Mitologias pelo mundo, além da grega: a história de todos nós – Parte IV: conheça as mitologias asteca, inca e maia

 

“A Literatura possibilita uma introspecção muito mais profunda às pessoas do que qualquer outra ciência pode fazer”
Noam Chomsky, linguista e escritor norte americano

 

Mitologias se prestam, como quase todas, a momentos de agradáveis leituras e bate-papos, a roteiros de livros e filmes, dada a riqueza de suas histórias e narrativas. Esta coletânea de artigos não traz, com detalhes, a maior parte dessas histórias, senão um breve resumo de algumas delas, além de ter como fulcro o panteão divino de vários povos deste planetinha azul em que vivemos – e que estamos cuidando muito mal, diga-se de passagem. Renovando, pois, o convite para que você, querida leitora, prezado leitor, se aprofunde um tanto mais nesta ou naquela mitologia que mais lhe interessar, buscando as muitas e belas histórias a que aqui me refiro, vamos a um pouco da vida destes, ainda muito misteriosos e surpreendentes povos da nossa, desde as grandes navegações europeias, América Latina.

 

Mitologia Asteca

Os astecas viveram onde, hoje, é o México e a Guatemala, e tiveram seu auge entre os séculos XIV e XVI, sendo praticamente dizimados durante a conquista espanhola. Donos de grande tecnologia urbana, porém, não tanto bélica, tinham por capital a cidade de Tenochtitlán, maior que a maior parte das cidades europeias de então (estima-se que tinha mais de 100 mil habitantes; já o império, supõem estudiosos, chegava a ter algo perto de 12 milhões de pessoas). A principal divindade era Quetzalcoatl ou Gukumatz ou Kukulcán ou Nove Ventos, entre outros, conhecido como a “Serpente Emplumada”, que, uma vez tendo ido embora em tempos antigos, prometera regressar para seu povo, pelo mar, daí os espanhóis terem sido confundidos com o povo de seu deus, retornando à terra ancestral. Os astecas acreditavam em sacrifícios para agradar seus deuses e garantir o equilíbrio universal e a prosperidade social. Esses sacrifícios eram praticados em épocas específicas, com rituais próprios, em uma pedra lisa que ficava no alto de suas pirâmides. Era uma honra ser sacrificado, dizem alguns arqueólogos, mas os demais habitantes também sacrificavam parte de seus corpos, independentemente do sacrifício maior da vítima que morreria em honra aos deuses.

O Templo de Kukulkán em Chichen Itzá, a zona arqueológica situada na península de Yucatán, no México.

Politeístas, alguns dos deuses astecas representavam elementos da Natureza, como o fogo, a água, a terra, a Lua e o vento. Muitos deles, como os deuses gregos, também eram associados aos sentimentos humanos, vivendo alegrias e tragédias, como todos nós. No tocante à vida humana, eles acreditavam no Mictlan, local sagrado para onde todos os mortais iriam após morrerem, não importando suas ações em vida. Não obstante, havia um lugar específico, chamado Tlalocan, que era a moradia do deus da chuva, Tlaloc, para onde iriam os espíritos daqueles que morriam por algumas causas específicas, como doenças de pele, pelos raios ou tempestades, ou que simplesmente eram sacrificados em honra a Tlaloc, que era casado com Xochiquetzal, irmã de Xochipilli (deusa das flores, da fertilidade, dos jogos, da dança e da agricultura). Tlaloc teve, com a segunda esposa, Chalchiuhtlicue, um filho, Teciztecatl, e uma filha, Huixtochhuatl. A ideia do Mictlan é comum a vários mitos e culturas, como o Paraíso e o Inferno para os cristãos, para os judeus e para os muçulmanos, ou como o Tártaro (inferno) ou os Campos Elísios (Paraíso), embora, aqui, ambos sejam governados pelo mesmo deus, Hades.

Havia, também, Tezcatlipoca, o “Senhor do Espelho Flamejante” (deus da noite, da beleza, do fogo e da guerra), representado por um jaguar. Era irmão gêmeo e meio inimigo de Quetzalcoatl, que era, como visto, o deus maior na cultura mesoamericana pré-colombiana. Ele representa, na mitologia asteca, segundo estudiosos, a capacidade do ser humano em alcançar seu pleno potencial e sua divindade. Tezcatlipoca compunha, junto com Tlaloc e Quetzalcoatl, uma vez mais, em mitologias mundiais, a mais importante trilogia divina do panteão asteca.

Xipe Totec é um deus asteca patrono de uma diversidade de aspectos importantes para a sociedade mesoamericana que o cultuou

Antes da criação deste Universo e mundo em que vivemos, os astecas acreditavam que havia outros mundos, formados por quatro sóis. Veio, então, um quinto Sol, mas tudo, apesar disso, ficou escuro e morto e, por essa razão, o mundo em que vivemos foi criado. São duas as versões, embora parecidas, para essa criação. Vejamos as duas, sucintamente.

Mito da Criação Asteca – Versão 1

No começo, não havia o Universo tal como o conhecemos, era um grande vazio escuro, tão vazio que, sendo apenas o que existia, os deuses decidiram criá-lo e tudo o que nele existe. Porém, para isso, a energia original teria que vir do sacrifício de uma das divindades. O deus Tecuciztecatl se ofereceu e seria honrado, tornando-se o Sol. Entretanto, na hora do sacrifício, refugou, e outro deus, mais humilde, Nanahuatzin, pulou no fogo; Tecuciztecatl, envergonhado, pulou atrás e assim, nos primórdios, foram criados dois sóis. Mas a covardia inicial de Tecuciztecatl irritou os demais deuses e, logo, ele foi rebaixado a não brilhar tanto e a ficar no céu apenas de noite, como a Lua. A Terra e seus elementos, a partir da energia disponível, foram, então, criados; a vida animal, vegetal e humana veio logo a seguir.

Mito da Criação Asteca – Versão 2

A pedido do Sol, os três deuses mais importantes do panteão asteca, Quetzalcoatl, Tlaloc e Tezcatlipoca, que compõem a “Santíssima Trindade” deles (semelhante à católica, à hindu…), se imolaram e se auto-sacrificaram para que pudessem, com isso, criar o Universo com sua força original. Esse sacrifício aconteceu na cidade sagrada de Teotihuacan, o que desesperou os homens, que ficaram à procura dos deuses. Compadecido, Tezcatlipoca ordenou que os homens fizessem uma festa gigantesca e vários sacrifícios aos deuses auto-imolados; por essa razão, ficou conhecido, também, como o Deus dos Sacrifícios.

Os astecas acreditavam que havia, no Universo, uma espécie de ciclo que duraria, cada um, aproximadamente 52 anos e, ao final de um ciclo e início de outro, os sacerdotes desse povo realizavam o que chamavam de “Cerimônia do Novo Fogo”, um tipo de ritual de passagem de um ciclo para outro. O mito dos 5 sóis previa o fim desse sequenciamento de ciclos, mas não previu o fim deles; era incerto o fim do mundo, por assim dizer. Durante os cinco últimos dias de cada ciclo, as famílias se livravam de seus pertences pessoais, incluindo, em alguns casos, até mesmo suas casas, para a renovação do ciclo.

Astecas e incas foram civilizações da América Pré-Colombiana, ou seja, anteriores às expedições do navegador genovês (da cidade de Gênova, na Itália), que aportou por essas terras representando os reis de Espanha, tanto quanto os maias também o foram, e constituíram-se nos maiores impérios desta parte do globo nesse período. Conheçamos, então, um pouco dos incas e dos maias, já que acabamos de conhecer um tantinho dos astecas.

 

Mitologia Inca

O deus criador de tudo e de todos, para os incas, os soberanos do povo quíchua ou quéchua, como etnia dominante, além dos aymarás e dos yukas, dentre outros grupos minoritários, era Viracocha, para quem ofereciam sacrifícios. Ele criou e recriou os homens várias vezes e, da última, o fez a partir de pedras e ensinou-lhes várias coisas à humanidade, ofertando-lhes saberes vários (mais uma história que lembra o arquetípico mito dos irmãos gregos Prometeu e Epimeteu). Os incas, ressaltando, eram os representantes da classe dominante do conjunto desses povos, os soberanos deste povo que era monarquista, teocrático e politeísta. O imperador inca recebia o título de “Sapa Inca” (“o filho do Sol”). O Sapa tinha que se casar com uma irmã (ou parente mais próxima), que recebia o título de “Coya”.

Mulher inca em roupas tradicionais e-cabelos longos.

Deus Sol chamava-se Inti. Era a principal divindade deste povo e era tido como o protetor da casa real dos Incas e dos Quíchua. Suas festividades, chamadas de Inti Raymi, eram celebradas no Solstício de Inverno e eram longas, constituindo-se no momento em que os sacrifícios eram feitos. As vítimas eram queimadas junto com folhas de coca e milho. A esposa de Inti chamava-se Mama-Kilya e era a Deusa Lua, que, entre outras coisas, regulava o ciclo menstrual das mulheres e sua fertilidade.

Deus da Chuva era Apu Illapu, que também estava associado à agricultura. Em épocas de seca, eram realizados sacrifícios para agradar o deus e trazer de volta as chuvas. Para os Incas, a sombra de Illapu encontrava-se na Via Láctea, de onde jorrava a água que cairia na Terra na forma de chuva. A “Mãe Terra” dos Incas chamava-se Pachamama, senhora das montanhas, das rochas e das planícies. Pachacútec, também conhecido como Pachacámac ou Pachacuti, que significa “o que muda a Terra”, foi um dos deuses mais importantes dos Incas. Estima-se que ele tenha reinado de 1.410 a.C. a 1.470 d.C. e foi considerado o espírito do crescimento de todas as coisas, especialmente dos cereais, dos animais e dos seres humanos.

Mito da criação:

No início, Viracocha criou o Universo e teve dois filhos: Mama Ocllo (filha da Lua) e Manco Cápac (filho do Sol). Ele os colocou nas Ilhas da Lua e do Sol, no Lago Titicaca, para que pudessem localizar um lugar para a construção do Império Inca. Ao chegar ao altiplano andino, onde hoje fica a cidade de Cusco, Manco enterrou seu bastão na terra, abrindo uma fenda e, assim, fundou o Império Inca.

Há outra versão: após um grande dilúvio, sobreviveram apenas um homem e uma mulher, Mama Ocllo e Manco Cápac. Eles foram arrastados em uma balsa pelo lago Titicaca e procuraram um lugar para viver. Quando encontraram, surgiu a história do enterro do bastão para marcar o local de fundação do Império Inca (uma história semelhante ao mito de criação das ilhas do arquipélago japonês).

Huayna Picchu, Picchu ou Machu Picchu (em quíchua Machu Picchu, “velha montanha”), também chamada “cidade perdida dos Incas”, é uma cidade pré-colombiana bem conservada, localizada no topo de uma montanha, a 2.400 metros de altitude, no vale do rio Urubamba, atual Peru.

 

Os Incas acreditavam estar vivendo em um quinto mundo. Cada um dos mundos anteriores havia tido a duração de mil anos, e a cada mil anos nasceria um novo Sol, nova vida etc.

 

Mitologia Maia

Os Maias foram a única cultura da América dita indígena, anterior à chegada dos portugueses e dos espanhóis, e classificados como “cultura mesoamericana”, que desenvolveram um sistema gráfico de escrita que pode ser considerado, segundo nossos padrões, como avançado. Seus mitos e lendas, por exemplo, foram esculpidos em pedra e em cerâmica, além do que chamaríamos de livros, escritos em folhas de casca de árvore (“códices”). Sua narrativa sagrada é o Popul Vuh (que quer dizer “livro da comunidade ou do conselho”). Parte das histórias do Popul Vuh foi transmitida por via oral, por isso, a narrativa não possui uma trajetória linear, sendo mais parecida com um compêndio de histórias inter-relacionadas.

Ruínas de construções MAIAS. Foto: Pixabay.

O texto narra eventos que são o resultado do que é contado, mais à frente, o que se chama “analepse” ou “retrospeção”. O que nos chegou foram registros feitos pelo monge Francisco Ximénez, estima-se, pelo início do século XVIII, uma na língua Maia, outra em Castelhano ou Espanhol, mas o original, a partir do qual o monge fez a tradução, se perdeu no tempo. Em 1861, o livro, até então inteiriço, foi subdividido em 5 partes, para melhor compreensão de sua narrativa. Em 1972, o Popol Vuh foi declarado “Livro Nacional da Guatemala”, principal território da vida Maia (além de partes do México atual). A título de esclarecimento, “Analepse” é a interrupção de uma sequência narrativa, pela interpolação de eventos ocorridos anteriormente; é, assim, um tipo de mudança de plano temporal. A palavra vem do grego “ana = contra” e “lepse” que tem a ver com tempo, então, “analepse” é, então, algo como “contra o tempo”, um recurso em que narrador, hoje, recua no tempo para estabelecer sua narrativa; quando ele antecipa informações e/ou acontecimentos, este recurso chama-se “Prolepse”.

Mito da criação Maia

No princípio, não havia nada; na Terra, depois de criada, só havia o mar e a abóbada celeste. Em dado momento, os deuses decidiram criar os homens e os animais, junto com o Sol e seu percurso, fazendo surgir o amanhecer e o entardecer. Os Deuses maiores desse povo eram Tzakól, que criou o Universo, e Bitól, que deu as formas das coisas, tal como nós as vemos hoje. A terceira divindade mais importante do panteão Maia era Gucumatz ou, como é mais conhecida, Kukulkán (a “Serpente Emplumada”). Novamente surge uma trindade divina; e não será a última que surgirá por aqui, neste longo artigo. Os três, juntos, disseram “faça-se luz” e assim foi feito; disseram “terra” e apareceram os continentes e as montanhas, que logo a seguir cobriram-se de árvores e plantas. A seguir, os três criaram os animais da floresta, aos quais fora ordenado que venerassem os deuses, mas como não podiam falar, do barro/argila (de novo? Outra ideia que aparecerá muito, por aqui; outro arquétipo mitológico, por assim dizer), os deuses decidiram criar os primeiros homens e mulheres, para cumprir com a tarefa da veneração, e os animais, como punição, passaram a lhes servir de alimentos e força de trabalho, junto com as plantas. Contudo, mesmo os homens e mulheres mostram-se fracos perante os deuses; a água dissolveu os primeiros seres humanos e a madeira, muito dura, também mostrou-se como material inadequado para a confecção original; o material final, a partir do qual fomos feitos, teria sido, assim, o milho, alimento básico para os Maias e por eles venerado.

O Popol Vuh também fala da criação da humanidade. No início, eram animais os primeiros seres criados pelos deuses e levaram como oferenda a eles, milho amarelo e milho branco e desta matéria prima fomos feitos. Foram quatro, os primeiros humanos: Jaguar Quitzé, Noche de Jaguar, No Ahora e Jaguar Obscuro. Percebendo o quanto esses seres eram perfeitos, podendo se igualar a eles, os deuses, sua visão e mentes foram turvadas, para que ficassem limitados, mas receberam mulheres para iniciar a humanidade toda.

Além da “Santíssima Trindade” Maia, no princípio, ainda havia outros dois deuses importantes: Huracán (“aquele que tem uma só perna”), que era o Deus do vento, da tempestade e do foro. Foi Huracán quem provocou a Grande Inundação (Dilúvio, como na mitologia católica e sumeriana), por ordem dos demais deuses, enfurecidos que estavam pelas seguidas desobediências da criação original e poucos se salvam do desastre; havia, também Tepeu, que ajudou na (re)construção terrestre.

Na narrativa do Popol Vuh, os grandes heróis chamavam-se Hunahpú e Ixbalanqué, irmãos gêmeos, que superaram muitos desafios; conseguiram, até mesmo, derrotar os deuses do Xibalbá, o Submundo Maia (similar ao inferno católico, como o Tártaro grego etc.). Deste modo, os gêmeos conseguiram “limpar” as trevas do mundo e, como prêmio, ascenderam aos céus e se tornaram o Sol (Hunahpú) e a Lua (Ixbalanqué).

Na cosmogonia Maia, a luta entre o bem e o mal está na origem do mundo e da vida e é um movimento eterno, do qual não podemos escapar. O pai dos gêmeos chamava-se Uno Hunahpú; ele e seu irmão, Siete Hunahpú passavam o tempo com jogos de bola e isso incomodou os deuses do Xibalbá, que tentaram parar com o barulho que faziam ao jogar. A mística do jogo da bola é fundamental nas histórias do Popol Vuh: era usado para a resolução de conflitos, enquanto não havia guerra (embora fosse um jogo sangrento, tanto que, não raro, os perdedores eram executados).

Os irmãos foram aprisionados, receberam uma tocha e o equivalente a um cigarro para manterem acessa a tocha até o dia seguinte. Não o conseguindo, foram sacrificados. A cabeça de Uno foi espetada em uma estaca, até o dia em que a virgem Luna de Sangre ou Ixquic, curiosa, ao contemplar o crânio exposto, tocou-o e teve seu corpo atingido por um cuspe de Uno, o que a fez engravidar dos gêmeos antes citados. Mais tarde, os irmãos não só vingaram pai e tio, como os ressuscitaram.

Os irmãos viveram com a mãe até atingirem a idade adulta, quando embarcaram na mesma viagem ao submundo, como seu pai e o tio haviam feito, no passado. Os deuses do Xibalbá os desafiaram para um jogo de bola, como haviam feito com seu pai e tio, e eles não cometeram os mesmos erros; além disso, mandaram ao Xibalbá, um mosquito, que picou os deuses, que se queixaram, uns para os outros. O mosquito revelou aos irmãos os nomes dos deuses que, deste modo, acabaram desmascarados, um a um, e os irmãos não foram enganados por figuras de madeira as quais, uma vez incólumes, haviam aprisionado seu pai e tio (armadilha desfeita pelo ardil). No quarto em que foram postos para o jogo de bola, e onde seu pai e tio haviam perecido, venceram o escuro com a luz de libélulas, também suas amigas; a tocha e o cigarro, não consumidos, puderam ser devolvidos intactos no dia seguinte. E foram vencendo todos os outros desafios que lhe foram sendo impostos, sempre com a ajuda de animais; Hunahpú teve a cabeça cortada e feita de bola, mas Xbalanqué lhe põe uma cabaça no lugar da cabeça e Hunahpú permaneceu nos jogos. Uma vez derrotados os deuses do Xibalbá, a cabeça de Hunahpú foi-lhe restituída.

Os gêmeos foram atirados em uma fornalha e seus ossos foram triturados, mas, jogados em um rio, eles ressuscitaram e começaram a fazer isso com outros seres vivos. Tal fato chegou aos deuses do Xibalbá, que os convocam de volta ao submundo, para que passem pela experiência da morte e da ressurreição. Entretanto, os gêmeos não ressuscitam porque aceitaram o prêmio de se tornarem eternos: um foi transformado no Sol e o outro, na Lua.

 

Algumas (últimas) informações adicionais

Astecas, Incas e Maias não foram as únicas grandes civilizações do que hoje conhecemos por América Latina, vejamos, ainda mais resumidamente do que o que até aqui trouxe à sua apreciação, leitores, algumas breves informações sobre três desses outros povos.

 

Olmecas

Outra cultura mesoamericana que viveu pelas terras mexicanas (em áreas como Chiapas) e guatemaltecas, entre 1.500 e 500 a.C. foram os Olmecas. Alguns estudiosos lhes atribuem a origem de todas as demais civilizações mesoamericanas, como os Toltecas e os Maias, dentre alguns outros povos e etnias. Sua influência, estima-se, foi razoável, notadamente, em face às intensas trocas comerciais entre suas cidades e aldeias. O “culto da serpente emplumada”, comum com os Toltecas e com os Maias, formas de cultivos agrícolas, símbolos religiosos, como os sacrifícios humanos etc. tudo isso liga os Olmecas aos povos locais que os sucederam.

“Olmeca” significa “povo de borracha” em Náuatle, a língua dos Astecas, posta a cultura, comum aos dois povos, de extrair látex da Castilla Elástica, uma árvore da borracha, da região semelhante às nossas conhecidas Seringueiras. Outra cultura importante para este povo era o tabaco, além do milho. Alguns estudiosos situam a origem dos Olmecas em locais perto da cidade de Tenochtitlán. A elite deste povo era apreciadora de artefatos, como jóias, feitos a partir de materiais como as pedras de jade, a magnetita e a obsidiana, o que gerou o intenso fluxo comercial que os pesquisadores afirmam ter existido entre este povo e entre eles e outros povos, como o Toltecas e o Maias.

A decadência dos Olmecas é estimada para o período entre 400 e 300 a.C., provavelmente por questões climáticas, como secas e redução da oferta alimentar, fato comum a vários povos da antiguidade, aqui e alhures. Estima-se que a organização em cidades-estado e uma escrita, ainda que tida como um tanto rudimentar, já estariam presente na sociedade Olmeca. Outras inovações deste povo podem ter sido a bússola, um calendário sistematizado e o número zero (os Olmecas tinham um sistema matemático de base vigesimal), como o conceito, então nascente e inovador, de “nada”.

O calendário Maia sincroniza com os planetas

Por fim, havia no panteão Olmeca vários deuses e rituais, como os sacrifícios humanos que se perpetuaram em outras culturas, como a dos Toltecas e dos Maias.

 

Toltecas

Povo de cultura mesoamericana que viveu no México entre 900 e 1521 d.C. Os Maias tinham os Toltecas como seus predecessores, tanto que a tradição oral e pictográfica dos Maias têm, em partes de sua narrativa mitológica, nacos da história de seus antepassados Toltecas. Uma das primeiras menções históricas aos Toltecas, pelos povos europeus colonizadores, e foi a partir dela que algo da história deste povo nos chegou, foi feita pelo frade dominicano Diego Durán (1537-1588). Outro pesquisador, o arqueólogo e etnólogo norte americano Daniel G. Brinton (1837-1899), atribuía a visão, para ele, um tanto edulcorada, que os Astecas tinham sobre os Toltecas, ao que chamava de tendência da mente humana em glorificar “os bons e velhos tempos”; o quê de nostalgia que nos arrebata, aqui e ali, ontem, hoje e sempre. Brinton também supunha que a denominação “Toltecas” era derivada da nome da antiga cidade de Tollan, que compunha o mito da luta entre Quetzalcoaltl (que teria sido seu primeiro regente) e Tezcaltlipoca, lugares e deuses em comum tanto aos Toltecas quanto aos Astecas.

De acordo com a professora de História e Antropologia da Universidade da Califórnia, Patricia Rieff Anawalt (1924-2015), a ancestralidade Tolteca de que suas dinastias dominantes haviam sido fundadas por Quetzalcoatl, também foram feitas por civilizações diversas como os Astecas, os Incas/Quíchuas e os Maias, o que aponta para a possibilidade de intercâmbio entre esses povos.

 

Zapotecas

A civilização zapoteca viveu na região do Vale do Oaxaca, onde hoje é o sul do México, sendo, assim mais um representante dos povos mesoamericanos ora estudados e teve seu auge entre 700 e 1521 d.C. Os zapotecas se referiam a si próprios como o “povo das nuvens”. Este povo também desenvolveu um calendário organizado e sistematizado e também, possivelmente por conta de herança Olmeca, conheciam o conceito do “zero”, além de ter, igualmente, desenvolvido sua própria forma de escrita, registrando os principais acontecimentos de sua história e de seu dia a dia por meio de símbolos que lembram os hieróglifos egípcios e como a maioria dos sistemas religiosos mesoamericanos, a religião Zapoteca era politeísta. Algumas divindades conhecidas eram Cocijo, o deus da chuva (semelhante ao deus Asteca Tlaloc); Coquihani, o deus da luz, e Pitao Cozobi, o deus do milho. Aqui também, entre os Zapotecas, podemos observar o culto à “Serpente Cmplumada” de Teotihuacan, além do deus-borboleta e o deus da chuva o que, uma vez mais, comprova parte de história comum entre esses povos mesoamericanos.

A riqueza das mitologias pelo mundo é enorme e uma fonte infindável de prazer e saber sobre nosso passado e, claro, explicando bastante sobre quem somos hoje. Existem poucas mais belas do que descobrir aquilo que nos identifica e nos caracteriza como povo, muito embora, infelizmente, uns e outros por, aqui e acolá, desejariam uma triste e empobrecedora uniformização da cultura e, por conseguinte, de nós mesmos. Vamos continuar a vivenciar novas culturas, novas percepções de ver o mundo e a vida? Aguarde. A viagem pelas mitologias do planeta continua.

 

Carlos Fernando Galvão,
Geógrafo, Doutor em Ciências Sociais e Pós Doutor em Geografia Humana


cfgalvao@terra.com.br

@cfgalvao54

 

 

 

Bibliografia de consulta e sugerida para aprofundamento

  • FAVRE, Henri. A Civilização Inca. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1987.
  • FRANCHINI, A.S. As melhores histórias das mitologias Asteca, Maia e Inca. Porto Alegre: Editora Artes, 2014.
  • PAUL, Gendrop. A Civilização Maia. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1987.
  • SOUSTELLE, Jacques. A Civilização Asteca. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 2002.

 

Author

Carlos Fernando Galvão é carioca, Bacharel e Licenciado em Geografia (UFF), Especialista em Gestão Escolar (UFJF), Mestre em Ciência da Informação (UFRJ/CNPq), Doutor em Ciências Sociais (UERJ) e Pós Doutor em Geografia Humana (UFF). Autor de mais de 160 artigos, entre textos científicos e jornalísticos, tendo escrito para periódicos como O Globo, Jornal do Brasil, Folha de São Paulo e Le Monde Diplomatique Brasil, também foi colaborador do Portal Acadêmico da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp) entre 2015 e 2018. Atualmente, escreve com alguma regularidade no Portal ArteCult. É autor, igualmente, de 14 livros.

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