Quem nunca se atreveu em uma rima, mesmo que pobre, ali pelos treze anos de idade? Qual apaixonado deixou de fluir versos em odes ao amor, ou em lamúrias ao inevitável desamparo?
A poesia dimana d’alma e recita ao coração, assim proferem os poetas desde os tempos dos aedos e dos trovadores. Mas o poema reclama contrapartida à sensibilidade de quem o ouve ou lê. Assim, é o gênero literário mais injustiçado, neste mundo veloz e prático. Mesmo que metade da população afirme desejar viver em estado lírico, poetas são raríssimos e efêmeros nas listas de citados, lembrados ou mais vendidos.
Garotas e garotos do século XX levavam versos em suas bagagens. Citavam, com alguma intimidade, nomes como Cora Coralina, Carlos Drummond de Andrade, Adélia Prado, Paulo Leminski, Vinícius de Morais, pra ficar nos brasileiros. Hoje, um jovem aluno, em papo pertinente, mandou: “a gente se amarra em poesia, mas em forma de música”. E citou: Carol Conká, Emicida, Céu, Lucas Santtana (atenção, não é Luan!), Eufohria, também pra ficar em “novidades” da nossa terra.
Vejo a coisa como a maré dos mares inspiradores, que vão e voltam em movimentos eternos. O Concretismo, a geração 70, deixaram grãos permanentes, influenciam músicas, livros, publicidade e cabeças ligadas. Novo fluxo virá e alguém será lido e declamado como A novidade.
Aliás e a propósito, POETA é certamente uma palavra pioneira na questão de gênero. Então cito três poetas que falam de seu tempo, agora, com a sensibilidade que nos atinge, e estão aí, prontos para a nova maré alta:
Ana Paula Pedro, poeta, atriz e psicóloga
“A medida do nada”
O espaço e seu corpo
Vazio
Substância por onde vagueio
deserta de mim
Extasiada de geometrias
Em que me perco
Plena de labirintos
E entregue à galáxia
desse pequeno pedaço
Sem fim
Flávio Corrêa de Melo, Poeta, professor de literatura e de oficinas literárias
“Hermenegildo de Barros”
Nasce o dia
e a dança esconsa no bairro da Glória
embota a solidão
e teima sair
rodopiar, viajar.
Na Hermenegildo de Barros
gárgulas abaixo do meu quarto
espreitam muros, barricadas,
e vigiam as calçadas.
Tudo está oco.
O dia começa um azul pestilento.
Lá embaixo na cidade
mosquitos zumbem sangue, sangue,
e os filhos do rio malabareiam
na praça Paris, no Passeio
seus troncos, suas misérias.
Sórdida, a cidade fia a rotina.
o purgatório e o sol de 45 graus.
Mais tarde, inexorável,
o tempo de relógios esquecidos,
dispensa o cansado sol
e deixa as sombras saltarem das rochas,
das fendas.
No rio,
quando a noite desaba a poesia é abismo.
(in Rio Movediço)
Manoel Herculano, Poeta Cantador/Ator para se visto e ouvido