A partir de hoje aqui em nosso Canal DANÇA contaremos com a colaboração também do mestre Paulo Marques que irá nos indicar espetáculos e textos sobre o mundo da Dança.
Paulo Marques
Paulo Marques iniciou sua carreira de dança e teatro em 1980, desde então tem atuado como ator, bailarino, mestre de balé, coreógrafo, pesquisador em dança, curador, ensaiador e diretor de movimento em importantes companhias de dança contemporânea, ocupações e espaços de dança no Rio de Janeiro como: Rede Globo de televisão, Rede Manchete de televisão, Ballet Officina do Rio de Janeiro (Edmundo Carijó e Lourdes Braga); Sylvio Dufrayer Companhia de Dança; Marcio Cunha Dança Contemporânea; Márcia Rubin Companhia de Dança; Staccato Dança Contemporânea (Paulo Caldas); Ana Vitória Companhia de Dança; Companhia dos Atores Bailarinos (Regina Miranda); Lia Rodrigues Companhia de Danças; Esther Weitzman Companhia da Dança; Companhia do Ateliê coreográfico (Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro) ; Os Dois Cia. de Dança Contemporânea (Giselda Fernandes) ; Teatro XIRÊ (Andrea Elias) ; Cia. Étnica de Dança (Carmem Luz); Gisele Alvim espaço de dança; Base Dinâmica (Guilherme Veloso e Rafaela Amodeo); Angel Vianna Escola; Corpus Núcleo de Dança (Denise Barbosa Milward) Juiz de Fora.
Segue abaixo a primeira colaboração, um trecho de Frederico Lourenço (Estética da Dança clássica):
George Balanchine
“Na Rússia czarista, a escola de ballet em Sampetersburgo era uma instituição de ensino gratuito que, tal como o colégio militar ou o colégio naval, funcionava sob alçada e mecenato do monarca. O jovem George Balanchine, por exemplo, tendo falhado aos dez anos a admisão no colégio naval, conseguiu (muito contrariado, mas obrigado pela mãe) passar no teste de admissão na escola de dança, consolando-o apenas o fato de os alunos da escola de dança vestirem farda azul idêntica aos do colégio naval, com a diferença de terem bordada na lapela, não a ancora, mas sim a lira de Apolo.
Conseguir que um filho entrasse para um dos colégios imperiais era maná do céu para pais com poucos recursos económicos, pois não só o ensino era gratuito como a formação recebida garantia emprego futuro remunerado, ou nas forças armadas (se fosse caso disso), ou na companhia de ballet do teatro imperial.
Assim, a linguagem do ballet clássico desenvolvida por Petipa em Sampetersburgo era, em primeira linha, uma linguagem de corte, pensada para dar expressão a espetáculos de nível elevado, suscetíveis de agradar à família real e à alta aristocracia, que constituíam o público do ballet na cidade imperial junto ao Neva.
Normas de etiqueta, de comportamento e de gestualidade que já vinham da corte francesa do Rei Sol faziam neste ambiente czarista pleno sentido. Daí que, ao assistirmos a uma Bela Adormecida, por exemplo, estejamos constantemente a ver as personagens interagindo umas com as outras num código arcano de vénias e de galhardetes de toda a espécie, como se a ficção de aristocracia em palco espelhasse a realidade aristocrática da plateia e dos camarotes.
Com o pormenor insólito de os reis e aristocratas em cena serem oriundos das classes desfavorecidas, ainda que sujeitos, desde a infância, a um processo de transformação física que, para o palco e para a vida, os nobilitava no porte e nas maneiras através do exercício da arte do ballet.
Foi esta a realidade que deu ao mundo Nijinsky, Pavlova, Karsavina e Balanchine. Realidade que, por insólito que pareça, no período soviético não mudou assim tanto, pelo que dela puderam emergir Nureyev, Makarova e Baryshnikov. Nomes que por si só são uma cartografia da evolução do ballet no século XX, já que todos eles acabaram por ter influência decisiva nos três centros polarizadores onde, fora da União Soviética, o ballet “aconteceu” no século XX: Londres, Nova Iorque e Paris.
Basta pensarmos na influência decisiva que Pavlova e Karsavina tiveram sobre Frederick Ashton e, através dele, sobre o bailado inglês. Balanchine levou (quase) sozinho o ballet clássico para os Estados Unidos, onde fundou o New York City Ballet. E Nureyev, com a desmesura da sua exigência, foi o motor fundamental do renascimento do Ballet da Ópera de Paris.”
Frederico Lourenço / Estética da Dança Clássica.
Espero que tenham gostado!
um abraço!