Trama em que casal tem uma “DR” turbinada pelas angústias da quarentena é homenagem de Alexandre Machado a Fernanda Young
Primeiro trabalho de Alexandre Machado após a morte de Fernanda Young, sua companheira de décadas e a quem faz uma homenagem neste trabalho, o episódio, que foi integralmente gravado de forma remota, mostra como a exaustão pela convivência excessiva pode afetar uma relação. “O confinamento forçado leva as emoções ao extremo, e nos vemos vivendo conflitos antes inimagináveis, sobre os assuntos mais prosaicos. Na história, acompanhamos como um casal reage a um panelaço, transformando uma crise política numa crise matrimonial. Vemos a dor e o ridículo disso”, diz Alexandre.
A gravação integralmente remota é um dos destaques deste e dos demais episódios da série a serem exibidos. Todos têm direção artística de Patricia Pedrosa. “Este e os próximos episódios foram exclusivamente gravados pelos nossos atores. Eles que operaram a câmera, montaram equipamento, se maquiaram, prepararam o set, tudo que uma equipe de dezenas de pessoas costuma fazer numa série”, comenta a diretora, que lembra outros detalhes importantes que diferenciam a gravação remota de uma presencial. “A câmera usada é mais simples, para que eles consigam operar. Praticamente não há equipamentos de luz e o cenário é a própria casa deles. É, portanto, uma estética mais artesanal, documental, experimental”, destaca Patricia.
“A gente trabalhou duríssimo para colocar esse episódio na rua. O Lázaro tem muito mais knowhow do que eu tecnicamente, já dirigiu um filme, entende de lente e de coisas que eu não entendo. Tive que me esforçar para fazer e consegui fazer. Até montagem de microfone nós fizemos. A equipe estava remota, nos ajudando muitíssimo, mas não estavam aqui. Eles nos ajudavam, mas dependiam muito do nosso empenho. Então, era empenho dos dois lados, da equipe e nosso. Foi muito bonito de ver esse trabalho colaborativo”, comenta Taís.
Taís e Lázaro contam mais sobre a experiência da gravação à distância na entrevista abaixo.
Taís Araújo – Eu posso ter ficado cansada, mas eu sabia que ia dar certo o tempo todo. Chegaram caixas e mais caixas na nossa casa que precisaram ser higienizadas. Muita gente trabalhou para isso. A minha certeza de que ia dar certo é que o Lázaro sabe mexer nas coisas, porque eu não sei mexer em nada. Se não tivesse ele, não sei como seria. Nós conseguimos ter uma noção dos bastidores. Nossos filhos ficaram metade do processo com a gente e, como eram cenas noturnas, a gente colocava eles para dormir e, de vez em quando, ou um ou outro aparecia no meio.
Lazaro Ramos – Eu acho que todo mundo queria tanto que desse certo que a gente ficou numa concentração e em um empenho que talvez fosse até maior do que se tivesse todo mundo junto, presencialmente. Eu não achava que ia dar errado mas, às vezes, me perguntava se ia chegar ao final daquele dia. E o que alimentava era o prazer de fazer. A gente se organizou para ensaiar um pouquinho antes e, quando sentíamos que a atuação estava fragilizada, a gente pedia para fazer de novo.
Vocês se identificaram com os personagens de alguma forma?
Taís Araújo – Eu estava no auge da personagem. E fiquei muito encantada. Primeiro pela qualidade porque, em 30 páginas, a gente podia exercitar de tudo, do drama à comédia. E era um drama real, que eu também estava vivendo. A gente ria da gente. Quando conseguimos olhar com um certo distanciamento, conseguimos fazer graça.
Lázaro Ramos – A gente acha que tudo que acontece na série a gente era capaz de fazer na vida. Só na pandemia.
Taís Araújo – No início da pandemia, eu estava muito perdida e fui entender como a minha casa funciona, como seria essa convivência com as crianças e com o Lázaro o tempo inteiro. E eu fui ficando nessa loucura, mas com muito medo. Pelos meus pais, por tudo. Mas hoje eu estou muito mais tranquila emocionalmente com a casa e com meus filhos. Entendo os meus períodos de ficar sozinha e os de Lázaro também.
Lázaro Ramos – A gente nunca tinha parado para notar como é a nossa dinâmica, nossa rotina, mesmo com 16 anos de casados. E a mesma coisa com os nossos filhos. Nunca conhecemos tanto os nossos filhos quanto agora, tanto as forças quanto as fragilidades. E aí são expostas, também, as nossas forças e fragilidades. Eu acho que a dica da quarentena é saber calar e escutar, porque pandemia não é hora de ter DR. Ninguém está em seu estado natural. Acho que quem passar a pandemia e continuar casado não separa nunca mais.
Como foi trabalhar juntos novamente, mas numa situação totalmente nova?
Taís Araújo – A gente já tinha feito par romântico algumas vezes. Esse trabalho veio para fortalecer a nossa relação. Foi uma oportunidade de redescoberta do que a gente podia fazer. Temos a sorte de conseguir trabalhar junto, e essa série, neste momento, veio para nos fortalecer. O resultado desse trabalho ajudou a ficar no eixo. Estávamos muito angustiados, muito à deriva nesta quarentena. Agora, parece que virou uma chave.
Lázaro Ramos – Temos uma relação em que o nosso trabalho só nos faz bem. Acho que a gravação de ‘Amor e Sorte’ foi a nossa virada de humor. Costumamos ser muito envolvidos pelos projetos que fazemos. E esse é muito especial por causa do texto do Alexandre Machado. O texto é muito inteligente porque o Alexandre tem o jeito de ver comédia, de ver o mundo e de ver os casais. Digo, sem sombra de dúvidas, foi um dos trabalhos mais prazerosos que eu já tive ao longo desse tempo todo na Globo.
‘Amor e Sorte’ é uma série em quatro episódios, criada por Jorge Furtado. O episódio ‘Linha de Raciocínio’ tem roteiro de Alexandre Machado, direção artística de Patrícia Pedrosa e direção de Lázaro Ramos.