Depois de tantos anos! As cobranças eram muitas, afinal, para uma escritora brasileira nunca ter ido nessa famosa Festa Literária Internacional de Paraty era, no mínimo, indesculpável. O caminho foi longo, mas ameno, a estadia em Jabaquara remota, mas alegre. A cidade de Paraty é organizada e, apesar do grande evento, não me pareceu abarrotada, dava pra andar, comer e se locomover com tranquilidade. (crise talvez?)
Assim que cheguei, reparei que a 14ª FLIP em nada se assemelhava com o visceral e autoral Festival do Livro de Edimburgo, ou com a competitiva e tradicional Feira de Berlim. A FLIP é tropical, peculiar e interessante. Andei (digo, tropecei) entre ruas, ouvi palestras em português, inglês, espanhol, conversei com jornalistas e editores, folheei livros recomendados, vi protestos, ouvi homenageados… Mas tinha algo que me incomodava: para onde quer que eu olhasse, não via nada diferente, era tudo do mesmo, e o mesmo de sempre. Em termos de literatura, para mim, isso era desolador, pois a novidade me move, e muito me importa, e a falta dela era lamentável. Ali, nada era realmente novo, muita cópia, muita moda, “safe bets”, várias promoções e divulgações.
A ideia desafiadora? O arrojo literário? Onde? Vi coisas bonitinhas, que ficaram pelo meio do caminho, mas não vi nada que substancialmente me emocionasse, me fizesse pensar sobre minha miserável vida, meus pecados terrenos, ou invejar mil vezes ter escrito. Será que isso não existe mais? Ou não será mais o objetivo?
Na entrevista que eu dei em Paraty para um blog de resenhas literárias, Caio Lima me perguntou sobre o que, pra mim, significava “literatura de guerrilha”. Respondi que era essencial apoiar a literatura independente, com menos interferência editorial, dar espaço tanto para o autor quanto para o leitor se expressarem, com menos didatismo, menos palestras, mais possibilidades, diálogos, encontros, uma literatura para todos, uma literatura de acesso.
Aliás, o conceito de acessibilidade foi algo que achei difícil encontrar em Paraty como um todo, com seu centro histórico repleto de pedras irregulares cravadas por todo o chão, uma lembrança dolorosa de seus tempos coloniais… Fica óbvio que, para Paraty, mobilidade não é prioridade. A cidade ignora necessidades, necessidades menores mas não menos importantes. É claro que o Centro deve conservar parte de sua tradição, mas também Paraty tem o dever de providenciar acesso a todos, ou como fará uma pessoa cadeirante ou deficiente, mais velha, ou mesmo crianças com dificuldades, para admirar esta bela cidade? O mundo flui, dialoga, conversa, anda, não desejo que pedras (por mais antigas que sejam) impeçam uma longa e linda caminhada.
Mas, voltando ao assunto… Que se invistam em jovens e apostem em seu desenvolvimento literário não apenas nos grandes e muitas vezes já falecidos talentos. Que tenhamos mais leitores, mais escritores, mais testemunhas da nossa estória e que ela possa ser escrita e reescrita de diversas e inúmeras maneiras, porque múltiplos personagens não são nada mais do que versões de nós mesmos. Acessibilidade antes que tardia para todos, em todos os sentidos, porque sem acreditar na literatura de risco não teríamos um passado, não teremos o hoje, e o futuro, com certeza, estará perdido.
Flip, sua linda, prazer em te conhecer.
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