Há 1 ano, projeto educativo na Apae de Florianópolis inclui alunos através da dança, música, artes visuais e teatro

Há 1 ano, projeto educativo na Apae de Florianópolis inclui alunos através da dança, música, artes visuais e teatro

A inclusão através de expressões artísticas como a dança, a música e o teatro tem sido realidade para um grupo de pessoas com deficiência, em Santa Catarina. Há 1 ano, teve início o projeto Companhia de Dança Lápis de Seda – Um Novo Olhar Para a Apae de Florianópolis, coordenado pela bailarina, coreógrafa e educadora Ana Luiza Ciscato, que defende o lúdico como uma ferramenta sensorial no aprendizado de pessoas com deficiência. O projeto é financiado pelo Programa Nacional de Apoio à Atenção da Saúde da Pessoa com Deficiência (PRONAS) e chancelado pelo Banco Itaú. Ao final do projeto, será realizado espetáculo, que unirá as diferentes áreas artísticas desenvolvidas com os alunos.

Com aulas regulares, o projeto atende um total de 100 pessoas, sendo que 94 são alunos da própria Apae e 6 são bolsistas com deficiência da Cia Lápis de Seda, da qual Ana é diretora. “O projeto vem gerando experiências positivas para todos os envolvidos, tanto os alunos, que se mostram comprometidos e felizes com o processo, quanto os profissionais, que trabalham suas diferentes linguagens artísticas, rompendo fronteiras para criar uma linguagem única” conta a diretora do projeto.

Ana Ciscato informa que “a ideia principal do projeto foi o compartilhamento de um resultado muito positivo atingido pelos bailarinos da Lápis de Seda – Cia de Dança Inclusiva. Trabalho que desenvolvi em uma caminhada de trinta anos, debruçada sobre o estabelecimento de uma técnica sólida, que consiste em um acompanhamento detalhado do desenvolvimento físico, social e intelectual da pessoa com deficiência”, conta a educadora.

Com sólida experiência na condução de grupos de dança mistos, que incluem pessoas com algum tipo de deficiência motora e/ou intelectual, Ana tem na bagagem experiências como o convite, em 2011, da organização não governamental britânica Diverse City e do British Council para integrar o projeto Breathe, que posteriormente resultou em Battle for the Winds/Breathe, espetáculo de abertura dos Jogos Náuticos nas Olímpiadas de 2012, em Londres no qual entrou “Brasileiríssimo”, coreografia concebida por Ana Luiza Ciscato para a turnê inglesa. Entre outras cidades e lugares, esteve no LiveSite – palco ao ar livre criado para a abertura dos Jogos Náuticos, em Weymouth, na Inglaterra.

Lugares de Pertencimento

Por meio de encontros, aulas, palestras, oficinas e a descoberta de novas inteligências e novos lugares de pertencimento, “a dança surge como ferramenta essencial para que cada corpo expresse suas limitações e eficiências na busca por segurança, equilíbrio e a conquista do direito individual à ocupação livre do olhar público”, explica Ana Ciscato.

“Para desenvolver um trabalho inclusivo, é necessário abraçar uma visão inclusiva de mundo. Conhecer o desenvolvimento das pessoas e acreditar nesse processo através da conscientização de que todos temos reconhecimentos, inteligências e capacidades diferentes”, defende ela.

O resultado do desenvolvimento através do projeto, também é destacado no depoimento da bailarina com Síndrome de Down Ana Flávia Piovezana dos Santos, que participa do projeto desde o início: “A minha experiência está sendo muito boa. Estar entre amigos me faz muito feliz. O projeto me faz pensar mais em mim, no meu desenvolvimento, na minha capacidade na dança e está me melhorando como pessoa. O projeto me transforma, me faz sentir outra pessoa, muito melhor do que já sou. Eu me surpreendi muito, aprendo passos diferentes, poses diferentes. É uma forma de eu poder me expressar melhor – dançando.”

Lisiane Bonatelli, Coordenadora pedagógica da Apae, avalia que o projeto usa as expressões artísticas como um grande caldeirão de possibilidades. “Nele vejo porções de respeito, doses de expressão corporal, punhados de autoestima, pitadas de alegria e entusiasmo”, revela. “Tudo isso remexido a muitas mãos. Mãos que, através do conhecimento e ternura exploram o que há de melhor nas pessoas com deficiência. Ter esse projeto junto à Apae Floripa agregou muito no processo de aprendizagem, pois de certa forma acaba complementando aspectos importantes nas aquisição de habilidades funcionais e na melhora da qualidade de vida dessas pessoas.”

Integração de Linguagens

“O que mais me encanta nesse projeto é ter a oportunidade de observar e vivenciar a forma como a integração das várias linguagens artísticas que ele propõe trazem potência e aceleram a conexão, evolução técnica e a sensibilidade dos alunos”. Essa percepção é compartilhada por Roberta de Oliveira, que é bailarina, professora e uma das monitoras das oficinas no projeto da Apae. Para ela, envolver os alunos com música, dança, artes plásticas e teatro “torna algum caminho sempre possível, e multiplica as possibilidades desses alunos dizerem quem são com as ferramentas que dominam”.

As diferentes linguagens artísticas utilizadas, disponibilizadas pelo projeto aos alunos, é um ponto importante também para Heloísa Ferraz, assistente social da Apae em Florianópolis. Para ela, esse fator “oportuniza o desenvolvimento de competências necessárias no processo educativo, pois são ferramentas que vêm a agregar na aprendizagem e apreensão do cotidiano”. E continua: “Este projeto oportuniza aos usuários da Apae a aquisição de competências e habilidades fundamentais para o seu cotidiano como melhora na atenção, autopercepção, na comunicação e interação social, amplia suas possibilidades de expor e vivenciar diferentes emoções. A assistente social reflete que a arte, nas suas diferentes linguagens, permite que o indivíduo imprima sua marca pessoal, respeite a sua subjetividade, valorize o potencial dos envolvidos. Isso é inclusivo.”

Maura Marques, que também é bailarina e monitora nas oficinas, ressalta que, assim como ela, o que chama a atenção é perceber que os alunos amam estar ali, no projeto. “O que me chama atenção é perceber que os alunos envolvidos no projeto também amam arte, de uma forma mais pura e ingênua, sem a preocupação em defini-la ou sem a astúcia de tentar se encaixar ou se enquadrar num modelo que exista. Isso é inspirador ! “, diz. Para Maura, “a simplicidade e autenticidade de cada um, unidos complementam-se (me incluo) e transformam todos os olhares”.

Capacidades sonoras

No grupo de profissionais que monitoram oficinas, também há a presença de Cláudia Passos, que é pianista, cantora e compositora. “Minha participação neste projeto tem sido a de trabalhar a música como ferramenta de expressão, memória e desenvolvimento das capacidades sonoras e rítmicas do grupo, respeitando as individualidades”, compartilha a artista.

Em seu trabalho voltado para a turma de idosos da Apae, por exemplo, “o foco está mais voltado para os recursos da voz e do canto no sentido de apropriação de elementos como altura, intervalo, duração e dinâmica.” Segundo Cláudia, desde o início do projeto, em novembro de 2021, o processo de aprendizagem tem sido pautado pela entrega e interesse do grupo em participar das atividades propostas. “Mais do que resultados ou objetivos, esse retorno do empenho em aprender os conteúdos na ação do fazer musical é fundamental e tem sido muito gratificante acompanhar este processo dos alunos.”

A arte como educação e cuidado

Fábio Yokomizo, que ministra a oficina de teatro dentro do projeto, conta que a experiência da Cia Lápis de Seda, da qual ele faz parte, com a Apae, “trouxe muitos aprendizados, nos últimos meses”. Ele diz que “apesar de já trabalharmos como um grupo dentro da cia, não tínhamos ainda desenvolvido a habilidade de ministrar aulas em conjunto. Foi um desafio prazeroso aprender a ministrar nossos desejos enquanto grupo e os meus individuais, com os dos alunos e da instituição (Apae).”

O professor destaca que tem sido desafiador trabalhar com os idosos, pois eles demandam uma atenção ainda maior. “Nesse grupo, existem diversos atravessamentos para além das questões impostas (e ao mesmo tempo, propostas) pela deficiência de cada um, como por exemplo o surgimento de dificuldades físicas na locomoção, no cuidado do contato, na escuta, no ato de prestar atenção e focar.”

Paulo Soares, que ministra oficinas de confecção de objetos cênicos e teatro, também destaca a importância da interação de bailarinos da Cia Lápis de Seda com alunos da Apae. “O ensino-aprendizado de atuar com a Cia nesse projeto em conjunto com a apae é enriquecedor, pois desenvolvo minhas habilidades de comunicação à medida que busco criar um laço de confiança”, explica o artista. Ele acredita que o aprendizado acontece “quando estamos dispostos a ouvir a si mesmo e ao outro. Nesse ano, pude ouvir e, com tentativas e acertos, encontrei maneiras de passar o conhecimento que tinha e pude me sentir completamente envolvido com o jogo teatral, quando isso aconteceu.”

Fotos Cristiano Prim

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