Denise Emmer lança “Só os loucos batem palmas para o céu”, seu novo livro de contos em prosa-poética

Foto: Denise Emmer no teatro | Crédito: Nem Queiroz

 

Vencedora do Prêmio Alceu Amoroso Lima Poesia e Liberdade 2021, poeta, compositora e violoncelista, depura a solidão e o desamparo ao longo de dezessete contos

Denise Emmer, escritora de múltiplas expressões e um dos grandes nomes da poesia brasileira contemporânea, está lançando sua mais nova publicação, o livro “Só os loucos batem palmas para o céu” (Editora Cavalo Azul), mais uma vez diluindo as fronteiras entre prosa e poesia para compor um mosaico de narrativas que soam como partituras, sonatas e visões. O livro não apenas continua o diálogo com obras ficcionais anteriores —   O cavalo cantor e O barulho do fim do mundo — mas aprofunda a vertente estética da autora, que flerta com o realismo mágico, e lhe confere uma densidade rara.

Ao longo dos dezessete contos reunidos em seu novo livro, a solidão emerge como eixo magnético, um sentimento que não se apresenta como ausência, mas como território existencial a ser percorrido. Não à toa, Denise escolhe para epígrafe um fragmento de Cem anos de solidão, de Gabriel García Márquez:

“Ele realmente tinha passado pela morte, mas retornou porque não suportava a solidão.” 

Essa frase é a chave do livro. Cada conto mostra personagens que, de algum modo, retornam — da morte, do esquecimento, da infância, do nunca — para viver a solidão da existência. São órfãos, náufragos, criaturas suspensas entre mundos, cujos gestos se inscrevem no palco íntimo do leitor.

“Sou uma poeta, que, por vezes, resolve sair da sua métrica para viver algumas aventuras”, comenta Denise. “Ao escrever estas histórias, eu as vivo intensamente. Sou, ou parte do enredo, ou a observadora que narra os acontecimentos sem entrar nas polêmicas. Para mim, escrever contos é uma forma de viajar sem sair do quarto”, conclui. 

Os títulos dos contos já sugerem um universo de enigmas e metáforas: A mulher que dançava, Senhor solidão, Palco das criaturas, As despedidas do Nunca, Entre o quarto e o closet, A árvore Sonâmbula, Abraço eterno, O mosteiro do penhasco, O homem triste, A senhora de todas as vestes, Amor elevado a infinito, Anônima, Meu Kilimanjaro, O homem com pressa, Casal de bandoleiros, Abandonadas e Coração disparado. Cada título é uma promessa de imagem, um convite a um espaço sensorial.

<em>Foto: Denise Emmer - Testro | Crédito: Nem. Queiroz</em> Tais características são latentes como, por exemplo, em “Senhor solidão”, no qual Denise Emmer cria um cenário doméstico e sufocante, onde um artista célebre vive com a mãe centenária. A rotina banal — almoçar, descalçar sapatos, cuidar um do outro — se transforma em metáfora da dependência e da clausura. Ou também em “Palco das Criaturas”, em que um pianista sem rosto veste o fraque e aguarda sua entrada no palco para interpretar uma sonata inexistente. Sua música desperta os marginalizados, os loucos, as anciãs esquecidas — mas não há plateia. Quando finalmente toca para um público lotado, é vaiado, suas teclas se soltam, o piano se desmonta. O conto é uma parábola sobre a arte invisível e o fracasso da glória. Ao dividir o pão com um homem humilde nas ruas, o pianista reencontra, no gesto simples, a dignidade que não encontrou nos aplausos. Denise Emmer transforma o palco em metáfora do mundo: todos somos criaturas tocando sonatas inaudíveis para plateias ausentes.

Outra passagem de semelhante potência literária, “As despedidas do Nunca” medita sobre a morte e o adeus. A narradora percorre paisagens — florestas, pedras, mares — despedindo-se de tudo, até de seus pais transformados em estátuas. O texto avança como um fluxo de consciência, misturando memória, sonho e realidade. A cena do aeroporto, com o voo Pterossauro para o “Nunca”, é uma imagem poderosa: a morte como embarque, o destino final anunciado no alto-falante. Mas, ao final, há um retorno à intimidade: ela adormece abraçada ao cão. A morte não é espetáculo, mas recolhimento. A travessia não é explosão, mas um “adieu” sussurrado.

Esses três contos são amostras de uma escritura que alia lirismo e densidade. Em todos, há uma busca pelo sublime no cotidiano, uma investigação das zonas de silêncio e uma poética da travessia. Denise Emmer não escreve apenas histórias: ela as vive, e as faz ressoar como música interior. O livro inteiro é uma sonata que ainda não existe. Cada conto é um movimento — lento, allegro, adagio — que nos conduz ao “fim do mundo” entendido não como catástrofe, mas como passagem ao infinito. Ao ler Só os loucos batem palmas para o céu, o leitor participa dessa experiência de dissolução e de chama. E, ao final, provavelmente se reconheça no título: um louco que, tocado pela poesia de cada conto, também bate palmas para o céu.

 

Denise Emmer

A vocação para a música sempre se fez presente em suas expressões artísticas. Inicialmente bacharela em Física, buscou a formação, logo em seguida, no Bacharelado em Música (violoncelo), despontando, no início dos anos 80, como compositora e cantora. Com vários CDs gravados, também integra, como violoncelista, orquestras e grupos de câmera. Apesar da versátil personalidade, a essência de sua criação, é, fundamentalmente, a poesia, conquistando importantes títulos, como o Prêmio ABL de poesia 2009 (Academia Brasileira de Letras), o Prêmio Associação Paulista dos Críticos de Arte (APCA), o Prêmio José Martí (UNESCO) e Prêmio Olavo Bilac (ABL), dentre muitos outros.

Enquanto poeta, participou de relevantes antologias da poesia brasileira, tais como “41 poetas do Rio” (org. Moacyr Félix, Minc), “Antologia da Nova Poesia Brasileira”(org. Olga Savary, Ed Hipocampo), “Poesia Sempre” (Fundação Biblioteca Nacional), bem como das Revistas Califórnia College of the at Eleven (EUA), Newspaper Surreal Poets, (EUA), Revista da Poesia (Metin Cengiz -Turquia), Revista Crear in Salamanca (Espanha) – traduzida pelo poeta Alfredo Pérez Alencart. Participou do XXVI Encuentro de Poetas Ibero-Americanos 2021 (Salamanca – Espanha) e da Brazilian Poems” edição e tradução Abay K.  Da Antologia Selvagem Ed. Cavalo Azul, organização Alexandre Bonafim, Histórias brasileiras de cavalos Ed. Maralto, organização Ricardo Ramos e Antologia Ponte de Versos, Ed Ibis Libris, organização Thereza Roque da Motta.

Livro “Só os loucos batem palmas para o céu” – Denise Emmer

 

 

Author

Chris Herrmann é escritora/poeta, musicista, musicoterapeuta, editora e webdesigner teuto-brasileira, nascida no Rio de Janeiro. Estudou Literatura na UFRJ, Música no CBM e pós-graduou-se em Musicoterapia na Universidade de Münster, Alemanha. Tem 13 Livros publicados (poesia contemporânea, haikai, romance, contos e literatura infantil); bem como participação e organização em inúmeras coletâneas de poesia no Brasil e exterior. Recebeu diversas premiações ao longo dos últimos 20 anos, como escritora, poeta e webdesigner. É editora-chefe da revista eletrônica Ser MulherArte e curadora do Sarau da Varanda (presencial, na Tijuca/RJ).

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