“Logo que entrei para a faculdade, há 10 anos, eu dizia que tinha pressa, pois não tinha muito tempo para desfrutar e expressar toda a criatividade que ficou reprimida durante tanto tempo… mas aprendi que, na arte como na vida, é preciso dar um passo de cada vez!”
Nascida numa Belo Horizonte bucólica e florida há sessenta e seis anos, a artista plástica Rosângella Menezes desde pequena se interessava não pelas lições, mas pelos lápis de cor e os cadernos de desenho.
E, apesar disso, a arte entrou de vez em sua vida relativamente tarde: quando ela passava dos 55 anos. E foi a melhor coisa que lhe aconteceu…
Como começou a pintar?
Depois de passar por alguns cursos universitários, sem me encontrar em nenhum, acabei fazendo um curso de estética e maquiagem, pois as cores e os pincéis eram tudo o que eu queria… Morei alguns anos no Rio de Janeiro e lá trabalhei como maquiadora.
Quando voltei a Belo Horizonte (MG), fiz outros cursos, casei, descasei, troquei de profissão, até que resolvi fazer o curso de graduação em Artes Plásticas, há 10 anos. Hoje, acredito que todas as experiências pessoais e profissionais foram dando suporte para a artista que me tornei. A pintura só entrou pra valer na minha vida na Escola Guignard. Foi amor à primeira pincelada.
Até então, procurava representar a realidade nos retratos a carvão ou grafite. Na Escola, tive o primeiro contato com a fotografia e fui incentivada a observar que a pintura possui elementos que têm parentesco com a fotografia, como a gradação de luz, a nitidez do registro, o enquadramento, a transparência e a densidade que emprego como meios expressivos potencializadores das imagens.
Desde então, minha tentativa de representar a realidade não se trata de rivalizar com a fotografia ou imitá-la, mas verificar as diferenças e aproximações entre os dois recursos, por exemplo, o instantâneo da máquina contra a demora que a pintura requer, ou a imprevisibilidade e o controle que se pode exercer com cada meio.
Como é o seu processo de criação?
Sofrido e intenso! Passo muito tempo em busca de uma cor, um tom, uma imagem que represente aquilo que imaginei. É difícil descrever o processo de criação, pois cada um é único. Às vezes, parte de uma ideia ou de um sonho, de uma imagem ou de uma leitura, ou de nada disso ou de tudo isso! Pesquiso muito, vou a exposições e, sempre que posso, faço cursos que possibilitam um novo olhar e uma nova forma de expressão!
Seu trabalho tem uma forte presença do elemento água. Por que essa predileção?
Essa fase teve início com uma série de pinturas baseadas em fotos antigas de meu filho brincando com água no jardim de nossa casa. Muitas telas foram produzidas com esta mesma característica mas, ao me deparar com uma foto onde ele brincava na piscina, comecei a me interessar pelas distorções das imagens provocadas pela luz refratada e pelos reflexos que desintegram os corpos em movimento dentro d’água.
Em 2011, expus “Piscina”, uma instalação na qual faço uma analogia entre o objeto piscina e a ideia que temos de obra de arte. Podemos pensar que o deslocamento do trabalho da parede para o chão não rompe com as bordas tradicionais da tela, mas romperia os limites da imagem pintada para além da realidade bidimensional do suporte. A “Piscina” é um convite de imersão na obra.
Em 2013, realizei a mostra “Além do Mergulho”, na qual as figuras humanas – sobretudo femininas – aparecem quase sempre solitárias e imersas em piscinas.
Que outros temas aparecem em sua obra?
Atualmente, estou mergulhada numa pesquisa que, de certa forma, é uma extensão do que já vinha trabalhando: a introspecção, a solidão, o recolhimento do homem contemporâneo.
As pinturas evocam essencialmente a quietude e o silêncio. Quase todos os indivíduos retratados são baseados em fotos feitas por mim, por amigos, ou retiradas da internet, e aparecem quase sempre isolados realizando atividades comuns, corriqueiras. Delas emana uma natureza ora calma e contemplativa, ora fria e solitária.
Ao transportar esses motivos para a tela, procuro desconectar do modelo fotográfico através de um processo de eliminação. Para isso, vou removendo todo o conteúdo supérfluo até que nada desvie a atenção da cena que desejo enfatizar.
Além desses trabalhos, pinto retratos sob encomenda.
O que te emociona e te leva a pintar?
Normalmente, não busco um tema específico; eles chegam até a mim e eu fico totalmente seduzida. Daí em diante, parto para a pesquisa de “como fazer”, como traduzir para a pintura aquele tema.
Sou muito intensa e emocional e, às vezes, passo meses pensando em determinado tema, mas o resultado dessa busca geralmente chega de forma totalmente inesperada…
Você acaba de abrir um ateliê coletivo. Fale sobre essa iniciativa.
Sabe aqueles versos da música “Prelúdio”, de Raul Seixas: “Sonho que se sonha só é só um sonho que se sonha só… Mas sonho que se sonha junto é realidade!”
Pois é: depois de muito tempo sonhando só, encontrei as parceiras certas para a realização de um projeto antigo de montar um Ateliê Coletivo onde, além de darmos aulas de pintura, desenho e cerâmica, faremos parcerias com outros artistas e professores da área cultural.
Já temos um nome: AREA/ Ateliê de Artes, que utiliza a inicial de cada uma das artistas: ANA, ROSANGELLA, ELENIR e ANDREA, além de fazer menção à grande área disponível para trabalhos. Mas falaremos mais disso em breve, ok?
Quais são os próximos projetos?
Nossa… são inúmeros! Por enquanto, estou muito envolvida com a montagem da AREA, ministrando cursos e pintando retratos. Mas a cabeça está fervendo! (rsrsrs)
Talvez volte às águas!
E qual é o seu sonho profissional?
Logo que entrei para a faculdade, há 10 anos, eu dizia que tinha pressa, pois não tinha muito tempo para desfrutar e expressar toda a criatividade que ficou reprimida durante tanto tempo… mas aprendi que, na arte como na vida, é preciso dar um passo de cada vez!
Estou em início de carreira, embora já esteja com 66 anos. Vejo um mundo à minha frente e vou seguindo meu caminho plantando minha arte. Pode ser que ainda colha os frutos deste trabalho. Pretendo empreender no campo cultural e continuar produzindo muito, viajar, conhecer o mundo, participar de residências artísticas e fazer meu trabalho circular cada vez mais.
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