O diretor artístico de Desalma, Carlos Manga Jr, conduziu a direção da série com um objetivo bem claro: criar um clima de suspense, apreensão e até mesmo um certo incômodo.
“É uma série que trabalha no subliminar. Nosso foco foi criar a atmosfera e gerar um estado de suspensão. Os elementos sobrenaturais existem porque eles fazem parte da atmosfera mística, que é carregada de metafísica. O público sabe que acontece, mas não vê; ele apenas percebe. Esses elementos falam de sobrenatural à medida em que falam de densidade. Se eu pudesse usar três palavras para definir a atmosfera de ‘Desalma’ seriam densidade, estranheza e rigor”, pontua. A série original estreia no Globoplay hoje, dia 22.
O diretor contabiliza uma trajetória com reconhecimento internacional. Ele conquistou sete leões de ouro no Festival de Cannes por seus bem-sucedidos trabalhos em publicidade, uma carreira em que dirigiu Leonardo Di Caprio e trabalhou com outros grandes profissionais do cinema.
Sua primeira passagem pela Globo aconteceu entre 1991 e 1994. Aos 24 anos, foi um dos diretores da novela ‘Vamp’ (1991) e, no ano seguinte, de ‘Despedida de solteiro’ (1992). Além disso, dirigiu três episódios do programa ‘Você Decide’. De volta aos Estúdios Globo, em 2017, Carlos Manga Jr. foi diretor artístico de ‘Se eu fechar os olhos agora’, indicado ao Emmy Awards, e ‘Aruanas’.
‘Desalma’ é uma série original Globoplay, desenvolvida pelos Estúdios Globo, criada e escrita por Ana Paula Maia com direção artística de Carlos Manga Jr. e direção de João Paulo Jabur e Pablo Müller.
Entrevista com Carlos Manga Jr.
Que elementos refletem o gênero sobrenatural?
O grande desafio de fazer gênero é acertar na escolha dos códigos. A primeira coisa para falar da embalagem de ‘Desalma’ é o figurino, que tem dois momentos: um em que ele quase não aparece, mas desperta o interesse; e outro que ele aparece e aborda questões folclóricas. De início, procuramos uma paleta de cores neutra, já que os tons são todos rebaixados. Indo de encontro à direção sugerida, o figurino é todo conectado. No caso de Haia, por exemplo, é preciso que o público acredite que ela bordou sua própria capa, que ela usa aquele casaco há muitos anos ou que foi passado de mãe para filha. Tudo em ‘Desalma’ tem que ter cheiro, você acredita que aquilo é real. Na fotografia, a gente foge dos clichês. Gravamos muitas cenas diurnas no extremo sul do Brasil, onde achamos esse bosque cercado de árvores. A sensação é que a floresta é infinita. São árvores imensas e praticamente geométricas em colunas, onde o sol não consegue ultrapassar. É como se fosse um tabuleiro de xadrez: quando você está no meio desse bosque, você olha em volta e são árvores e mais árvores. A luz praticamente não chega nas pessoas. É muito interessante porque você sabe que é dia, mas a atmosfera é densa, porque o sol não consegue ultrapassar essa barreira. É muito bom não ter que usar a noite e o escuro para ser um código de thriller.
Como você define as três personagens centrais da trama – Haia, Ignes e Giovana?
O personagem da Cássia Kis é central porque ela é o pivô de toda a trama. A Giovana, personagem da Maria Ribeiro, é uma mulher urbana e cosmopolita que chega de São Paulo depois de perder o marido, que é de Brígida e filho de ucranianos. Ela chega com as filhas para ocupar uma casa que é da família dele e, a partir daí, se envolve nessa neblina que faz parte da atmosfera de Brígida. A Ignes perde o irmão e não aceita isso. A gente vê que a perda transpassa os personagens, faz parte da ligação entre eles. Hoje, Ignes tem um filho que sofre os efeitos sobrenaturais de tudo o que a Haia constrói por não ter aceitado a morte da filha. Todos os personagens são muito interessantes, eles são múltiplos e têm muitas camadas. Existe muita complexidade. Como eles são ucranianos, eles têm uma dureza sofrida. Você não vê uma lágrima, mas você sente a dor daquela pessoa.
A trama se passa em duas décadas, numa narrativa de idas e vindas. Que diferenças estéticas e de linguagem você escolheu para cada uma das fases?
Existem várias maneiras de abordar tempos paralelos e épocas diferentes. A gente optou por trabalhar na fotografia de maneiras que o público bate o olho e já sabe. A tendência de cor muda entre as épocas. A década de 80 é mais amarelada, tem uma coisa mais primaveril porque nessa época os jovens eram mais felizes, tinham mais vida. Eles tinham mais colorido, muito antes de as tragédias começarem a acontecer. A fotografia atual tem o dia escuro e denso.
Qual a importância da mistura de grandes nomes da dramaturgia com jovens atores na escalação de elenco?
São dois caminhos. Preencho a série com 75% de um elenco novo, desconhecido do grande público. E uso nomes consagrados em personagens que não estamos acostumá-los a vê-los. Eu acho que essa mistura é que traz essa cara de série para o produto.
Quais foram as vantagens de gravar na Serra Gaúcha?
A Ana Paula Maia foi até Prudentópolis para conhecer a tradição ucraniana no Brasil. Mas depois que a história ficcional foi criada, a gente chegou à conclusão de que em cidades como Antônio Prado encontrávamos uma forma de construção que tinha muito a ver com construções ucranianas. No Rio Grande do Sul, tínhamos cidades muito peculiares e também o bosque, que na história tem elementos como cachoeiras, lagos, floresta.
Sobre o Globoplay
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