Como faço para publicar o meu livro?
Quarta-feira, 16 de fevereiro, 2011, 17h57
Assunto: Como faço para publicar meu livro?
Olá, Sra. Thereza C. R. da Motta
Nasci em São Paulo (1979). Sou músico compositor e letrista. Gravei um disco com minha banda em 2007, e lancei-o em 2009 no cenário independente. Nunca me considerei um poeta, mas comecei a ter inspirações a partir de 2002, até o momento presente. Eu acredito ter mais de 50 poemas, todos manuscritos, e não sei o que fazer com eles. Às poucas pessoas que eu mostrei, gostaram muito e disseram que eu deveria publicá-lo. Mas não me encontro em disponibilidade para tal dispêndio no momento, portanto, venho recorrer à sua ajuda, se possível.
Grato pela atenção.
Sinceramente,
M. V.
PS: Gostaria de ressaltar minha adoração por Edgar Allan Poe, que escreveu “O corvo” e “O Barril de Amontillado”, meus favoritos.
Quarta-feira, 16 de fevereiro, 2011, 20h14
Assunto: Livro
Boa tarde,
Escrevi um livro. É um livro paradidático. Trata-se de um único poema, dividido em partes. Não pretendo, por enquanto, procurar uma editora. Gostaria de ter 100 exemplares deste livro. Não quero nada luxuoso. Nem capa, nem contracapa e nem a encadernação. Um livro simples como muitos que já li e de autores anônimos como eu. A capa e a contracapa não necessitam ser plastificadas. E será tudo em preto e branco. Se o orçamento sair muito caro, não o conseguirei vender e assim não poderei pagar o empréstimo bancário que custeará a impressão e a encadernação do livro. Sou amador. Um autor desconhecido e sem pretensão, que apenas deseja lançar um livro. O livro tem 45 folhas frente e verso e cada folha tem 35 linhas digitadas em espaço simples, tamanho 12 e o tipo de letra é a Century Schoolbook. O exemplar que registrei tem 20 cm de comprimento e 13 cm de largura. Bem simples.
Muito obrigado,
L. M.
Respondendo:
A surpresa começou com o título do primeiro email (os dois recebidos no mesmo dia), “Como faço para publicar meu livro?” Muito boa pergunta. Deve ser a pergunta que se fazem todas as pessoas, todos os dias, enquanto não conseguem publicar aquele livro que têm vontade de escrever, ou que está na gaveta. Impressionante a quantidade de pessoas que deseja isso, sem ter ideia de como começar. E, em geral, começam errado.
Para começar, tentam ajudar o editor, dizendo a ele como querem o livro. Ele só não saberia, se não fosse editor. O editor vê o livro antes de imprimi-lo. Tem essa capacidade de enxergar o futuro, como um livro deverá ser. Imagina o livro antes mesmo de começá-lo. Embora um livro se faça aos poucos. O livro se faz em partes para o lermos inteiro.
O segundo email é o outro equívoco. Editores não são gráficas. Dizer como um livro deve parecer sem mostrar o texto. Um livro é seu texto. Sem texto, não há livro. O tamanho do texto é a preocupação seguinte, mas a principal é saber o que está escrito e como foi escrito. Já me perguntaram se eu posso cobrar uma segunda revisão, se eu descobrir que há mais erros no original do que eu esperava, se o trabalho de edição de texto superar a expectativa de dificuldade. Não. Eu nunca pude cobrar duas vezes pela mesma revisão, mesmo tendo de ler o original dez vezes até acertá-lo.
A complexidade de se fazer um livro começa na organização espacial desse manuscrito. Recebo dezenas de emails me perguntando a mesma coisa e tomei estes dois como exemplo, pois, além de chegarem juntos, mostram dois autores despreparados para publicar, ambos sem dinheiro e ambos de poesia. E ambos sentem a vontade inexorável de serem lidos, já que escrevem em profusão.
Houve outro que me procurou, recentemente, que chegou a me dizer que queria publicar os poemas assim como os escreveu, à máquina, em fac-símile. Eu expliquei que publicar assim seria mais complicado do que digitá-los, pois teríamos de escanear cada poema e imprimi-los como imagem, nada impossível, porém mais trabalhoso do que em texto. Ele logo desistiu da ideia de publicação. Suspirei, aliviada.
Além de precisar explicar o passo a passo do livro, e ir conduzindo o autor pelo caminho, o editor deve ter a premonição do erro. Deve saber quando o autor entrará em pânico, porque pode ser mais complicado do que parece. Há autores que conseguem passar por esse processo, incólumes, mas outros naufragam.
Publicar não é só imprimir. Há todo um meio que é necessário perpassar desde a correção do texto (salve minhas aulas de português do colégio!), até a diagramação final. Há livros que se revoltam no processo. Um deles resolveu furar todas as previsões voltando à estaca zero. Depois de diagramado, descobri erros que não havia percebido durante a revisão em Word. Como assim? Peguei o arquivo em Word e retomei a revisão. Diagramei de novo. Agora o autor me diz que o texto revisado em Word era anterior à última revisão da primeira diagramação. Ai, ai. Por que acontecem essas coisas?
Errar é muito fácil. É só acontecerem duas coisas ao mesmo tempo que nos enganamos. Tocar o telefone e a campainha simultaneamente já nos tira a concentração. Dois livros simultâneos, então, nem se fala. Dois autores. Dois eventos. Dois lançamentos. Ah, e a pressa!
Enquanto faço livros, eu medito. O que aprendo fazendo isso? A perfeição do livro cabe na palma da mão, mas ela é tão fugaz, que basta um sopro para desfazê-la. A gráfica pode atrasar. O diagramador pode errar. Eu posso trocar o texto, mas tudo isso serve a algum propósito que me escapa. Qual o motivo para esses erros? Não é apenas distração. Há livros em que isso não acontece, que, por mais que estejamos atabalhoados, não sofrem com os descaminhos. Mas há outros que simplesmente se encantam.
Meus queridos autores novatos não sabem o que os aguarda. Pode ser um paraíso, e pode ser um inferno, de expectativa e ansiedade. E equilibrar essas forças, fazendo com que o livro saia o mais perfeito, apesar de tudo, é a arte que está por trás do ofício do editor, que, sem saber por que o faz, aceita a missão e a cumpre por paixão.
Obs.: Nenhum dos dois livros foram feitos, porque, além de precisar de coragem para publicar, é necessário ter uma vontade insuperável, para que nada o impeça de fazê-lo. Se impedir, publicar não é o seu sonho, e ainda poderá se tornar um pesadelo.












Eu me reconheci nos dois autores, sobretudo no
primeiro, q se assina M.V.
Mais uma.vez você demonstrou o seu profissiona-
lismo, amor aos livros, zelo e dedicação.
Você iluminou, com suas sábias palavras, os ca-
minhos de muitos autores estreantes e, também, ve-
teranos como eu; mas sem nenhuma publicação
autoral.
Parabéns pelo seu texto extremamente elucida-
tivo! Sucesso!
Antonio Carlos de Oliveira.