eleitoral para a presidência da República em 1985. Na ocasião, Tancredo criou o Ministério da Cultura e convidou para ser seu ministro o deputado mineiro José Aparecido. Anos depois, com a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva para presidente, Turiba foi convidado para ser Assessor de Comunicação do MinC na gestão de Gilberto Gil, entre 2002 e 2005. Editou um pequeno livro sobre a política do “Do-In Antropológico”, os Pontos de Cultura e os discursos programático do compositor de “Domingo no Parque” à frente do MinC. Em 2003, produziu os documentários "Gil na ONU" e “A Capoeira no Mundo”, com um programa mundial para a Capoeira. Ambos foram editados em DVDs com o apoio da Natura. Paralelamente à sua carreira de repórter/jornalista, publicou livros de poesia no Rio e em Brasília. Estreou com “Kiprokó”, em 1977, e depois o destaque ficou por conta do premiado “Cadê”, que venceu o Prêmio Candango de Literatura, em 1998. Voltou a morar no Rio de Janeiro em 2010, quando se aposentou do jornalismo. No Rio, publicou três livros de poesias pela editora carioca 7 Letras: “Quetais”, em 2014; “Poeira Cósmica” e em 2020, o “Desacontecimentos”, em 2022. Desde 2023, escreve um romance jornalístico-poético com suas experiências pelo mundo político com histórias vividas no histórico ano de 1968; a prisão pelo DOI-Codi em 1972; a abertura democrática e a Constituinte de 1988; a eleição de Tancredo/Sarney no Colégio Eleitoral; a eleição de Lula em 2002; o retrocesso provocado pela eleição do direitista negacionista que tentou um atrapalhado golpe de Estado em 2023. Título do livro que deve ser editado em 2025: “VIVA ZÉ PEREIRA; Aventuras e Desventuras de uma geração”. Ele já avisou: “o livro será um calhamaço de mais de 400 páginas, um rico material iconográfico e as dez principais entrevistas culturais que fiz na minha carreira e pelo menos 100 poemas inseridos na sua narrativa.” Turiba orgulha-se de ter nascido no mesmo ano que o Estádio do Maracanã, onde a seleção brasileira perdeu o jogo final para a seleção uruguaia por 2 a 1 e mostrou ao mundo, segundo Nelson Rodrigues, “todo o seu complexo de vira-latas”. Apesar da data possuir uma aura de trauma coletivo para os amantes do futebol, o personagem em questão considera esta data uma conquista aos avessos. “Quem viveu um “Maracanaço” só poderia ter como compensação o negro Pelé, filho da terra e redenção humana para a conquista de cinco Copas do Mundo. Por isso, o karma da derrota em 50 “não me pertence. Nem a mim, nem à minha geração. Vivemos a glória de uma geração futebolística pentacampeã do mundo. A única. Perdemos o complexo de vira-latas””, costuma afirmar orgulhoso o poeta editor da Bric-a Brac e agora colunista.

4 comments

  • Grande grito de liberdade, Turiba! Salve a arte, meu poeta-irmão! Parabéns! O mundo não explodirá enquanto houver poetas e artistas, ainda que imploda nas mãos dos covardes e idiotas!

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  • Artigo assertivo, poema músico-cultural, sensorial, trazendo dores reais, atuais, atingindo a boca do estomago… Seu olhar traduz nossa indignação: juntos somos mais re]existência. Evoé, parabéns, meu amor.
    Rose Araujo.

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